18 de julho de 2016

Qual o verdadeiro significado do escapulário?

Compreenda por que devemos utilizar o escapulário e seu significado para a Igreja

Muitas pessoas utilizam o escapulário por modismo ou simplesmente porque outros o usam, mas qual é o verdadeiro significado dele?

São muitos os que usam o escapulário ou outros objetos de devoção sem saber o verdadeiro significado deles, pior ainda quando o usam como um amuleto, algo mágico que "dá sorte", que livra de "mau-olhado" ou coisa semelhante.

Qual o verdadeiro significado do escapulário
Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com 

Como se o verdadeiro sentido não viesse do coração daquele que usa tal objeto, que, conhecendo o seu verdadeiro significado, usa-o para sinalizar algo que está em seu íntimo, em sua fé, em seus propósitos e conversão. Muitos usam cruzes, medalhinhas, terços e vários escapulários de Nossa Senhora do Carmo como modismo, porque todo mundo está usando ou porque "aquele artista" usou na novela.

Mas qual o verdadeiro significado do escapulário?

O escapulário ou bentinho do Carmo é um sinal externo de devoção mariana, que consiste na consagração a Santíssima Virgem Maria, por meio da inscrição na Ordem Carmelita, na esperança de sua proteção maternal. O escapulário do Carmo é um sacramental. No dizer do Vaticano II, "um sinal sagrado, segundo o modelo dos sacramentos, por intermédio do qual significam efeitos, sobretudo espirituais, que se obtêm pela intercessão da Igreja" (SC 60).

"A devoção do escapulário do Carmo fez descer sobre o mundo copiosa chuva de graças espirituais e temporais" (Pio XII, 6/8/50).


A devoção ao escapulário de Nossa Senhora do Carmo teve início com a visão de São Simão Stock. Segundo a tradição, a Ordem do Carmo atravessava uma fase difícil entre os anos 1230-1250. Recém-chegada à Europa como nômade, expulsa pelos muçulmanos do Monte Carmelo, a Ordem atravessava um período crítico. Os frades carmelitas encontravam forte resistência de outras ordens religiosas para sua inserção. Eram hostilizados e até satirizados por sua maneira de se vestir. O futuro dos carmelitas era dirigido por Simão Stock, homem de fé e grande devoto de Nossa Senhora.


O escapulário era um avental usado pelos monges durante o trabalho para não sujar a túnica. Colocado sobre as escápulas (ombros), o escapulário é uma peça do hábito que ainda hoje todo carmelita usa. Com o tempo, estabeleceu-se um escapulário reduzido para ser dado aos fiéis leigos. Dessa forma, quem o usasse poderia participar da espiritualidade do Carmelo e das grandes graças que a ele estão ligadas; entre outras o privilégio sabatino. Em sua bula, chamada Sabatina, o Papa João XXII afirma que aqueles que usarem o escapulário serão depressa libertados das penas do purgatório no sábado, que se seguir a sua morte. As vantagens do privilégio sabatino foram ainda confirmadas pela Sagrada Congregação das Indulgências, em 14 de julho de 1908.

O escapulário é feito de dois quadradinhos de tecido marrom unidos por cordões, tendo de um lado a imagem de Nossa Senhora do Carmo, e de outro o Coração de Jesus, ou o brasão da Ordem do Carmo. É uma miniatura do hábito carmelita, por isso é uma veste. Quem se reveste do escapulário passa a fazer parte da família carmelita e se consagra a Nossa Senhora. Assim, o escapulário é um sinal visível da nossa aliança com Maria.

Compromissos de quem utiliza o escapulário

É importante destacar algumas atitudes que devem ser assumidas por quem se reveste desse sinal mariano:

• Colocar Deus em primeiro lugar na sua vida e buscar sempre realizar a vontade d'Ele.
• Escutar a Palavra de Deus na Bíblia e praticá-la na vida.
• Buscar a comunhão com Deus por meio da oração, que é um diálogo íntimo que temos com Aquele que nos ama.
• Abrir-se ao sofrimento do próximo, solidarizando-se com ele em suas necessidades, procurando solucioná-las.
• Participar com frequência dos sacramentos da Igreja, da Eucaristia e da confissão, para poder aprofundar o mistério de Cristo em sua vida.

