16 de setembro de 2024

Ouça o grito da Terra

O clamor da criação: um chamado à ação e à conversão para salvar o planeta

Esta é a convocação que ecoa forte na mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação celebrado em 1º de setembro. A Terra mostra evidentes sinais de esgotamento – pelas catástrofes, pela escassez de água e tantos outros fenômenos terríveis mundo afora, sem contar as perspectivas que se delineiam para um futuro não tão distante, possíveis de se reconhecer a partir de sérios trabalhos científicos. Os estudos são convincentes quanto à urgência de ações e providências que já estão atrasadas, para reverter uma triste realidade: a disseminação de comportamentos irresponsáveis e do criminoso tratamento dedicado ao planeta, brincando com a Criação de maneira desrespeitosa. "Ouça o grito da Terra" deve ser um forte apelo também no horizonte importante do dia 7 de setembro, para inspirar novas posturas cidadãs na sociedade brasileira, que precisa tratar, de modo mais sensível e racional, o meio ambiente generoso e rico do país. 

A urgência de reconhecer o perigo e agir com base na fé

A atual relação do ser humano com o planeta coloca em perigo a vida. Uma situação que precisa ser mais reconhecida, com a partilha de informações consistentes e cientificamente embasadas, inspirando uma sensibilização impulsionada por parâmetros humanísticos e pela luz da fé. Afinal, quando se considera a Criação, deve-se respeitar o seu Criador, incentivando novas posturas com o selo do cuidado e preservação, a partir de mudanças no estilo de vida, que deve ser mais condizente com os parâmetros da sustentabilidade. A vivência da fé conta de modo determinante nesse necessário processo de se renovar o jeito de agir no mundo, tendo no horizonte a busca pela harmonia com toda a Criação. O autêntico testemunho daqueles que creem em Deus exige também um modo de estar adequadamente na ambiência da Criação. Isto significa tratar o planeta como dom que precisa ser cuidado. 

Crédito: Brasil2 / GettyImages

A fé como motor de mudança e compromisso com a caridade

O Papa Francisco, a partir da indicação "Espera e age com a Criação", interroga: "Quando é que se tem fé?" E responde: não é tanto por se acreditar em algo transcendente e incompreensível para a razão, situando Deus de modo distante e inominável. O Santo Padre ensina que o olhar iluminado pela fé é capaz de enxergar que o Espírito Santo habita no coração de cada filho e filha de Deus. O selo de autenticidade da identidade cristã é o Espírito Santo derramado, copiosamente, nos corações, inclinando-os aos bens eternos, à luz da humanidade bela e bondosa de Jesus. O Espírito Santo gera nos corações a criatividade, tornando-os proativos na caridade, por meio de um caminho de liberdade espiritual, no enfrentamento da lógica do mundo. Prioriza-se a lógica de Deus pelo princípio do amor. Compreende-se que o cristão, movido pela fé, assume o compromisso com a caridade e transborda esperança. Nessa perspectiva, brilha a exigência de se assumir um estilo de vida dedicado ao cuidado com a criação. 


O amor em ação: partilhar as dores do mundo e lutar pela justiça ambiental

O dom da fé é também uma tarefa, realizada na obediência ao mandamento do amor de Jesus, vinculando os cristãos com o princípio da fraternidade e a promoção da justiça para todos. O amor deve ser testemunhado sempre em todas as circunstâncias, particularmente no tratamento dedicado ao meio ambiente, o que exige reconhecer e partilhar das dores do mundo. A Criação é ambiente vital, concebida para ser marcada pela alegria, partilhada por todos – e tudo deve tender à glória de Deus, para que a humanidade alcance a paz prometida. Assim, as dores da Criação, partilhadas pela humanidade, constituem razão de luta esperançosa dos cristãos. Tudo conta, cada gesto de respeito e reverência aos bens da natureza, fecundando um novo processo de nascimento da humanidade, diante dos esgotamentos evidentes em um planeta que grita. A luta por um novo estilo de vida na Terra é o começo de um processo importante, inadiável, para solucionar graves problemas ambientais, com repercussões sociopolíticas. 

A esperança cristã: um chamado à fraternidade universal e à ecologia integral

A esperança cristã, sublinha o Papa Francisco, não desilude e também não ilude. "O gemido da Criação, dos cristãos e do Espírito é antecipação e expectativa da salvação", explica o Pontífice. Em meio às muitas lutas e desafios, inspirando-se no testemunho de figuras ilustres da história e na vida da Igreja, não se pode deixar de investir em um novo modo de conviver com o semelhante, marcado pela fraternidade universal e pela paz. O impulso vem do cultivo da amizade social, que contempla, de modo inegociável, a responsabilidade por uma ecologia social, humana e integral. A luta moral dos cristãos está vinculada ao gemido da Criação, ferida por iniciativas destruidoras.  Na busca pela libertação de todos os seres humanos, está incluída a tarefa de superar os abusos contra a natureza. É hora de todos se contraporem ao processo de degradação do meio ambiente. Um gesto de conversão que inclui passar da arrogância de quem quer dominar a natureza e os outros à humildade de quem cuida dos outros e da Criação, conforme diz o Papa Francisco. 

