22 de março de 2017

Adoção: amor que supera os laços físicos

Ao adotar, os pais têm a oportunidade de alargar seu amor para além dos vínculos da carne e do sangue

O dicionário nos dá uma definição clara e quase que definitiva da palavra "mãe": mulher ou qualquer fêmea que dá à luz um ou mais filhos, segundo o dicionário Aurélio. Porém, essa regra nem sempre é assim. Muitos casais, por motivos diversos, não conseguem ter filhos, e a mãe não pode cumprir essa etapa da gestação e do parto de seus filhos. Optam, então, por um gesto de amor incondicional, que é a adoção – palavra que significa ação ou efeito de adotar; aceitação involuntária e legal de uma criança como filho. Dessa forma, muitas mães e pais realizam seu sonho de maternidade e paternidade em todo o mundo.

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Foto: Daniel Mafra / cancaonova.com

Mais do que o desejo de ser pai e mãe, de formar uma família completa, o casal deve ter um bom preparo emocional para lidar com as questões advindas da adoção: como contar para o filho que ele é adotado, aceitar as diferenças físicas e emocionais da criança ou ainda relacionar-se com a sociedade ou com as dificuldades que possam encontrar no caminho.

Como qualquer ato jurídico, e muito mais ainda por se tratar de uma adoção, por acolher uma vida em sua família, o preparo emocional do casal é imprescindível; homem e mulher devem ter conversado bastante sobre a decisão, que não deve ser fruto apenas da vontade de uma das partes, para que não se torne um jogo de responsabilidades quando a criança vai crescendo e dá trabalho para os pais; ou seja, adotar é assumir, de forma humana, emocional, familiar e conjunta, um novo participante ativo desta família. É característica da adoção ser um ato irrevogável; uma vez realizada, é definitiva. Nem mesmo o eventual falecimento dos adotantes restabelece o pátrio poder dos genitores naturais.

O amor que gera é um dom de si

João Paulo II faz uma citação especial durante um encontro sobre famílias adotivas: adotar crianças, sentindo-as e tratando-as como verdadeiros filhos, significa reconhecer que as relações entre pais e filhos não se medem somente pelos parâmetros genéticos. O amor que gera é, antes de mais nada, um dom de si.

Há uma geração que vem do acolhimento, da atenção e da dedicação. A relação que daí brota é tão íntima e duradoura, que, de maneira nenhuma, é inferior à que se funda na pertença biológica. E traz ainda outras contribuições: (…) Os cônjuges que vivem a experiência da esterilidade física saberão inspirar-se nesta perspectiva, para todos rica de valor e empenho. (…) Os pais cristãos terão assim oportunidade de alargar o seu amor para além dos vínculos da carne e do sangue, alimentando os laços que têm o seu fundamento no espírito e que se desenvolvem no serviço concreto aos filhos de outras famílias, muitas vezes necessitadas até das coisas mais elementares.


É importante que os pais esclareçam para a criança, para que ela não se sinta desprezada nem menosprezada, principalmente quando existem outros irmãos na família, que as relações entre todos são iguais.

Adotar uma criança é um ato de amor incondicional, ou seja, um ato de aceitação do outro, independente de ter em sua origem o sangue e a natureza geracional dos pais que optaram por criar essa criança. O ventre amoroso mora, então, no coração dessa mãe e desse pai, desse casal que, juntos, assumem esse filho do coração e são capazes de supri-lo, dentre tantas necessidades, de amor e carinho familiar, que serão capazes de lhes dar valores que, por vezes, nunca teriam oportunidade de vivenciar em uma instituição de menores.

"Adotar uma criança é uma grande obra de amor" (Madre Teresa de Calcutá).