Eu fui revestido com o escapulário, no dia 16 de julho de 1996, quando estava no noviciado da Canção Nova. Nesse dia, consagrei minha afetividade e sexualidade aos cuidados da Virgem Maria, que pode contar sempre com os meus esforços e abertura de coração, para ser digno de receber as graças dessa santa devoção.

Referência: Província Carmelitana


Padre Luizinho

Padre Luizinho, natural de Feira de Santana (BA), é sacerdote na Comunidade Canção Nova. Ordenado em 22 de dezembro de 2000, cujo lema sacerdotal é "Tudo posso naquele que me dá força". Twitter: http://@peluizinho


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/nossa-senhora/devocao-nossa-senhora/qual-o-verdadeiro-significado-do-escapulario/

15 de julho de 2016

O que entendemos por Ortotanásia?

A ortotanásia é sensível ao processo de humanização da morte e alívio das dores

Morte digna, sem abreviações desnecessárias nem sofrimentos adicionais, isto é, "morte em seu tempo certo". Com o prefixo grego orto, que significa "correto", e thanatos, que significa "morte", "ortotanásia" tem o sentido de morte "em seu tempo certo", ou seja, "morte pelo seu processo natural", sem abreviações nem prolongamentos desproporcionais ao processo de morrer. Portanto, a ortotanásia acontece quando o paciente já não dispõe mais de nenhum recurso terapêutico capaz de reverter seu quadro. Já atingiu o estágio de irreversibilidade.

O que é Ortotanasia
Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com

A ortotanásia, diferente da distanásia, é sensível ao processo de humanização da morte e alívio das dores, e não incorre em prolongamentos abusivos com a aplicação de meios desproporcionados que imporiam sofrimentos adicionais. Portanto, implica dispensar o uso de recursos extraordinários quando não há a mínima esperança de cura ou de melhoria da qualidade da vida. A prudência e a ética exigem que médicos e parentes mais próximos (especialmente quando o paciente está inconsciente e não reúne condições para oferecer uma opinião) concordam com o processo.

Aceitação da morte natural

Não dispensando medidas analgésicas e humanistas cabíveis, como a hidratação, nutrição, eventual assistência psicológica e religiosa, isso consiste na aceitação razoável da morte natural, mediante eventual desligamento de aparelhos de manutenção artificial de uma vida nem sempre consciente, como justificou Pio XII ("Discurso do Papa Pio XII sobre a anestesia" de 24/02/1957).

É a situação em que se reconhece a inutilidade do tratamento para manter vivo o paciente. Nesse caso, recorre-se aos cuidados paliativos sem, contudo, utilizar meios para abreviar a vida. É situação intermediária entre a eutanásia (abreviar a vida) e a distanásia (prolongamento indevido do processo de morrer). Por isso, a prática da ortotanásia visa evitar a eutanásia e a distanásia ou, como afirma Leo Pessini, "não devemos abreviar a vida nem a prolongar, mas sim humanizar e cuidar".



A ortotanásia dá assistência médica e afetiva ao paciente terminal, para ele morrer com tranquilidade. Nesse caso, o doente recebe cuidados e medicamentos paliativos, que não vão curá-lo, mas evitam um sofrimento maior até o momento em que a morte venha naturalmente.

Segundo a Resolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina (CFM), é o procedimento pelo qual o paciente em fase terminal ou o seu representante legal decide renunciar ao uso de terapêuticas consideradas invasivas, e o médico limita ou suspende procedimentos e tratamentos dolorosos e prolongados para amenizar os sintomas que acarretam o sofrimento. Portanto, essa prática é apresentada como manifestação da morte boa ou morte desejável.

O Código de Ética Médica ratifica a ortotanásia, e os médicos podem ministrar somente os cuidados paliativos, que auxiliarão o doente a tolerar melhor a dor e suavizar o sofrimento. Com isso, pode-se entender que é dever do médico praticar a ortotanásia quando solicitada pelo paciente terminal.

Princípios ético-cristãos

A bioética, neste caso, está intrinsecamente ligada ao cuidado, aos prolongamentos e às abreviações da vida. Ela prega, na verdade, a ortotanásia, que é a morte no seu tempo certo, reta, digna, sensível ao processo de humanização. Como afirma o Catecismo da Igreja Católica (2279): "Mesmo quando a morte é considerada iminente, os cuidados comumente devidos a uma pessoa doente não podem ser legitimamente interrompidos. O emprego de analgésicos para aliviar os sofrimentos do moribundo, ainda que com o risco de abreviar seus dias, pode ser moralmente conforme a dignidade humana se a morte não é desejada, nem como fim nem como meio, mas somente prevista e tolerada como inevitável. Os cuidados paliativos constituem numa forma privilegiada de caridade desinteressada. Por essa razão, devem ser encorajados".

