"O amor sempre dá a vida. Por isso, o amor conjugal 'não se esgota no interior do próprio casal (…). Os cônjuges, enquanto se doam entre si, doam para além de si mesmos a realidade do filho, reflexo vivo do seu amor, sinal permanente da unidade conjugal e síntese viva e indissociável do ser pai e mãe'" (Papa Francisco, Exortação Apostólica Amoris laetitia, no 165). Homens e mulheres possuem, portanto, uma missão sublime: participam da criação de Deus, são instrumentos do amor divino e recebem a responsabilidade de perpetuarem as gerações dos filhos de Deus.
Como é imprescindível ter tal consciência quando se quer formar uma família! Numa sociedade atual, marcada pelo egoísmo e por projetos pessoais não confiados em Deus, um filho é visto, tantas vezes, como um projeto de realização pessoal. Não! De forma alguma! Os filhos são dons, dádivas de Deus!
Os filhos não podem ser projetos de realização pessoal, eles são dons de Deus
É Ele quem escolhe e dá a vida. Com isso, segundo as orientações da Doutrina da Igreja, não é lícito lançar mão de técnicas artificiais para ter os filhos ou, ao contrário, impedir a abertura à vida por meio de métodos contraceptivos. São Paulo XVI, em sua Encíclica Humanae Vitae, muito bem orientou sobre isso e quanto ao uso dos métodos naturais de planejamento familiar:
Na missão de transmitir a vida, eles não são, portanto, livres para procederem a seu próprio bel-prazer, como se pudessem determinar, de maneira absolutamente autônoma, as vias honestas a seguir, mas devem, sim, conformar o seu agir com a intenção criadora de Deus, expressa na própria natureza do matrimônio e dos seus atos e manifestada pelo ensino constante da Igreja (Encíclica Humanae Vitae, n. 10).
A Igreja é coerente consigo própria, quando assim considera lícito o recurso aos períodos infecundos, ao mesmo tempo que condena sempre como ilícito o uso dos meios diretamente contrários à fecundação, mesmo que tal uso seja inspirado em razões que podem parecer honestas e sérias. Na realidade, entre os dois casos, existe uma diferença essencial: no primeiro, os cônjuges usufruem legitimamente de uma disposição natural; enquanto que, no segundo, eles impedem o desenvolvimento dos processos naturais. É verdade que em ambos os casos os cônjuges estão de acordo na vontade positiva de evitar a prole, por razões plausíveis, procurando ter a segurança de que ela não virá; mas é verdade também que, somente no primeiro caso, eles sabem renunciar ao uso do matrimônio nos períodos fecundos, quando, por motivos justos, a procriação não é desejável, dele usando depois nos períodos agenésicos, como manifestação de afeto e como salvaguarda da fidelidade mútua (Encíclica Humanae Vitae, no 17).
O caráter unitivo e procriativo do ato conjugal
O ato conjugal tem em si as características unitiva e procriativa. A primeira diz respeito ao amor dos cônjuges expressado na relação sexual, e o caráter procriativo se relaciona à abertura à vida. O casal, portanto, é convidado a ser reflexo do amor da Santíssima Trindade: uma comunhão plena do Pai, Filho e Espírito Santo que não se esgota em si, mas transborda de amor ao criar cada pessoa e concede a vida nova dada por Cristo em Sua Ressurreição. Da mesma forma, o amor fecundo dos esposos não fecha em si mesmo e está sempre aberto para que esse amor se renove e novas vidas sejam geradas.
Maternidade e paternidade responsáveis
Como ainda destaca o documento de Paulo VI, tal missão requer dos homens e mulheres uma consciência de sua missão expressa na "maternidade e paternidade responsáveis":
Em relação com os processos biológicos, paternidade responsável significa conhecimento e respeito pelas suas funções: a inteligência descobre, no poder de dar a vida, leis biológicas que fazem parte da pessoa humana. Em relação às tendências do instinto e das paixões, a paternidade responsável significa o necessário domínio que a razão e a vontade devem exercer sobre elas. Em relação às condições físicas, econômicas, psicológicas e sociais, a paternidade responsável exerce-se tanto com a deliberação ponderada e generosa de fazer crescer uma família numerosa como com a decisão, tomada por motivos graves e com respeito pela lei moral, de evitar temporariamente, ou mesmo por tempo indeterminado, um novo nascimento.
Paternidade responsável comporta ainda, e principalmente, uma relação mais profunda com a ordem moral objetiva, estabelecida por Deus, de que a consciência reta é intérprete fiel. O exercício responsável da paternidade implica, portanto, que os cônjuges reconheçam plenamente os próprios deveres para com Deus, para consigo próprios, para com a família e para com a sociedade, numa justa hierarquia de valores (Encíclica Humanae Vitae, no 10).