20 de março de 2017

Formar bons cristãos e honestos cidadãos

Como pais e educadores cristãos, nossa missão é fazer de nossos filhos discípulos do Senhor, que amem o Mestre e estejam prontos para segui-Lo

Como pais e educadores cristãos, devemos preparar a próxima geração para cumprir o propósito de Deus na história, com entendimento e determinação, "pois como poderei ver o mal que sobrevirá ao meu povo? E como poderei ver a destruição da minha parentela? (Ester 8,6). Porque, na verdade, tendo Davi servido à sua própria geração, conforme o desígnio de Deus, adormeceu, foi para junto de seus pais e viu corrupção" (Atos dos Apóstolos 13,36). Se nos descuidarmos da herança do Senhor, nossa luta será em vão.

Formar bons cristãos e honestos cidadãos
Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com

Há, na Bíblia, três instituições reconhecidas com autoridade e outorgadas por Deus: a família, a Igreja e o governo civil. Porém, só aos dois primeiros cabe prover educação. "E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor" (Efésios 6,4); "Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mateus 28,19), uma vez que o governo civil jamais poderia atuar em nome da família, representando seus valores e objetivos próprios. O Estado traduz o pensamento da coletividade, partindo do princípio de que a maioria está certa.

A sociedade deformando os cristãos

O que vemos nas escolas de hoje, em geral, é o desrespeito às autoridades, a falta de disciplina, o desinteresse pelo aprendizado, a irresponsabilidade, a influência de novas filosofias nos temas e nos livros, a baixa qualidade do ensino, a imoralidade, a corrupção entre outros. Portanto, biblicamente, escola só tem sentido como uma extensão da família, para com ela cooperar em aliança de princípios e propósitos e sob a cobertura espiritual da Igreja. A visão é de famílias unidas com a bênção da Igreja, trabalhando na formação de uma geração consciente de seus valores e responsabilidades, capacitadas para exercer seu ministério na sociedade e cumprir o propósito de Deus. Trata-se de uma aliança estratégica, para garantir a expansão do Reino, mesmo em meio a uma geração perversa e corrupta.


Como pais, como educadores, Igreja e cidadãos responsáveis, temos o dever de preparar a próxima geração, dando-lhe uma visão e treinando-a para alcançá-la.

Temos de resgatar o valor da criança e a união de gerações: avós, pais e jovens, todos trabalhando juntos no projeto da vida infantil. A criança e o adolescente que encontram um sentido nobre para sua vida não vão desperdiçá-la de maneira desordenada. A separação das gerações tem sido uma poderosa arma de destruição dos valores familiares, expondo os pequenos aos predadores sociais.

Formação do caráter

Além do mais, é preciso valorizar o caráter na formação do aluno para realidades que são fundamentais: o exemplo e trabalho árduo. Caráter pressupõe uma marca, uma gravação feita a partir de um molde, daí a necessidade de exemplo consistente.

Quanto ao trabalho árduo, a própria história nos ensina que a indolência, a comodidade e a ociosidade levam o homem ao declínio moral e à improdutividade. Quando fugimos da dificuldade ou privamos nossos filhos da dureza, estamos impactando o desenvolvimento do caráter deles.

A Igreja teria nisso um fator decisivo para apoiar o cumprimento da grande missão: "formar bons cristãos e honestos cidadãos", fortalecendo as famílias. Trata-se de uma aliança estratégica, na qual cada parceiro (Igreja, Escola e Família) contribui com aquilo que faz melhor, para realizar o propósito de Deus sob a mesma visão do Seu Reino.

17 de março de 2017

A vitória é possível mesmo diante das batalhas

Quem não tem a certeza da vitória jamais a conseguirá no campo de batalha da vida

Quando o povo hebreu saiu do Egito, houve dois acontecimentos muito parecidos: a passagem do Mar Vermelho (saída do Egito), e a passagem do Rio Jordão, na fronteira da Terra Prometida, ambas as situações buscavam a vitória.

A vitória é possível mesmo diante das batalhas
Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com

O primeiro acontecimento foi para levantar o ânimo dos fugitivos escravos, o que chamamos hoje de autoestima. Com essa experiência, eles se sentiram capazes de superar problemas invencíveis. Era a gasolina que necessitavam para atravessar as inclemências do deserto e poder vencer o número de obstáculos que ainda se apresentaria.