O Santo Papa João Paulo II, na carta Encíclica Evangelium Vitae n.64, ao escrever sobre a morte, diz: "No outro topo da existência, o homem encontra-se diante do mistério da morte. Hoje, na sequência dos progressos da medicina e num contexto cultural frequentemente fechado à transcendência, a experiência do morrer apresenta-se com algumas características novas. Com efeito, quando prevalece a tendência para apreciar a vida só na medida em que proporciona prazer e bem-estar, o sofrimento aparece como um contratempo insuportável, de que é preciso libertar-se a todo custo. A morte, considerada como "absurda" quando interrompe inesperadamente uma vida ainda aberta para um futuro rico de possíveis experiências interessantes, torna-se, pelo contrário, uma "libertação reivindicada", quando a existência é tida como já privada de sentido, porque mergulhada na dor e inexoravelmente voltada a um sofrimento sempre mais intenso".

Ninguém está imune ou livre do sofrimento e da doença (é condição humana). A experiência da doença revela a fragilidade da existência humana, é uma possibilidade concreta, eticamente falando, de a pessoa descobrir o valor da vida, porque ou lhe dá sentido ou fracassa, não tem meio termo. A etapa final da vida merece ser cuidada assim como as demais fases. Falecer com dignidade traz à discussão a qualidade de vida no processo de morrer.

O paciente deve ter o direito de recusar tratamentos quando sente que sua qualidade de vida está ameaçada, pois se procura a dignidade do princípio ao fim da vida, afirma Leo Pessini e Bertachini. É um interesse em humanizar o processo de morte de um paciente terminal, em aliviar suas dores, em não pretender prolongar abusivamente sua existência pela aplicação de meios desproporcionais.

A determinação de não delongar a vida é complexa

Conforme o teólogo Junges, a determinação de não delongar a vida é complexa, entretanto, o limite para designar está claramente fechado à percepção de morte digna associada à plena consciência das restrições de intervenção. Parece claro que o utópico seria ouvir, sentir e pensar com o indivíduo que sofre a amarga presença do evento inevitável da morte, para dessa relação complexa surgir a solução mais apropriada possível para cada caso.

A Dra. Maria Elisa Villas-Bôas, pediatra e doutora em Direito, afirma que a ortotanásia é o objetivo médico quando já não se pode buscar a cura, e visa prover conforto ao paciente, sem interferir no momento da morte, sem encurtar o tempo natural de vida nem adiá-lo indevida e artificialmente, possibilitando que a morte chegue na hora certa, quando o organismo efetivamente alcançou um grau de deterioração incontornável; e mais do que uma atitude, a ortotanásia é um ideal a ser buscado pela Medicina e pelo Direito, dentro da inegabilidade da condição de mortalidade humana.

A ortotanásia ou a morte como condição, que faz parte do nosso ciclo natural, é aprovada pela Igreja Católica. Por isso, na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis, é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal (Res. n.1.805/2006, CFM). O direito à morte digna, a partir da ortotanásia, é fundamentado na dignidade da pessoa humana.

Na prática, a aplicação da ortotanásia deve levar em consideração alguns princípios, a saber: a autonomia do paciente terminal ou dos seus parentes próximos em decidir querer morrer dignamente; a não-maleficência de não exagerar um tratamento fútil que lhe cause mais dores e sofrimentos; na beneficência da promoção do alívio, do conforto, do cuidado e da dignidade; e na justiça, na qual se para alguns não há mais chance de cura, deve-se buscar promover o acesso ao tratamento para aquele que pode se tornar sadio. É preciso considerar que o médico não é obrigado a intervir no prolongamento da vida do paciente além do seu período natural, salvo se tal lhe for expressamente requerido pelo doente ou seus familiares.

Como afirma o teólogo espanhol Marciano Vidal, "a ortotanásia é uma síntese ética do direito de morrer com dignidade e do respeito pela vida humana".