O cuidado como princípio: limites éticos para o progresso e a tecnologia

Cuidado é o princípio fundamental para alavancar grandes mudanças, deixando de lado a desmedida ambição que almeja simplesmente o lucro e o consumo sem limites. O princípio do cuidado sustenta-se em Deus, referência inigualável e insubstituível na qualificação das relações entre seres humanos e da humanidade com o restante da Criação. É preciso repensar o que significa e quais são os limites do poder humano. Uma reflexão necessária, para adequadamente mensurar as consequências dos progressos tecnológicos impressionantes que, ao mesmo tempo, são perigosos, capazes de colocar em risco o conjunto da vida e a sobrevivência humana. 

Repensando o poder humano: a necessidade de limites éticos para a inteligência artificial

Adverte o Papa Francisco: um poder descontrolado gera monstros. Por isso é urgente colocar limites éticos ao desenvolvimento da inteligência artificial, prezando sempre pela verdade, pelo bem, a serviço da paz e do desenvolvimento integral. Tenha-se presente que a defesa do meio ambiente não é apenas uma questão ética, mas também teológica, com reflexões sobre a existência humana à luz do mistério de Deus. Um horizonte de compreensão que pode, frutuosamente, situar a humanidade contemporânea em um outro patamar, sensibilizando-a para agir em resposta ao convite: ouça o grito da Terra.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/ouca-o-grito-da-terra/

15 de setembro de 2024

Fazer bem todas as coisas!

Aprender com a Sagrada Família de Nazaré, o caminho para fazer bem todas as coisas

Os discípulos de Jesus de todos os tempos aprendem com o Mestre a forma adequada de agir nas diversas circunstâncias da vida. Sabendo que ele é Homem e Deus, pois é Deus com o Pai e o Espírito Santo, temos a certeza de nele encontrar o vade mecum de nossa caminhada nesta terra. Nossa fé cristã fará encontrar em Jesus Cristo os valores que estão em Deus. Deus é verdadeiro, Deus é bom, Deus é Justo, Deus é belo! Ao percorrer as páginas do Evangelho, nós o encontramos assim! No Evangelho proclamado no 23º Domingo do Tempo Comum, a Palavra nos diz com clareza e beleza: "Ele faz bem todas as coisas. Faz os surdos ouvirem e os mudos falarem" (cf. Mc 7,31-37). A ele podemos aplicar com precisão as palavras do salmista: "Tu és o mais belo dos homens, nos teus lábios se espalha a graça, por isso Deus te abençoou para sempre" (Sl 44,3).

Crédito: Julius Frank/Domínio Público

Valores na casa de Nazaré

Entremos na Casa de Nazaré, onde certamente encontramos alguns valores que nortearam a vida daquela família. Aproximemo-nos do Senhor para ver seu modo de agir e, como bons discípulos, aprender com o Mestre a fazer tudo de seu jeito. A primeira certeza é que Maria, a "agraciada", escolheu ser serva do Senhor (Lc 1,37). José, homem bom e justo (Mt 1,19), demonstrou ser da estirpe de Davi, vivendo permanentemente "dependurado" na vontade de Deus que lhe era revelada em sonhos. Maria e José nos legaram a responsabilidade diante dos planos de Deus. Sabemos que, antes de habitarem em Nazaré, os três foram peregrinos pelas estradas do Egito, fugindo da fúria de Herodes para salvar o que pertence a Deus a qualquer custo! Do Egito, retornaram a Nazaré.

Aprendendo e vivendo virtudes humanas

Ao colo de Maria e de José, Jesus, igual e nós em tudo, menos no pecado, mesmo sendo Filho de Deus, aprendeu a obedecer (cf. Hb 5,8-9) e também todas as virtudes humanas. Com os pais, aprendeu a conviver com os vizinhos, criou amizades com outras crianças, depois, adolescentes ou jovens; frequentou a Sinagoga de Nazaré; viveu com simplicidade e dedicação todos os passos humanos correspondentes à cultura da época e as práticas religiosas judaicas; aprendeu a profissão de José e a exerceu com perfeição.

Lições de Nazaré segundo São Paulo VI

Dá para imaginar, nas projeções oferecidas pelas pesquisas arqueológicas em Nazaré, os valores que resplandeciam na casa do Verbo de Deus feito homem, que foi conhecido como filho de um Carpinteiro. Parece-me ver uma pobre habitação com pedra ou terra batida no solo, mas limpinha e ordenada, pela mais expressiva mãe de família da história, a cheia de graça que é dona de casa! 

São Paulo VI (cf. Peregrinação à Terra Santa, em 1964), em visita a Nazaré, legou-nos uma percepção singular e profunda: "Nazaré é a escola para compreender a vida de Jesus: a escola do Evangelho. Aqui, aprende-se a olhar, a escutar, a meditar e penetrar o significado profundo e misterioso dessa manifestação tão simples, tão humilde e tão bela do Filho de Deus. Talvez se aprenda até a imitá-lo… Aqui se descobre a necessidade de observar o quadro de sua permanência entre nós: os lugares, os tempos, os costumes, a linguagem, as práticas religiosas, tudo de que Jesus se serviu para revelar-se ao mundo. Aqui, tudo fala, tudo tem um sentido. Aqui, se compreende a necessidade de uma disciplina espiritual para quem quer seguir o ensinamento do Evangelho e ser discípulo do Cristo… Não partiremos sem antes de colher algumas lições de Nazaré.