O segundo acontecimento, a passagem do Rio Jordão, era para que os habitantes de Canaã constatassem que o povo hebreu era acompanhado por um Deus poderoso, fiel à aliança e que cumpriria a promessa de entregar-lhes a Terra Prometida. Os habitantes de Jericó perceberam que se tratava de um Deus poderoso, que caminhava ao lado dos hebreus e era capaz de intervir com uma força sobrenatural para cumprir as promessas.

Josué enviou alguns espiões que exploraram e analisaram cuidadosamente tudo o que se referia aos moradores de Canaã. Os "repórteres" trouxeram duas versões.

A versão pessimista

"São gigantes invencíveis. Suas muralhas chegam ao céu. Somos simples gafanhotos a seus pés". Sim, tratava-se de um exército invencível, que tinha armas defensivas (as muralhas) e armas ofensivas (gigantes bem armados).

A versão otimista

"A terra é bela, a mais bela de todas as terras. Vale a pena todo esforço". Mas o mais importante foi que, desde antes de entrar em Canaã, Josué já havia imaginado as aspirações dos povos nômades, sedentos de território. Josué realiza então um gesto simbólico e profético: antes da batalha, divide o território. "Vamos tomar esta terra hoje mesmo. Ela é nossa". Está seguro que vai ganhar a batalha. Quem não tem a certeza da vitória na mente, jamais a conseguirá no campo de batalha da vida.

Assim, quando os hebreus chegaram à fronteira da Terra Prometida, sua fama e façanha já haviam penetrado as fronteiras de Canaã e conquistado a mente de seus inimigos, pois começaram a ter medo.

Os habitantes de Jericó tinham tudo para derrotar facilmente um exército que ainda estava à sombra da escravidão. Eles [os hebreus] eram nômades, sem armas, sem experiência ou poder militar. No entanto, os moradores de Jericó decidiram não lutar. Diz a Palavra que Jericó "estava trancada dentro de seus muros e barreiras". Eles olhavam uns para os outros e o medo crescia entre si. Já estavam derrotados, porque não queriam lutar.



A tática de Josué: dar sete voltas ao redor da cidade para fazer crescer o temor de um ataque que não veio. "De uma forma ou outra, vocês cairão em nossas mãos", disse ele. O medo cresceu tanto, que decidiram não se defender. Já tinham renunciado a atacar os hebreus. Agora, ruem e caem as muralhas defensivas da vida deles. Eles foram, então, presas fáceis para os inimigos, que eram bem menos fortes e capacitados.

Por que perdeu Jericó? O problema deles foi não atacar nem se defender, pois se deram por vencidos antes da batalha.

Tiveram medo da fama que precedia os hebreus: Seu Deus era poderoso. Os hebreus conquistaram Jericó não porque suas paredes caíram por milagre, mas porque seus habitantes não queriam lutar, pois se deram por derrotados antes mesmo de entrar na batalha.

Por que ganharam os hebreus?

Eles tomaram posse antes de entrar no território. Eles estavam convencidos da vitória. Sua mente era vitoriosa. Eles tinham um Deus poderoso ao lado deles, que os fez passar o Mar Vermelho para lhes dar autoconfiança.

Nas mãos dos adversários

Quando cruzamos os braços e não lutamos, estamos nas mãos dos nossos adversários. Quando decidimos atravessar o "Jordão", não podemos voltar, então não há outra estrada a não ser a luta e a vitória até o fim. Quando conhecemos os pontos fortes e fracos do inimigo ou a empreitada, queremos ganhar, estamos mais bem preparados para a batalha.

Quando, num ato real, tomamos posse do desafio que está diante de nós, então somos capazes de superá-lo. Acima de tudo, na vitória ou na derrota existe um fato definitivo: o Deus que nos libertou da escravidão, conduzindo-nos através do deserto, nos prometeu uma terra.

Quando fizemos a experiência da passagem do "Mar Vermelho", a passagem da escravidão, perdemos o medo de outros problemas. Quando escolhemos um largo caminho, já não podemos voltar. Só fica aberta a possibilidade da vitória.