 


Padre Mário Marcelo Coelho

Mestre em zootecnia pela Universidade Federal de Lavras (MG), padre Mário é também licenciado em Filosofia pela Fundação Educacional de Brusque (SC) e bacharel em Teologia pela PUC-RJ. Mestre em Teologia Prática pelo Centro Universitário Assunção (SP). Doutor em Teologia Moral pela Academia Alfonsiana de Roma/Itália. O sacerdote é autor e assessor na área de Bioética e Teologia Moral; além de professor da Faculdade Dehoniana em Taubaté (SP). Membro da Sociedade Brasileira de Teologia Moral e da Sociedade Brasileira de Bioética.


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/igreja/catequese/o-que-entendemos-por-ortotanasia/

13 de julho de 2016

Na crise da política atual, como escolher um bom candidato?

A política é uma das formas mais elevadas de amor

Os últimos Papas têm insistido muito para que os católicos participem da vida pública, e de modo especial, da política. Vale a pena recordar alguns de seus ensinamentos nesse sentido. O Papa Francisco disse:

"Envolver-se na política é uma obrigação para o cristão. Nós não podemos fazer como Pilatos e lavar as mãos, mas temos de nos meter na política, pelo fato de ela ser uma das formas mais altas de caridade e busca do bem comum. Os leigos cristãos devem trabalhar no meio político.

Na crise da política atual, como escolher um bom candidato
Foto: Rivelino Correia/cancaonova.com

Sei que a realidade da política está muito suja, mas eu pergunto: Por que ela está assim? Por que os cristãos não participaram dela com espírito evangélico? Essas são as perguntas que me faço. É fácil dizer que a culpa é dos outros, mas o que estamos fazendo para mudar essa realidade? Trabalhar para o bem comum é dever do cristão.

A Igreja não deve cair naquela máxima de querer ficar de fora do meio político; pelo contrário, deve colocar-se na "grande política", porque, como dizia Paulo VI, ela é uma das formas mais elevadas de amor.

Vocação à política

Na Exortação Evangelii Gaudium, nº 205, o Papa Francisco disse: "A política, tão denegrida, é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o bem comum".

Papa Bento XVI disse em Roma: "Reitero a necessidade e urgência de formação evangélica e acompanhamento pastoral de uma nova geração de católicos envolvidos na política, que sejam coerentes com a fé professada, que tenham firmeza moral, capacidade de julgar, competência profissional e paixão pelo serviço ao bem comum" (Discurso ao CPL, Vaticano, 15 de novembro de 2008).


O Papa pediu aos bispos que estimulem os fiéis leigos a "vencerem todo espírito de fechamento, distração e indiferença, e a participarem, em primeira pessoa, da vida pública", para construir uma sociedade que respeite plenamente a dignidade humana.

Bento XVI insistiu na importância das "iniciativas de formação inspiradas na doutrina social da Igreja, para que quem esteja chamado às responsabilidades políticas e administrativas não seja vítima da tentação de explorar sua posição por interesses pessoais ou por sede de poder". (Roma, 26 de maio de 2011 zenit.org)

São João Paulo II, na exortação Christifidelis laici já tinha dito: "Para animar cristãmente a ordem temporal, no sentido que se disse de servir a pessoa e a sociedade, os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação na «política», ou seja, da múltipla e variada ação econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum. As acusações de arrivismo (ambição), idolatria de poder, egoísmo e corrupção não justificam minimamente nem o cepticismo nem o absenteísmo dos cristãos pela coisa pública" (n.42).

Doutrina Social da Igreja

Participar da política não quer dizer apenas ser candidato a algum cargo eletivo; é muito mais que isso; é conhecer o que a Igreja nos ensina na "Doutrina Social da Igreja", ensinar isso aos outros e orientar as pessoas em quem votar e votar bem. Antes de tudo, é preciso conhecer cada candidato e saber se tem boa formação humana e cristã, e se tem bons conhecimentos da ordem econômica, social e política, para exercer bem o cargo público a que se candidata.

Nem sempre será possível encontrar um candidato perfeitamente afinado com o Evangelho e a moral católica; a eleição de alguém para um cargo público não é a mesma coisa que a seleção para ser sacerdote ou bispo. Pode até acontecer de alguém que não seja católico ser mais honesto e competente do que alguém que se intitula católico, mas que não tem as mesmas qualidades.