Primeiro, uma lição de silêncio. Que renasça em nós a estima pelo silêncio, essa admirável e indispensável condição do espírito em nós, assediados por tantos clamores, ruídos e gritos em nossa vida. O silêncio de Nazaré ensina-nos o recolhimento, a interioridade, a disposição para escutar as boas inspirações e as palavras dos verdadeiros mestres. Ensina-nos a necessidade e o valor das preparações, do estudo, da meditação, da vida pessoal e interior, da oração que só Deus vê no segredo. Uma lição de vida familiar. Que Nazaré nos ensine o que é a família, sua comunhão de amor, sua beleza simples e austera, seu caráter sagrado e inviolável; aprendamos de Nazaré o quanto a formação que recebemos é doce e insubstituível: aprendamos qual é sua função primária no plano social. Uma lição de trabalho. Ó Nazaré, ó casa do "filho do carpinteiro"! É aqui que gostaríamos de compreender e celebrar a lei, severa e redentora, do trabalho humano; aqui, restabelecer a consciência da nobreza do trabalho; aqui, lembrar que o trabalho não pode ser um fim em si mesmo, mas que sua liberdade e nobreza resultam, mais que de seu valor econômico, dos valores que constituem o seu fim. E como gostaríamos de saudar aqui todos os trabalhadores do mundo inteiro e mostrar-lhes seu grande modelo, seu divino irmão, o profeta de todas as causas justas, o Cristo nosso Senhor". 

Sinais do Reino de Deus em nós

Este Senhor, que faz os surdos ouvirem e os mudos falarem (Mc 7,31-37) não deixa ninguém passar ao seu lado sem oferecer atenção, cura, libertação e misericórdia! Nele se encontram os sinais e a realização dos sonhos proféticos (cf. Is 35,4-7) apresentados na Liturgia do Domingo que celebramos!

Vivendo como filhos de Deus

Quiçá nós também aprendamos as virtudes humanas que nos diferenciam de tantas pessoas, não por orgulho e, menos ainda, por fanatismo, mas para sermos sinais visíveis do Reino de Deus, que não virá apenas na plenitude da história, mas já está presente, "reino da verdade e da vida, reino da santidade e da graça, reino de justiça, do amor e da paz" (cf. Prefácio da Solenidade de Cristo Rei). Resplandeça em nossa casa a harmonia e o bom gosto da casa da Sagrada Família! Cuidemos dos pequenos detalhes nascidos da atenção de uns com os outros, desde um quarto arrumado, passando pela alimentação bem preparada e pela hospitalidade cultivada, com a qual acolhemos as outras pessoas. Da casa para o trabalho digno, seja qual for, deixemos que nossas mãos sejam a extensão de nosso bom coração, conscientes de sermos colaboradores de Deus no aperfeiçoamento de cada recanto de sua criação!

Enfim, não seja a nossa vida nivelada pelo rodapé da existência, mas projetada com grandes ideais, dignos dos filhos de Deus, que nos quer felizes desde esta terra e para a eternidade!

 

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/sociedade/fazer-bem-todas-as-coisas/

13 de setembro de 2024

São Gabriel Arcanjo, o poderoso mensageiro de Deus

Gabriel: o anjo da Boa-Nova e seu papel na história da salvação

A Sagrada Escritura menciona o Arcanjo Gabriel quatro vezes: duas no Antigo Testamento, no livro de Daniel, e duas no Novo Testamento, no Evangelho de Lucas. A primeira vez que Gabriel aparece, ele está respondendo ao chamado de uma voz superior, explicando uma visão misteriosa que o profeta Daniel teve às margens do rio Ulai, na Mesopotâmia. "Enquanto eu, Daniel, considerava a visão e tentava compreendê-la, eis que diante de mim apareceu um ser com aspecto de homem; ouvi a voz de um homem no meio do Ulai, que gritava e dizia: 'Gabriel, explica-lhe a visão'" (Dn 8,15-16). Diante da magnitude da mensagem, Daniel desmaia.

Gabriel informa a Daniel sobre uma série de potências que se oporiam ao povo de Deus, mas sua mensagem mais importante é o anúncio da vinda do Messias: "Enquanto eu ainda falava e orava, confessando meu pecado e o do povo de Israel, e apresentava minha súplica ao Senhor, meu Deus, pelo monte santo de Deus, Gabriel, que eu tinha visto antes em visão, voou rapidamente até mim; era a hora da oferta da tarde" (Dn 9,20-21).

Crédito: sedmak / GettyImages

No Novo Testamento, Gabriel revela sua missão de forma mais clara. Ele aparece ao sacerdote Zacarias, no templo de Jerusalém, enquanto este oferecia incenso, e se apresenta dizendo: "Eu sou Gabriel, que estou diante de Deus, e fui enviado para falar contigo e te anunciar esta boa nova" (Lc 1,19). Seis meses depois, Gabriel é enviado por Deus a uma virgem chamada Maria, em Nazaré, anunciando a concepção do Salvador: "Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo" (Lc 1,28).

Gabriel: O Portador da Boa-Nova

O nome Gabriel, com sua raiz hebraica "Gabr", significa "fortaleza de Deus". Tradicionalmente, o nome tem sido interpretado como "Deus é forte" ou "A força de Deus", embora alguns estudiosos prefiram traduzi-lo como "Deus foi forte", referindo-se à manifestação da força divina.

Gabriel é, por excelência, o arcanjo das boas novas. Foi ele quem trouxe a notícia mais importante de todas: a encarnação do Filho de Deus. Nas homilias de São Gregório Magno, ele explica que a Virgem Maria não foi visitada por qualquer anjo, mas por Gabriel, um dos maiores arcanjos, devido à grandeza do anúncio que ele trazia.