Quando sabemos que tudo depende de uma promessa feita por Deus, as nossas atitudes mudam, porque temos confiança e esperança. Sabemos que alcançaremos a vitória, porque Deus prometeu e Ele é fiel.

José H Prado Flores
Pregador internacional, Fundador e Diretor Internacional das Escolas de Evangelização Santo André
http://www.escoladeevangelizacao.com.br/


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/vida-de-oracao/vitoria-e-possivel-mesmo-diante-das-batalhas/

15 de março de 2017

Por que fazer jejum?

A prática do jejum nos ajuda a estarmos prontos para a renúncia

Não existe uma forma menos "sofrida" de adquirir a virtude da temperança? São João Cassiano (370-435) explica por que é necessário que o corpo sofra um pouco. A razão é muito simples: não é possível cometer o pecado da gula sem a cooperação do corpo. E isso é evidente, já que os anjos, por exemplo, não podem pecar por gula, no sentido próprio da palavra. Ora, se é com o corpo que acontece o pecado, o combate à doença da gastrimargia só pode acontecer caso o corpo entre na luta. Por isso, deve-se fazer jejum. Esses dois vícios [a gula e a luxúria], por não se consumarem sem a participação da carne, exigem, além dos remédios espirituais, a prática da abstinência.

Por que fazer jejum

Não basta o propósito do espírito

Na verdade, para quebrar os seus grilhões, não basta o propósito do espírito (como acontece em relação à ira, à tristeza e às outras paixões que, sem afligir o corpo, a alma sozinha consegue vencer), mas é imprescindível a mortificação corporal pelos jejuns, as vigílias e os trabalhos que levam à contrição, podendo-se acrescentar também a fuga das ocasiões insidiosas. Sendo tais vícios oriundos da colaboração da alma e do corpo, não poderão ser vencidos sem ambos se empenharem nesse processo. Nós, medíocres que somos, não temos a maturidade necessária para a santidade, por isso não seríamos capazes de nos manter em ordem, naquele equilíbrio que "tempera" a vida, sem o auxílio do jejum. Com o jejum somos capazes de rechaçar as incursões hostis da sensualidade e libertar o espírito para que se eleve a regiões mais altas, onde possa ser saciado com os valores que lhes são próprios. É a imagem cristã do homem quem exige esses voos.

Fazer jejum não é passar fome

Devemos estar prontos para a renúncia e a severidade de um caminho que termina com a instauração da pessoa moral completa, livre e dona de si mesma, porque um dever natural nos impulsiona a ser aquilo que devemos ser por definição. Nunca é demais insistir no fato de que o jejum não nasce de corações ressentidos e que odeiam a vida. A Igreja e seus santos sempre reconheceram a bondade fundamental desta vida e dos alimentos que a sustentam. Um santo não é um faquir, e o ideal ascético cristão nunca foi o de deitar numa cama de pregos ou engolir cacos de vidro. Desde o Novo Testamento, a Igreja sempre condenou o "destempero" dos santarrões e das suas seitas. Jejuar não é simplesmente passar fome. Se assim o fosse, a anorexia das modelos seria virtude heroica e os famélicos da história poderiam ser canonizados. Mas a simples fome não santifica ninguém. Para que dê o seu fruto, o jejum deve ser acompanhado de uma atitude espiritual adequada, pois a doença espiritual que desejamos curar é, seja permitida a redundância, espiritual.


A intenção não é detalhe

O pecado não está no alimento, mas no desejo. São Doroteu de Gaza (século VI) explica isso a partir de uma comparação com o casamento. O ato sexual realizado por um devasso pode ser externamente idêntico ao de um esposo, mas sua natureza é completamente diferente. Nos atos humanos, a intenção não é um mero detalhe.

Assim também é na alimentação. O homem sadio e o homem que sofre de gastrimargia podem comer os mesmos alimentos nas mesmas quantidades, mas somente o doente comete idolatria. Quando, diante dos alimentos, nos esquecemos de Deus e começamos a desejar o nosso próprio bem, mais do que a glória de Deus, geramos uma desordem no nosso próprio ser.