O que importa é votar com a consciência reta e esclarecida

Uma rápida análise mostra que o nosso país vai mal na economia e na assistência ao povo, porque vai mal politicamente. E o voto é o meio de mudar essa situação, ele é sagrado, é a arma da democracia. Mas se ele não for dado com conhecimento de causa, com honestidade, sem se vender, a democracia fica doente e pode se tornar ditadura disfarçada.

Muitas pessoas não sabem votar, não conhecem os candidatos. Muitos pegam um papel de propaganda no chão para votar no dia da eleição. Outros, pior ainda, vendem o voto, isto é, vendem a própria honra. Não se pode trocar o voto por um benefício, por um emprego. Não se pode votar em alguém só porque é um jogador ou cantor famoso; ou mesmo um excêntrico, como forma de protesto. Não se pode votar por sentimentalismo, só porque a pessoa é ligada à família ou é bonito e simpático. Não é de pessoas assim que a política e o país precisam, mas de gente honesta, competente e abnegada, que faz da política um meio de caridade, de busca do bem comum.

O voto só será consciente se o eleitor conhecer o candidato, informar-se, conhecer seus valores e o que pretende. Sobretudo, se é um político ou um "politiqueiro", que visa se enriquecer ou aparecer.

Para dar um voto consciente, não podemos apenas nos basear no que dizem os candidatos no horário de propaganda eleitoral gratuita ou paga. É preciso mais, é preciso ler jornal e revista, assistir a debates e não ficar apenas nos noticiários da televisão.

Quem vota de maneira consciente nunca anula seu voto. É um grande engano e um verdadeiro perigo para a nação, pois facilita a eleição dos maus políticos. É verdade que faltam, às vezes, bons candidatos para a eleição em algumas funções, que façam da política um verdadeiro sacerdócio em favor do povo, mas jogar fora o voto é a pior opção e uma verdadeira traição a si mesmo e à nação. É um pecado, pois o voto é sagrado. Quem anula seu voto anula sua dignidade. Não adianta se enganar, alguém será eleito para cada cargo. Se nenhum candidato lhe agradar, vote no menos ruim.

O voto consciente não pode premiar candidatos que são bancados por ricas e fortes instituições (banqueiros, empresários, igrejas, sindicatos, cooperativas etc.). Esses, se eleitos, não vão trabalhar pelo bem do povo, mas vão fazer "lobbies" em benefício dessas instituições que bancaram suas campanhas. O voto consciente deve ser dado ao candidato que faz uma campanha limpa, que não tem ficha suja nem faz campanhas milionárias. Identifique aqueles candidatos que são apoiados pela comunidade onde você vive e que se interessam por todos.

Enfim, votar bem é algo essencial para a nação melhorar, é um dom que Deus nos dá. É direito e dever de cada cidadão votar bem e ajudar os outros a votarem bem.


Felipe Aquino

Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa "Escola da Fé" e "Pergunte e Responderemos", na Rádio apresenta o programa "No Coração da Igreja". Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br Twitter: @pfelipeaquino


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/atualidade/politica/na-crise-da-politica-atual-como-escolher-um-bom-candidato/

11 de julho de 2016

Piercing e a tatuagem no corpo de um cristão

Será que o uso dessas práticas, mesmo na cultura ocidental pós-moderna, não vem carregado de um sentido espiritual?

"Não fareis incisões na vossa carne por um morto, nem fareis figura alguma no vosso corpo. Eu sou o Senhor" (Lv 19,28).

Vemos, neste texto bíblico, a proibição de Deus ao povo de Israel de fazer incisões na pele. Para não cairmos em fundamentalismos, temos de ir ao contexto e descobrir a essência da mensagem. O que observamos é que o uso dessas incisões trata-se de uma prática idólatra dos povos pagãos que circundavam Israel, e a essência é que não condiz, com o seguimento do Deus Uno, qualquer forma de idolatria; então, o corpo do homem não pode ser um espaço de expressões idólatras.