Gabriel também aparece como o anjo que anuncia o nascimento de crianças especiais que terão grandes missões, como São João Batista, o precursor de Cristo. Ao sacerdote Zacarias, Gabriel diz: "Não temas, Zacarias, porque tua oração foi ouvida, e Isabel, tua esposa, te dará um filho, e lhe porás o nome de João" (Lc 1,13). Gabriel é, portanto, o arcanjo da vida nascente, aquele que anuncia a vinda de novas vidas.


O Culto a São Gabriel e Seu Patronato

O culto ao arcanjo Gabriel é antigo na Igreja Católica, remontando à festa da Anunciação. Na tradição oriental, sua festa era celebrada no dia 26 de março, um dia após a Anunciação. No Ocidente, a devoção a Gabriel se consolidou, e, em 1925, o Papa Bento XV estabeleceu a festa no dia 24 de março. Com a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, a festa dos três arcanjos – Miguel, Gabriel e Rafael – passou a ser celebrada em conjunto no dia 29 de setembro.

São Gabriel foi proclamado patrono das telecomunicações pelo Papa Pio XII, em 1951, reconhecendo-o como o mensageiro celestial que trouxe à terra o maior dos anúncios: a encarnação do Verbo de Deus. Em 1972, o Papa Paulo VI estendeu seu patronato aos serviços postais, destacando sua missão de levar a mensagem divina a todos os povos.

Na iconografia cristã, Gabriel é frequentemente retratado com uma lanterna acesa, simbolizando a luz da verdade, ou segurando um lírio, representando a pureza de Maria na Anunciação. Suas palavras no momento da Anunciação, "Ave, cheia de graça", são repetidas por milhões de católicos diariamente na recitação do Santo Rosário.

Como Pedir a Intercessão de São Gabriel

São Gabriel, como mensageiro de Deus, é um poderoso intercessor para aqueles que buscam transmitir mensagens importantes ou para aqueles que desejam ser fortalecidos na fé. Ele também é invocado pelas famílias que anseiam por filhos e pelos que esperam boas novas em momentos de dificuldade.

A oração do "Angelus", que rememora o anúncio do arcanjo Gabriel a Virgem Maria, é uma forma tradicional de pedir sua intercessão. Rezar essa oração três vezes ao dia (manhã, meio-dia e noite) é um convite para que Gabriel nos guie e nos proteja em nosso caminho de fé.

Em conclusão, São Gabriel é uma figura central na história da salvação, desde o Antigo Testamento até a Anunciação e o nascimento de Cristo. Seu papel como mensageiro de Deus o torna um intercessor especial para todos os que buscam boas novas, força espiritual e orientação divina. Seja nas orações do Rosário, no Angelus ou em preces pessoais, podemos confiar na intercessão de São Gabriel para que ele continue a nos trazer a luz e a força de Deus em nossa vida.

 

Rafael Brito
Professor católico, Brito é doutorando em Teologia Dogmática junto a Pontificia Università Gregoriana (2019-), Mestre em Filosofia pela Pontificia Università Gregoriana (2019), com especialização em Ética, Antropologia Filosófica e Filosofia Política. Ele tem Mestrado em Teologia Dogmática e Fundamental pela Pontificia Facoltà Teologica della Sardegna (2017) e é Bacharel em Teologia também pela Pontificia Facoltà Teologica della Sardegna (2015).


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/sao-gabriel-arcanjo-o-poderoso-mensageiro-de-deus-como-podemos-pedir-sua-intercessao/

11 de setembro de 2024

O suicídio é uma questão que exige atenção imediata

O suicídio é uma ocorrência complexa e multicausal, influenciada por fatores psicológicos, biológicos, sociais e culturais. Dados da Organização Mundial da Saúde, apontam que mais de 700 mil pessoas morrem por ano devido ao suicídio, representando assim uma a cada 100 mortes registradas. No Brasil, acontece uma morte por suicídio a cada 45 minutos, mas para cada morte temos outras 20 tentativas. Os números são altos e preocupantes.

Entendendo as causas do suicídio

As pesquisas revelam que os casos de suicídio têm aumentado no mundo todo, chegando a ocupar a quarta posição entre as principais causas de morte nas faixas etárias de 15 a 44 anos. Ficando atrás de acidentes no trânsito, tuberculose e violência interpessoal.

Especialistas associam o consumo de álcool e substâncias psicoativas durante a infância e adolescência, com forte relação nos casos de suicídio entre jovens. Encontramos esse traço em cerca de 36% a 37% da população que cometeu suicídio. Outro fator que tem ganhado a atenção de estudiosos é a restrição do sono como fator relevante para a manutenção da saúde mental de modo geral, mas, principalmente, quando relacionada a crianças, adolescentes e o desenvolvimento infanto-juvenil.


Os transtornos mentais são caracterizados, de modo geral, por mudanças no padrão de comportamentoque trazem prejuízos nas atividades do dia a dia. Alertas são enviados através de mudanças na rotina do indivíduo, e isso traz impacto negativo para sua vida. Seja no trabalho, na vida social, na vida escolar ou em qualquer outro âmbito. Entre as crianças e adolescentes, os pais precisam ficar atentos aos seguintes sinais:

– Mudanças na rotina do sono (insônia ou alteração de horários para
dormir e acordar);
–  Isolamento da família e do contato social de forma repentina;
– Comentários como "eu prefiro morrer do que passar por isso";
– Uso de roupas de mangas longas, mesmo quando está calor,
comportamento que pode indicar marcas de automutilação nos braços ou
antebraços;
– Diminuição do rendimento escolar.