(Trechos extraído do livro "Um olhar que cura – Terapia das doenças espirituais" pag. 64 a 69) de Padre Paulo Ricardo)


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/liturgia/tempo-liturgico/quaresma/por-que-fazer-jejum/

13 de março de 2017

O que da vida não se descreve

Quero descobrir a graça de sorrir diante de tudo o que ainda não sei

Eu me recordo daquele dia. O professor de redação me desafiou a descrever o sabor da laranja. Era dia de prova e o desafio valeria como avaliação final. Eu fiquei paralisado por um bom tempo, sem que nada fosse registrado no papel. Tudo o que eu sabia sobre o gosto da laranja não podia ser traduzido para o universo das palavras. Era um sabor sem saber, como se o aprimorado do gosto não pertencesse ao tortuoso discurso da epistemologia e suas definições tão exatas.

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Foto: warrengoldswain by Getty Images

Diante da página em branco, eu visitava minhas lembranças felizes, quando na mais tenra infância eu via meu pai chegar em sua bicicleta Monark, trazendo na garupa um imenso saco de laranjas. A cena era tão concreta dentro de mim, que eu podia sentir a felicidade em seu odor cítrico e nuanças alaranjadas. A vida feliz, parte miúda de um tempo imenso; alegrias alojadas em gomos caudalosos, abraçados como se fossem grandes amigos, filhos gerados em movimento único de nascer. Tudo era meu; tudo já era sabido, porque já sentido. Mas como transpor esta distância entre o que sei, porque senti, para o que ainda não sei dizer do que já senti? Como falar do sabor da laranja, mas sem com ele ser injusto, tornando-o menor, esmagando-o, reduzindo-o ao bagaço de minha parca literatura?

Não hesitei. Na imensa folha em branco registrei uma única frase. "Sobre o sabor eu não sei dizer. Eu só sei sentir!"

Eu nunca mais pude esquecer aquele dia. A experiência foi reveladora. Eu gosto de laranja, mas até hoje ainda me sinto inapto para descrever o seu gosto. O que dele experimento pertence à ordem das coisas inatingíveis. Metafísica dos sabores? Pode ser…

O que posso falar sobre o que sinto?

O interessante é que a laranja se desdobra em inúmeras realidades. Vez em quando, eu me pego diante da vida sofrendo a mesma angústia daquele dia. O que posso falar sobre o que sinto? Qual é a palavra que pode alcançar, de maneira eficaz, a natureza metafísica dos meus afetos? O que posso responder ao terapeuta, no momento em que me pede para descrever o que estou sentindo? Há palavras que possam alcançar as raízes de nossas angústias?

Não sei. Prefiro permanecer no silêncio da contemplação. É sacral o que sinto, assim como também está revestido de sacralidade o sabor que experimento. Sabores e saberes são rimas preciosas, mas não são realidades que sobrevivem à superfície.


Querer a profundidade das coisas é um jeito sábio de resolver os conflitos. Muitos sofrimentos nascem e são alimentados a partir de perguntas idiotas.

Quero aprender a perguntar menos. Eu espero ansioso por este dia. Quero descobrir a graça de sorrir diante de tudo o que ainda não sei. Quero que a matriz de minhas alegrias seja o que da vida não se descreve.

9 de março de 2017

Autoconhecimento é importante?

Muitos acham que se conhecem, mas até que ponto chega esse autoconhecimento?

Vivemos em um mundo que nos incentiva a sermos independentes de Deus e de todos. Incentiva-nos a uma autorrealização que, para a grande maioria, parece cada vez mais distante, pois se trata de incentivo a uma vida cada vez mais fora de nós mesmos, cada vez mais exteriorizada. O resultado disso é que as pessoas se preocupam cada vez menos com seu interior e cuidam menos dele, gerando sentimentos de frustração e de vazio. Por causa disso, encontramos um número crescente de pessoas que sentem um grande vazio interior e uma grande insatisfação, não conseguindo sequer dar nome ao próprio sentimento. O autoconhecimento é necessário.