Piercing e a tatuagem no corpo de um cristão
Foto: Portra by Getty Images/ iStock.by Getty Images

Tatuagem e piercing têm alguma coisa a ver com isso? "A expressão piercing tem sido usada para designar um tipo de adorno inserido por perfuração em certas partes do corpo. Já a tatuagem é a pintura da pele com pigmentos insolúveis e definitivos." 1

Olhando assim, de forma objetiva, parece que a tatuagem e o piercing não têm nada de censurável. Mas precisamos nos aprofundar no significado deles. Penso que a análise da moralidade dessas práticas passa por duas questões:

Significados que carregam

Primeiro: essas práticas geralmente estão relacionadas a comportamentos tantas vezes velados, mas presentes, cheios de vaidade, sensualidade e irreverência. Mesmo que na intenção pessoal isso não esteja claro, tatuagens e piercings, na nossa cultura, carregam esses significados. Nesse sentido, o texto do Levítico não está tão distante dessa realidade, porque vaidade, sensualidade e irreverência são verdadeiros ídolos a quem o homem moderno presta culto e realiza sacrifícios inescrupulosos. Mesmo que pessoalmente seja apenas uma atitude adolescente de inclusão a um grupo, a motivação deste está envolvida com esses valores.

Não nos enganemos, pois tudo o que fazemos com nossas coisas, especialmente com o nosso corpo, comunica nossos valores e transmite mensagens boas ou ruins. Usando isso, ainda que a intenção primeira não seja essa, o usuário contribui para a valorização desses cultos, que tanto têm destruído as virtudes contrárias a esses valores em nossa sociedade: simplicidade, pureza e mansidão.


Alguém pode questionar que outras práticas normais, como o uso de brincos e maquiagens, também podem ter um significado de culto à vaidade, sensualidade e irreverência. Sim, isso é verdade. Mas essa exortação vale também para elas, porque as práticas comuns, sem a virtude da temperança, também podem nos dispor a essas ciladas.

É significativo que, na maioria das culturas, especialmente o piercing tenha um sentido religioso e espiritual. "A ideia hinduísta desse objeto é que ele representa um contato, uma abertura para a atuação de divindades nas mais variadas áreas da vida humana, cada uma representada por uma parte do organismo. É interessante observar que o uso do piercing está tão ligado a essas crenças hinduístas, que os locais de colocação (lábios, umbigo, nariz, sobrancelhas entre outros) correspondem, exatamente, aos pontos correspondentes aos chamados "chakras", ou seja, centros de energia onde se daria a interação entre o corpo e a mente, de onde se poderia estabelecer o controle sobre eles." 2

Será, então, que o uso dessas práticas, mesmo na cultura ocidental pós-moderna, não vem carregado de um sentido espiritual? Será que não expõe, de algum modo, a pessoa a realidades espirituais, uma vez que "vosso adversário, o demônio, anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a quem devorar" (1Pd 5,8)?

Respeito ao corpo

Outra questão a se considerar é o respeito ao corpo, templo do Espírito. Essa é uma forte exortação de São Paulo em 1Cor 6,12-20, e também do Catecismo da Igreja Católica. Este, quando trata do quinto mandamento da Lei de Deus – "Não matarás"–, além do evidente, fala também sobre a necessidade do respeito à saúde (§§ 2288-2291) como um apelo moral do cristão. Nesse sentido, o piercing e a tatuagem também não se harmonizam com esses valores. De maneira geral, os profissionais de saúde contraindicam o uso dessas marcas em nosso corpo, pois elas o expõem a uma série de complicações, desde a transmissão de doenças contagiosas, no momento da aplicação, como da Hepatite B (HBV), da Hepatite C (HCV) e do vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), Sífilis etc., como complicações posteriores: infecções diversas, dermatites, alergias e até há relatos de casos registrados de endocardite infecciosa (uma infecção grave na camada interna do coração). Isso tudo, sem contar que, no caso das tatuagens, a remoção posterior é difícil, podendo expor a pessoa a novas complicações.

Quanto ao piercing, alguém pode perguntar se há alguma diferença entre ele e o brinco usado nos lóbulos das orelhas. Sob o ponto de vista da saúde, há muita diferença. O lóbulo da orelha é a região que apresenta melhores condições, porque tem vascularização adequada (nem muito como a língua e lábios; nem pouco, como nas cartilagens), é arejado, pouco exposto ao suor e às secreções, e é de fácil higienização. Trata-se, assim, de uma região do corpo com improváveis chances de complicações. Outra é a situação dos diversos locais do corpo em que se costuma usar piercing, em que a exposição a riscos é muito maior. Aliás, veja-se como a tradição de culturas civilizadas tem valor. Nela se escondem sabedorias que nem imaginamos. O verdadeiro progresso social e cultural está em um novo que parte da tradição.