Suicídio não é falta de coragem de viver, é dor imensurável

Importante destacar que toda ameaça de suicídio deve ser tratada com seriedade. Se a pessoa fala que vai tentar se suicidar, que está querendo morrer, não podemos nos apegar àquela antiga frase: "cão que late, não morde". Cão que late, morde sim. Se uma pessoa falou sobre isso, ela precisa entrar em um projeto de cuidado, de atenção e de atendimento. Pode não ser hoje, pode não ser amanhã, mas pode acontecer.

O suicídio não é falta de coragem para viver. É busca estrema de findar um sofrimento. Precisamos sim pensar e falar sobre o assunto. Levar programas até as escolas, hospitais, igrejas e todos os ambientes coletivos, até chegarem aos que mais necessitam da escuta e ajuda.

Precisamos pensar também na posvenção, que é o conjunto de ações para promoção do cuidado prestado aos sobreviventes enlutados por um suicídio, para evitar que novas tentativas aconteçam no mesmo núcleo familiar ou escolar, pois a desorganização e a busca por motivo e culpados é constante e precisa de suporte profissional.

Psicóloga Karina Maria da Luz
CRP: 06/109600
@psi_karinaluz


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/comportamento/o-suicidio-e-uma-questao-que-exige-atencao-imediata/

9 de setembro de 2024

Um olhar contemplativo, inspirado pela fé

Construindo de uma sociedade justa e fraterna

A humanidade precisa sempre manter o olhar contemplativo, é o que pede o Papa Francisco, inspirando necessária reflexão: a expressão "contemplativo" indica um modo específico de olhar. Há muitos olhares que se desdobram em interpretações sobre o mundo, definindo os rumos da vida. Cada olhar define universos de compreensão sobre pessoas, grupos e segmentos, opções políticas e posturas cidadãs. Determina prioridades e influencia a configuração de cenários na sociedade. Por isso mesmo é tão importante o olhar contemplativo que, conforme ensina o Papa Francisco, é alcançado pela sabedoria da fé. A fé configura e nutre o olhar contemplativo, emoldurando o horizonte de compreensão que permite reconhecer: todos os seres humanos fazem parte da mesma família, fundamento para se adotar o princípio da fraternidade solidária. Este olhar qualificado tem força para definir a inclusão social como prioridade, iluminado pela certeza de que os bens da terra são de destinação universal. 

Solidariedade e compreensão da cidade

E a solidariedade é a direção alcançada por meio do olhar contemplativo, que leva a compreender a cidade, habitada por todos, como ambiente que deve estar sempre com as portas abertas. Uma compreensão capaz de inspirar ações que objetivem consolidar a paz e a justiça, essenciais para que o ser humano conviva harmonicamente. Quando se enxerga a cidade com um olhar contemplativo, marcado pela luz da fé, identifica-se a presença de Deus nas casas, ruas e praças. A descoberta de Deus em tudo que integra a cidade, especialmente nos seus habitantes, é fonte de incondicional respeito à dignidade de cada pessoa, corrigindo descompassos assustadores: a injustiça promovida, inclusive a partir do silêncio conivente, é um dos impulsos da violência e, consequentemente, da insegurança. Um antídoto para esse cenário é o olhar contemplativo, que permite alcançar a competência humano-espiritual para adequadamente tratar o semelhante, sem preconceitos ou discriminações, um caminho para a fraternidade e o bem-viver. O olhar qualificado pela fé permite enxergar as riquezas que habitam o semelhante, possibilitando a valorização de sua cultura, motivando gestos de acolhida, dinâmicas que levam a um mútuo enriquecimento. 

Um olhar contemplativo, inspirado pela fé

Diálogo e superação de disputas

Com o olhar contemplativo, a mente humana encontra caminhos para construir entendimentos a partir do diálogo, superando recursos mordazes presentes em determinados tipos de críticas que acirram disputas, levando apenas à perda de energias, ao obscurecimento de soluções. Essas críticas buscam simplesmente impor opiniões, em uma dinâmica estabelecida por pessoas que apenas enxergam os lados dos vencidos e dos vencedores. Essa visão parcial compromete, inclusive, a paz, em diferentes instâncias e situações, com prejuízos maiores para os mais frágeis e desprotegidos da sociedade. Ao invés de almejar vitórias em disputas, o olhar contemplativo inspira a sensibilidade para a inegociável consideração de todos como membros da família humana. Pode garantir a governantes a virtude de alicerçar suas decisões na busca pelo bem comum e pela justiça, alcançando competência e agilidade para efetivar políticas públicas capazes de inspirar mais acolhimento, cuidado com os pobres, migrantes e vulneráveis. Assim, o olhar contemplativo evita corrupções ou manipulações de recursos para finalidades egoístas. 

Cidades como canteiros de paz

Do olhar contemplativo brota uma fonte sapiencial que permite reconhecer caminhos para a paz social e que levam também à justiça solidária, traduzida e espelhada em legislações capazes de gerar mais igualdade. Conforme afirma o Papa Francisco, essa sabedoria alcançada por um olhar qualificado pode transformar as cidades em canteiros de paz, superando cenários similares a arenas onde prevalece a violência, ou a ilhas onde ficam isolados aqueles que têm muitas riquezas, distantes de quem é privado dos bens essenciais. O olhar contemplativo amplia a inteligência humana a partir de princípios humanitários para dissipar a vergonha dos cenários de exclusão e de misérias. Permite reconhecer as dores dos sem trabalho, dos excluídos do mundo da educação, dos que passam fome, dos migrantes e refugiados. É um olhar essencial para constituir nova sociedade marcada pela justiça. Nesse sentido, inspira o desejo de progredir e avançar nos próprios negócios sempre no horizonte do desenvolvimento integral, sensível aos anseios dos pobres, das crianças, dos jovens e dos idosos desamparados. 