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Foto: Daniel Mafra / cancaonova.com

A sabedoria clássica considera o pensamento de Sócrates – "Conhece-te a ti mesmo" – como ponto de partida da filosofia humana. No entanto, esse é um caminho muito difícil de ser percorrido para quem não tem um referencial, um modelo de personalidade a ser atingido. Nós cristãos, que temos Jesus Cristo como modelo, precisamos ter a coragem de nos pôr a caminho e de nos conhecer em profundidade. O autoconhecimento é um caminho que nos leva a olhar para dentro de nós mesmos e a reconhecer nossos dons e talentos recebidos de Deus e também os nossos limites, fraquezas e os pontos que precisam ser melhorados. "Conhecer-se a si mesmo é uma necessidade e um dever do qual ninguém pode subtrair-se. O homem tem necessidade de saber quem é. Não pode viver se não descobre que sentido tem sua vida. Arrisca-se a ser infeliz se não reconhecer sua dignidade" (Amarás o Senhor teu Deus – Amadeo Cencini – pág. 8 – Edições Paulinas).

Conhecer-se a si mesmo é uma necessidade fundamental para se ter um conceito correto e real de si próprio, pois somente quem descobre seu verdadeiro valor consegue uma aceitação serena de si mesmo e de suas limitações, o que lhe proporciona a segurança necessária para viver e realizar mudanças essenciais.

Muitos acham que se conhecem, mas até que ponto chega esse autoconhecimento? Para que você possa averiguar isso, recomendo um teste simples: escreva em uma folha 10 qualidades que você reconhece possuir e 10 pontos fracos que precisam ser melhorados. O que foi mais fácil para você escrever? As qualidades ou os defeitos?

O autoconhecimento nos leva à autoestima e ao amor-próprio, ou seja, a olharmos para nós mesmos reconhecendo-nos como criaturas de Deus, como obras-primas de Deus, sem exaltações nem degradações.

Sem essa visão, o que é gerado é insegurança, perfeccionismo, dificuldade de lidar com os próprios erros e fraquezas e também com os dos outros, entre muitas outras consequências. Santo Agostinho afirmava: "Conhecer-me e conhecer-Te", com isso, ele nos ensina que quanto mais nos conhecemos, tanto mais conhecemos Aquele que nos criou e que é a luz do mundo, de modo que veremos a realidade de forma mais adequada.

Volte à lista que você fez. Nas qualidades descritas, marque as alternativas relacionadas ao fazer, a atitudes externas e observe quantas você colocou de atitudes externas e quantas internas. Assim, você poderá perceber não só o quanto você se conhece, mas também o quanto você está voltado para as coisas exteriores.

A importância do exame de consciência

A Igreja nos dota de uma grande ferramenta de autoconhecimento: o exame de consciência diário. Com ele, é possível avaliarmos bem onde podemos ser atingidos pelo inimigo, os nossos pontos fracos, nossos defeitos, paixões e vícios camuflados. Com isso, podemos voltar confiantes para o Senhor, que nos ama e sempre cuida de nós. Apresentando-nos a Ele como somos, sem medo, sem receios e buscando n'Ele a força diária para vencermos nossas batalhas interiores. São Francisco afirmava: "Eu sou o que sou diante de Deus, e mais nada!". O Senhor nos vê como somos, diante d'Ele não precisamos nos esconder.

Trata-se de uma ferramenta simples, basta dedicarmos poucos e breves minutos do nosso dia ao Senhor, com constância. Dessa forma, vamos, pouco a pouco, conseguindo olhar mais a fundo para o nosso interior e conhecendo não só nossos limites, como nossas riquezas. Precisamos entender que as nossas limitações não estão no nosso exterior, no que fazemos, mas sim, no nosso interior, naquilo que somos. Somos filhos de Deus, filhos amados de Deus! O nosso principal valor está no ser pessoa.