Respeita a beleza da pessoa

Ainda ponderando sobre o respeito ao corpo, será que a tatuagem e o piercing respeitam a beleza da pessoa?

Penso que as aberrações que vemos por aí nos dão a pista da resposta: não. Não, porque qualquer coisa que marque o corpo de forma estável ou permanente comunica que ele não é tão bom assim, ele não é tão digno nem tão belo, e precisa ser melhorado (isso seria diferente de uma prótese, que visa justamente restaurar, em um determinado corpo, a integridade perdida e que é própria do ser humano).

A Igreja não tem nenhum pronunciamento claro ou oficial sobre essa questão. Mas ela nos dá os princípios da fé que, com o discernimento dos espíritos (cf I Cor 10,12), podemos, sim, ponderar e fazer um juízo sobre questões como essa. "O corpo, porém, não é para a impureza, mas para o Senhor" (1Cor 6,13b).

Que seus princípios partam sempre da dignidade do seu corpo para Deus, e que seus discernimentos busquem, em tudo, glorificar o Senhor.

Referências:
1. Dra Mannoun, Piercing e tatuagens na adolescência, o que você precisa saber.
2. Marcia Rezende, O que a Bíblia diz sobre o piercing.


André Botelho

André L. Botelho de Andrade é casado e pai de três filhos. Com formação em Teologia e Filosofia Tomista, Andrade é fundador e moderador geral da comunidade católica Pantokrator, à qual se dedica integralmente.
http://www.pantokrator.org.br

Contato: http://facebook.com/andreluisbotelhodeandrade


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/igreja/catequese/piercing-e-a-tatuagem-no-corpo-de-um-cristao/

7 de julho de 2016

Casamento feliz e núpcias de Sara e Tobias

Ensinamentos de Sara e Tobias para um ter um casamento feliz

O livro de Tobias retrata a importância da família e do matrimônio dentro do contexto histórico próprio do Antigo Testamento. Mas é possível uma reflexão desse texto, trazendo-o para a realidade dos dias atuais, tanto para os namorados e noivos quanto para os já casados. Essa história é para todos os que querem aprender sobre um belíssimo ensinamento de como se deve caminhar para um casamento feliz. Pois, mesmo em meio às dificuldades e provações, é incontestável a certeza da alegria e a realização que a comunhão conjugal no matrimônio produz no amor.

O Criador quis, ao criar a criatura, homem e mulher, filhos amados, que estes se unissem, pois "o homem e a mulher são feitos um para o outro: não que Deus os tivesse feito apenas pela metade e incompletos; criou-os para uma comunhão de pessoas, na qual cada um dos dois pode ser ajuda para o outro, por serem, ao mesmo tempo, iguais enquanto pessoas (osso de meus ossos) e complementares enquanto masculino e feminino" (CIC 372).

Casamento feliz e núpcias de Sara e TobiasFoto: Arquivo/cancaonova.com

Essa é a certeza de que a Palavra de Deus, a Igreja e a própria vivência do sacramento do matrimônio oferece: o homem se complementa na mulher e a mulher se complementa no homem, e ambos juntos se plenificam e se realizam em Deus.

Todo amor entre duas pessoas, quando vivido em Deus, sempre conduzirá para o próprio Deus, que ensina como e o que é amar de verdade. Com isso, após muitas provações e situações difíceis na vida de Tobias e Sara, a Divina Providência, agora, irá unir os dois caminhos em um só caminho no sentido de completude. Pois é chegado o belo instante do encontro dos dois.

Encontro de Sara e Tobias

"Raguel mandou chamar Sara, sua filha, e a apresentou a ele. Tomando-a pela mão, entregou-a a ele e disse: 'Recebe-a conforme a lei e a sentença escrita no livro de Moisés, segundo a qual ela te é dada como esposa'" (Tb 7,12).

Um dos grandes momentos do livro de Tobias é seu encontro com Sara. Tudo foi preparado nos mínimos detalhes pela Providência de Deus, que conduziu o jovem diante das muitas dificuldades e dos diversos obstáculos até a descoberta de seu amor.