A bela e exigente missão de doar a vida
Missão exigente, mas, talvez, a mais bela de todas, pois se trata de doação de vida! Desse modo, requer sacrifícios e maturidade na compreensão de que um filho é dádiva de Deus. Como também ressaltou o Papa Francisco, na Exortação Apostólica Amoris laetitia, muito tem se espalhado a mentalidade da geração de vida como uma satisfação pessoal:
[Uma criança] não é um complemento ou uma solução para uma aspiração pessoal, mas um ser humano, com um valor imenso, e não pode ser usada para benefício próprio. Por conseguinte, não é importante se esta nova vida lhe será útil ou não, se possui características que te agradam ou não, se corresponde ou não aos teus projetos e sonhos, porque "os filhos são uma dádiva!
Cada um é único e irrepetível (…). Um filho é amado porque é filho: não porque é bonito ou porque é deste modo ou daquele, mas porque é filho! Não porque pensa como eu, nem porque encarna as minhas aspirações. Um filho é um filho". O amor dos pais é instrumento do amor de Deus Pai, que espera com ternura o nascimento de cada criança, aceita-a incondicionalmente e acolhe-a gratuitamente (Exortação Apostólica Amoris laetitia, n° 170).
É nadar contra a maré de uma sociedade consumista e utilitarista! Somente com a graça do Espírito Santo é possível transformar o olhar sobre a beleza e a integridade de cada vida humana. Pais e mães são convidados a serem formadores e geradores de vidas, mas não donos absolutos delas. Os filhos não são concebidos para atender aos anseios dos pais. Esta não é a identidade da natureza humana criada por Deus.
Entregue sua família à Providência Divina
Voltando ao conceito de "paternidade responsável", isso não quer dizer que os casais não devam procurar as condições econômicas, emocionais e sociais para conceber um filho. Entretanto, tais condições e o desejo de gerar uma criança não podem ser um fim em si mesmo, mas sim um meio de realizar o projeto de Deus para a humanidade.
Se entregarmos os projetos familiares à Providência Divina, o amor se transbordará mais e mais! É libertador e traz paz ao coração compreender isso, até mesmo quando não se consegue alcançar uma gravidez. Obviamente, a parte humana deve ser feita: observância dos períodos férteis da mulher; busca de tratamentos adequados, quando forem necessários; uma vida saudável no corpo e na alma, inclusive uma sadia relação entre marido e mulher; não entrega à ansiedade e, sobretudo, confiança no poder de Deus e na intercessão da Virgem Maria.
Contudo, se, devido às circunstâncias da vida, uma gravidez não for possível, o conceito de fecundidade deve ser alargado. Ela pode se dar ainda por meio da adoção e da contribuição que os casais podem oferecer à sociedade: em atos de solidariedade; assistência aos abandonados; suporte espiritual e emocional aos que sofrem; luta por justiça social nos diversos serviços pastorais das paróquias, comunidades e dioceses; enfim, são inúmeras as formas!
A adoção é um ato de alargar o coração ao amor
Sobre a adoção, o Papa Francisco apoia firmemente:
A adoção é um caminho para realizar a maternidade e a paternidade de uma forma muito generosa, e desejo encorajar aqueles que não podem ter filhos a alargar e abrir o seu amor conjugal para receberem quem está privado de um ambiente familiar adequado. Nunca se arrependerão de ter sido generosos. Adotar é o ato de amor que oferece uma família a quem não a tem. É importante insistir para que a legislação possa facilitar o processo de adoção, sobretudo nos casos de filhos não desejados, evitando, assim, o aborto ou o abandono. Aqueles que assumem o desafio de adotar e acolhem uma pessoa de maneira incondicional e gratuita, tornam-se mediação do amor de Deus, que diz: "Ainda que a tua mãe chegasse a esquecer-te, Eu nunca te esqueceria" (cf. Is 49,15) (Exortação Apostólica Amoris laetitia, no 179).
Palavras encorajadoras e que ajudam a mudar o olhar. Se há a angústia porque não se consegue engravidar, adotar uma criança ou exercer a paternidade/maternidade de tantos outros modos é dar sentido ao sofrimento. O amor de Deus pode, assim, com tão grande contribuição, ser derramado mais e mais na sociedade e transformar vidas que nunca se pensou atingir!
A comunhão da Trindade é transbordada e a vida nova acontece em tantas pessoas por diversos meios.
Trecho extraído do livro "Nossa Senhora do Ó", de Gracielle Reis
Gracielle Reis
Gracielle Reis é missionária da Comunidade Canção Nova, sendo segundo elo, na missão de Portugal.
Carioca, jornalista pela Universidade Federal Fluminense (UFF): Bacharel e Licenciada em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ): e pós-graduação em Logoterapia, pela Associação de Logoterapia Viktor Emil Frankl (ALVEF).
Atualmente, jornalista na TV Canção Nova, em Portugal.
Em trabalhos com mulheres e famílias, também é instrutora do Método de Ovulação Billings e Consultora de Imagem, Estilo e Coloração Pessoal.
E-mail: graciellereis@gmail.com
Instagram: @gracielledasilvareis [https://www.instagram.com/gracielledasilvareis/]
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Fonte: https://formacao.cancaonova.com/familia/pais-e-filhos/os-filhos-sao-dons-de-deus/