A fé como alimento do olhar contemplativo

A fonte que alimenta o olhar contemplativo é a fé, que permite reconhecer: Deus protege e cuida dos pobres, na contramão de corações que apenas multiplicam focos de guerra, com destruições irracionais de bens e de vidas. Importante dizer que o olhar contemplativo vai além de simplesmente cultivar um coração misericordioso diante dos sofrimentos dos semelhantes. É um olhar que se desdobra em atitudes concretas voltadas à promoção de uma vivência digna para todos, contribuindo para que a casa comum seja regida por princípios civilizatórios capazes de inspirar o respeito ao meio ambiente. Busque-se este gesto simples, mas com grande poder de transformação – capaz de promover a paz interior e, ao mesmo tempo, qualificar ações de impacto social: a partir da iluminação que vem da fé, cultivar o olhar contemplativo. 

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/um-olhar-contemplativo-inspirado-pela-fe/

8 de setembro de 2024

A Palavra de Deus, luz para os nossos passos

Ouvir, praticar e viver a Palavra de Deus

Todo israelita fiel aprendeu a repetir com expressiva frequência a palavra do Livro do Deuteronômio: "Escuta, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças. E trarás gravadas no teu coração todas estas palavras que hoje te ordeno. Tu as repetirás com insistência a teus filhos e delas falarás quando estiveres sentado em casa ou andando a caminho, quando te deitares ou te levantares. Tu as prenderás como sinal à tua mão e as colocarás como faixa entre os olhos; tu as escreverás nas entradas da tua casa e nos portões da tua cidade" (Dt 6, 4-9). 

A importância da Palavra de Deus em nossa vida

Nessa fidelidade está também enraizada nossa atitude diante da Palavra de Deus, que desejamos assumir para o mês da Bíblia, uma iniciativa pedagógica da Igreja no Brasil para aproximar-nos da Escritura com um coração bom e puro, exercendo a importante inteligência da fé! Neste final de semana, é também do Deuteronômio que ouvimos preciosas recomendações: "Agora, Israel, ouve as leis e os decretos que eu vos ensino a cumprir, para que, fazendo-o, vivais e entreis na posse da terra prometida pelo Senhor Deus de vossos pais. Nada acrescenteis, nada tireis, à palavra que vos digo, mas guardai os mandamentos do Senhor vosso Deus que vos prescrevo. Vós os guardareis, pois, e os poreis em prática, porque neles está vossa sabedoria e inteligência perante os povos" (cf. Dt 4,1-2.6-8).

A Palavra de vida eterna

A Palavra de Deus na liturgia e na leitura diária

O primeiro espaço em que Deus "toma a palavra" é a Assembleia Litúrgica, especialmente na Missa de Domingo, nossa Páscoa semanal. Como a fé vem pelo ouvido (cf. Rm 10,17), na proclamação da Palavra realizada em cada Liturgia, lembrando que se abre para nós a "Mesa da Palavra", ouvir com atenção e coração aberto. Temos percebido o esforço de nossas equipes de celebração para formar bem as pessoas que devem prestar este serviço nas Paróquias. E tenhamos atenção aos sinais que a Igreja usa para nos incentivar a este carinho com a Palavra, como o Evangeliário levado pelo Diácono com solenidade na procissão de entrada, as inclinações, a procissão antes do Evangelho, o beijo do Evangeliário, o incenso e outras expressões adequadas, a Homilia, uma "conversa familiar sobre a Palavra proclamada". É o Senhor que toma a palavra na proclamação da Palavra!

E, a partir daí, aproximemo-nos com renovada disposição da Palavra de Deus, que há de ser luz para os nossos passos nos variados e desafiadores caminhos de nossa vida e de nosso tempo. Valem algumas recomendações para o contato com a Bíblia. A primeira é justamente a leitura contínua e fiel da Escritura. Algumas pessoas querem saber o como começar a leitura! Pois bem! Uma das propostas viáveis, e transmito o que aprendi desde muito jovem, é começar a leitura pelos Evangelhos, depois os Atos dos Apóstolos e as Cartas de São Paulo e outros. Depois, toma-se o Antigo Testamento, começando pelo Livro do Gênesis. Ao final, chega-se ao Apocalipse, como coroamento e acendimento da Esperança que sustenta nosso caminho. Muitas pessoas têm experimentado dedicar quinze minutos diários à leitura contínua da Bíblia, e percebem que, no correr de um ano, leram o texto completo. 

O livro de Ezequiel e o Jubileu 2025

Para o mês de setembro, que se inicia, a Igreja no Brasil propõe o Livro de Ezequiel, leitura iluminada pelo lema "Porei em vós meu espírito e vivereis" (cf. Ez 37,14). Ao refletir sobre o testemunho do profeta Ezequiel, pode-se responder ao convite feito pelo Papa Francisco à preparação para o Jubileu 2025. "O convite para que sejamos peregrinos de esperança nos faz ser como Ezequiel: arautos da esperança em meio àqueles que, porventura, possam ter se esquecido de Deus ou perdido o seu caminho".