Precisamos saber quem somos, quais nossos dons e talentos; do mesmo modo, precisamos também saber quais são nossos objetivos no uso dessas capacidades. Pois não é somente aquilo que possuímos que decide o nosso valor como pessoa, mas o que somos no mais profundo de nossa identidade como seres humanos, como cristãos, batizados, justificados, filhos de Deus. Essa estima positiva é um valor que ninguém pode tirar de nós.

7 de março de 2017

Como conciliar a nova evangelização e a mídia?

Preparar-se para uma novidade que, a cada dia, é lançada pela mídia, urge uma preparação a partir daquilo que já existe

O homem transformou-se no homem on-line, o homem do presente, da satisfação imediata, das relações descaracterizadas, da mídia, o homem ao qual é continuamente subtraída a necessidade da escolha, porque a grande "rede" é armazém de experiências sempre disponíveis. Assim, o homem pode tornar-se um indivíduo sem memória, disperso na multidão de solidão. Na nossa época, está difundida em muitas pessoas a convicção de que o tempo das certezas passou irremediavelmente: o homem deveria aprender a viver num horizonte de total ausência de sentido, no segmento do provisório e do passageiro.

Diante desse cenário, como é possível para a Igreja ajudar os homens e mulheres que estão nos mass media e os que deles fazem uso, a empreender o caminho de um novo humanismo, de uma renovada centralidade da pessoa humana?

Como conciliar a nova evangelização e a mídia?Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com

Entre muitos caminhos, São João Paulo II indicou três: a formação, a participação e o diálogo.

A formação

Trata-se de sair das situações de ocasionalidade e promover investimentos de recursos humanos que saibam enraizar na reflexão propriamente tecnológico-pastoral os aspectos e as competências especialmente profissionais. Muitas vezes e em muitos documentos, é recordada a urgência da formação de sacerdotes, religiosos e leigos.

A participação

Trata-se de iniciar projetos de cooperação entre as Igrejas locais para promover e coordenar instrumentos de comunicação social que se tornem espaços possíveis de comunicação segundo as perspectivas cristãs. Dessa forma, ter-se-á também a ocasião para opor-se, entre outras coisas, o processo de construção da opinião pública, que hoje é regulada com frequência por interesses e poderes econômicos. É necessário fazer crescer a cultura da corresponsabilidade.

O diálogo

O diálogo que os meios de comunicação podem favorecer precisamente a diversos níveis, os quais são veiculados de conhecimento recíproco, de solidariedade e de paz. Eles constituem um recurso positivo poderoso, se forem postos ao serviço da compreensão entre os povos; ao contrário serão uma arma destruidora se forem usados para alimentar injustiças e conflitos.

Com o fenômeno e o impacto da mídia na vida da pessoa contemporânea, o preparar-se para a novidade que a cada dia é lançada, urge uma preparação a partir daquilo que já existe. A missão de evangelizar, não pode ficar todo o tempo apenas na elaboração de projetos, que quando colocados em prática, já perderam a validade, por conta da velocidade que é o desenvolvimento comunicativo das tecnologias. Aqui o convite não é de correr atrás, mas de caminhar junto, e quem sabe vendo além daquilo que os nossos olhos podem ver.


Como conciliar nova evangelização e mídia? É possível diante da nossa realidade? Com tamanho e rápido desenvolvimento das novas técnicas de comunicação como evangelizar? Creio que o primeiro ponto de partida seja da mudança de linguagem, ou seja, não é uma evangelização pelos meios de comunicação, mas uma evangelização nos meios de comunicação.





padre Anderson Marçal

Anderson Marçal Moreira é padre da Igreja Católica Apostólica Romana. Natural da cidade de São Paulo (SP), padre Anderson é membro da comunidade Canção Nova desde o ano 2000. No dia 16 de dezembro de 2007, foi ordenado sacerdote. Estudou Teologia Pastoral Bíblica-Litúrgica na Universidade Salesiana de Roma.


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/atualidade/tecnologia/nova-evangelizacao-e-midia/