Rezando com a Bíblia

Quem quiser, e todos devemos querer, rezar com a Bíblia, pode começar a ler um capítulo até encontrar, conduzido pelo Espírito Santo, um versículo ou palavra que chama mais a atenção, ouvir mais de perto e conversar com o Senhor a partir daquele texto, inclusive com um propósito de vida. Podemos também ter um caderno no qual anotamos as inspirações e os passos dados com a força da Palavra de Deus.


A prática da leitura orante (Lectio Divina)

Vale a pena renovar ainda a proposta da chamada Leitura Orante da Palavra de Deus (Lectio Divina), semelhante ao que acabamos de apresentar, uma prática antiga, frutuosa e sempre atual: Leitura, com a qual procuramos entender a Palavra, inclusive fazendo-nos ajudar pelas notas existentes em nossas Bíblias, indo com liberdade aos textos paralelos e semelhantes, pois a Palavra explica a Palavra; depois, Meditação, com a qual perguntamos o que Deus quer nos dizer naquele dia e naquela hora com o texto à nossa disposição, e é bom anotar, num eventual diário espiritual, as inspirações recebidas; em seguida, Oração, para conversar com o Senhor a partir de sua própria Palavra. Se perguntamos antes o que Ele quer dizer, agora é para dizer-Lhe o que o próprio Espírito Santo inspira; consequência será a Contemplação, sagrado silêncio, olhando para o Senhor e deixando que Ele nos veja; ao final, um propósito de Ação, Vivência da Palavra a ser anotada para não nos esquecermos.

A Palavra que se faz Carne em nós

A Liturgia celebrada na Igreja, neste final de semana, abre ainda os nossos olhos e nosso coração para um aspecto importante na recomendação da Carta de São Tiago (cf. Tg 1,17-18.21b-22.27): "Sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos. Com efeito, a religião pura e sem mancha diante de Deus Pai, é esta: assistir os órfãos e as viúvas em suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo". Cada Palavra saída da boca de Deus há de ser praticada. Em nós, ousamos afirmar que a Palavra há de fazer-se carne, transformar-se em vida, capaz de edificar e converter o nosso coração e das pessoas que conosco convivem.

A autenticidade da vida cristã

Tudo isso vem selado com a Palavra do Evangelho, que apela para autenticidade e coerência de nossa vida cristã: "Jesus chamou a multidão para perto de si e disse: 'Escutai todos e compreendei: o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior. Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo. Todas estas coisas más saem de dentro, e são elas que tornam impuro o homem'" (cf. Mc 7,1-8.14-15.21-23).

Oração do salmo 14

Assim dispostos, possamos rezar com sinceridade o Salmo 14, que a Igreja põe em nossos lábios na riquíssima Liturgia do vigésimo segundo Domingo do Tempo Comum: "Senhor, quem morará em vossa casa e no vosso monte santo, habitará? É aquele que caminha sem pecado e pratica a justiça fielmente; que pensa a verdade no seu íntimo e não solta em calúnias sua língua. Que em nada prejudica o seu irmão, nem cobre de insultos seu vizinho; que não dá valor algum ao homem ímpio, mas honra os que respeitam o Senhor. Não empresta o seu dinheiro com usura, nem se deixa subornar contra o inocente. Jamais vacilará quem vive assim!" (Sl 14, 2-3a.3cd-4ab,5).

 

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/biblia/palavra-de-deus-luz-para-os-nossos-passos/

7 de setembro de 2024

O que não nos contaram sobre a independência do Brasil?

O catolicismo, o Brasil e Portugal

O catolicismo e os reis portugueses – A história do Brasil, geralmente, é dividida em três etapas principais: o período da Colônia, o período do Império e a República. A maior parte de nossa história e nosso processo de formação ocorreu a partir da gradual ocupação lusitana do litoral brasileiro – e se desenvolveu com o avanço dos padres jesuítas e dos bandeirantes em direção ao interior.

O Brasil nasceu como extensão e prolongamento da civilização católica-lusitana. Existia em Portugal um fortíssimo senso cristão: o povo do antigo Condado Portucalense havia passado pela Guerra de Reconquista, uma longa luta contra os invasores islâmicos. Em 1415, ainda no espírito da Reconquista, Dom João I (Mestre de Avis) conquistou Ceuta no Marrocos, e aí tem início a expansão portuguesa e a formação de seu Império.

Além disso, todo rei de Portugal era líder da Ordem de Cristo: uma ordem militar, que tinha sua origem nos antigos cavaleiros templários. O símbolo da Ordem era a Cruz de Malta (que estava presente nas caravelas portuguesas).

A fé como motor da expansão portuguesa

Quando o Brasil foi descoberto pelos portugueses liderados por Pedro Álvares Cabral em 1500, tal descoberta estava intimamente vinculada à fé e religião dos lusitanos: "a Religião e o descobrimento das terras brasileiras se confundem num só fato histórico", conforme nos ensina o padre Júlio Maria de Morais. E ainda nos diz que a primeira missa foi o ato inicial de nossa nacionalidade. A descoberta se deu em 22 de abril e, em 26 do mesmo mês, frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa.

Durante o século XV e XVI, os navios do Império português sulcaram as águas do oceano Atlântico e do Índico, incorporaram ilhas e territórios africanos ao seu Império. Entretanto, em 1580, Portugal acabou caindo sob domínio da Espanha: com desaparecimento do rei lusitano D. Sebastião em Alcácer-Quibir, Filipe II de Espanha se tornou rei de Portugal. O domínio filipino (ou União Ibérica) se estendeu de 1580 até 1640, quando os portugueses se libertam aclamando como rei Dom João IV.

Crédito: Leonidas Santana / GettyImages

Dom João IV era o duque de Bragança, uma influente família que possuía grande poder e influência em Vila Viçosa (Alentejo). Aproveitando-se de uma crise na Espanha, em 15 de dezembro de 1640, Dom João IV foi aclamado como rei de Portugal, fundando a dinastia de Bragança. Uma das primeiras ações do novo rei foi "dedicar a coroa de Portugal a Nossa Senhora da Conceição e torná-la padroeira do país", conforme nos diz Rezzutii.

O Brasil ganhou grande importância durante o reinado da dinastia de Bragança: já na época de Dom João IV, durante a Época de Ouro de Dom João V e com a vinda da Família Real e da Corte Portuguesa, durante a regência de Dom João VI.

Dom João VI e o Brasil

A vinda da família real – No final do século XVIII, uma grande confusão se apoderou da Europa: na França, em 1789, a Revolução Francesa estimulada pelos maçons e iluministas estava gerando caos e confusão. O rei Luís XVI foi assassinado, assim como, depois, sua esposa Maria Antonieta. Uma parte do clero faz havia apostatado e jurado fidelidade à nova ordem revolucionária (clérigos juramentados).

No final da Revolução Francesa, subiu ao poder o general corso Napoleão Bonaparte. Napoleão tinha intenção de criar um grande império na Europa. Assim, passou a invadir as nações e monarquias europeias. Contudo, ele possuía uma grande rival que desejava fervorosamente destruir: a Inglaterra (Império Britânico).


E qual a relação disso tudo com Portugal? Portugal era o grande aliado dos britânicos. Dom João VI (príncipe-regente) desejava manter a autonomia de Portugal e não era conveniente para o país cortar relações a Inglaterra. Irritado e cansado da política dos lusitanos, Napoleão decidiu invadir Portugal. Contudo, Dom João VI, prevendo o movimento de Napoleão, decidiu partir de seu reino com a Corte Portuguesa. Foi assim que, no final de 1807, a Família Real e a Corte, com apoio dos ingleses, partiram em direção ao Brasil.

O príncipe-regente chegou a Salvador (Bahia) em 22 de janeiro de 1808. Poucos dias depois, em 28, o príncipe assinou uma lei determinado a abertura dos portos do Brasil (para as "nações amigas"). Esta mudança foi decisiva na mudança de relação entre Brasil e Portugal. Em março de 1808, a Família Real e o príncipe-regente Dom João chegaram ao Rio de Janeiro (capital das terras do Brasil).

O governo de Dom João VI

No Brasil, Dom João VI começou uma série de mudanças: a) criou a Imprensa Régia; b) criou o Banco do Brasil e a Casa da Moeda; c) mandou trazer da Europa medidas para imunizar a população de doenças e hospitais foram fundados; d) a capital do Rio de Janeiro foi gradualmente ampliada e embelezada; e) criou o Conselho de Estado, a Intendência Geral de Polícia, o Conselho Superior Militar, etc.; f) criou a Junta Geral de Comércio; g) também foram criadas a Academia de Marinha, a Academia Militar Real e a Guarda Real de Polícia.

Durante o governo de Dom João VI no Rio de Janeiro, o Brasil foi elevado ao nível de Reino Unido: Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Após a morte de sua mãe, Dona Maria, Dom João foi aclamado e coroado como rei no Rio de Janeiro. Como fizera seu ancestral (Dom João IV), Dom João VI ligou-se à Nossa Senhora da Conceição e criou a Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa: "o novo monarca honrava a padroeira de Portugal, estabelecida pelo primeiro rei de Bragança" (…) Dom João VI, ao criar a Ordem de Nossa Senhora, ligava seu governo e sua aclamação ao passado católico de Portugal e a sua família ao gesto do primeiro rei de Bragança.

O processo de Independência

Havia uma questão: um vírus se espalhava no Império português. A maçonaria alastrava-se pelo Brasil desde o final do século XVIII. Aparentemente, a primeira loja maçônica do país foi estabelecida em Pernambuco: o Areópago de Itambé. Dom João VI, por volta de 1817 e 1818, tomou consciência do problema, mas muito tarde: em 1818, publicou um alvará condenando as "sociedades secretas" (leia-se: Maçonaria). Entretanto, as lojas maçônicas no Brasil e em Portugal agiam como centros de difusão das ideias iluministas da Revolução Francesa. A filosofia iluminista e suas ideias de liberalismo, constitucionalismo, republicanismo tomaram força.

Entre 1820 e 1821, ocorreu em Portugal uma rebelião: a Revolução do Porto. Uma sociedade secreta (o Sinédrio) organizou grupos deputados, políticos, comerciantes etc. que passaram a exigir o retorno de Dom João VI para Portugal.

Jean Klisman Mateuzi – Católico, casado, pai de dois filhos. Atuante como professor de História no Ensino Fundamental II e Ensino Médio; Formado em História pelo Centro Universitário Fundação Santo André, também estudei (e ainda estudo) no Seminário de Filosofia do Olavo de Carvalho.


Referências bibliográficas
Rezzutti, Paulo. Independência: a História não contada.
Góis, Marcus. Dom João VI – o Trópico Coroado;
Fausto, Boris. História do Brasil.
Andrade, Marcelo. 1822 : a Separação do Brasil.
Carneiro, Padre Júlio Maria. O Catolicismo no Brasil.