Junto a Tobias estava o anjo Rafael enviado por Deus, para cuidar dele em sua viagem, que foi solicitada por seu pai para resolver algumas questões familiares. É nesse percurso que Tobias encontrará sua amada, que a Bíblia se refere como a "moça sábia, corajosa e de grande formosura" (Tb 6,12), já que Sara era uma bela mulher segundo o coração de Deus.

Tobias sabia da história dos sete maridos que morreram por terem se casado com Sara. Mas o anjo Rafael orienta-o dizendo: "Não temas. Ela foi destinada para ti desde sempre e tu a salvarás. Ela irá contigo e tenho certeza de que terás filhos com ela" (Tb 6, 18). Com isso, Tobias não temeu, continuou decididamente.


Assim, desejado e pensado por Deus, o encontro tão esperado entre Sara e Tobias acontece, de forma simples e conforme o costume da época. O sentimento de Tobias para com Sara não brotou à primeira vista nem após um tempo de conhecimento, mas ele "enamorou-se dela apaixonadamente" (Tb 6, 19) antes mesmo de a ver. Claro que, no contexto da história, é uma forma de retratar sobre o amor e a vontade de Deus, porque não se trata de um amor fantasioso, ilusório e fora da realidade, mas sim de uma amor que nasce de uma fidelidade a Deus na espera do momento certo.

Portanto, neste encontro de amor, Sara e Tobias compõem uma história, que começa no coração dos dois, cumprindo os desígnios de Deus. Pois onde Deus está, o amor também está, porque "Deus é amor" (1 Jo 4,8).

Casamento e felicidade

Casamento e felicidade estão intrinsecamente relacionados. O matrimônio é fonte de realização para os cônjuges, porque na alegria e na tristeza, é o amor que faz com que a beleza da união permaneça e supere todas as situações difíceis próprias do relacionamento.

Na vida de Tobias, não foi diferente sobre a beleza da união, mas antes, ouve uma caminhada até chegar ao momento de se consumar a promessa de Deus. Tobias chega a Ecbátana, e o anjo Rafael o conduz até a casa de Raguel o pai de Sara. Após entrarem em casa de Raguel, Tobias teve um bom diálogo com Edna, mãe de Sara e seu pai. Depois de todos se conhecerem, "Raguel mandou chamar Sara, sua filha, e a apresentou a ele. Tomando-a pela mão, entregou-a a ele e disse: Recebe-a conforme a lei e a sentença escrita no livro de Moisés, segundo a qual ela te é dada como esposa" (Tb 7,12). Tobias recebe Sara como sua esposa segundo o procedimento próprio da época sobre o casamento.

"Ela te é dada a partir de hoje e para sempre" (Tb 7, 11). Sara e Tobias estão casados e começam uma nova vida juntos. Como a história de muitos casais, hoje, que dão o seu 'sim' para uma união matrimonial, lembremos o que diz a Igreja sobre esse belíssimo compromisso de amor:

"O sacramento do matrimônio significa a união de Cristo com a Igreja. Concede aos esposos a graça de amarem-se com o mesmo amor com que Cristo amou sua Igreja; a graça do sacramento leva à perfeição o amor humano dos esposos, consolida sua unidade indissolúvel e os santifica no caminho da vida eterna" (CIC 1661).

As núpcias

"Os atos com os quais os cônjuges se unem íntima e castamente são honestos e dignos. Quando realizados de maneira verdadeiramente humana, significam e favorecem a mútua doação pela qual os esposos se enriquecem com o coração alegre e agradecido" (CIC 2362).

Diante da situação de Sara, que tinha seus maridos mortos ao se aproximarem dela na primeira noite, com seu esposo Tobias, que confiou em Deus e seguiu as orientações do anjo Rafael, nada o aconteceu. Em sua noite de núpcias, "Tobias levantou-se do leito e disse a Sara: 'Levanta-te, minha irmã! Oremos e supliquemos a nosso Senhor, para que nos conceda misericórdia e salvação'. Ela levantou-se, e começaram a orar e suplicar o Senhor, para que lhes fosse concedida a saúde" (Tb 8,4-5). Deus os atendeu e viveram felizes.

Assim, atualizando a história de Sara e Tobias para a realidade do matrimônio hoje, pode-se dizer do casamento que "os dois se doam definitiva e totalmente um ao outro. Não são mais dois, mas formam doravante uma só carne" (CIC 2364).



Márcio Leandro Fernandes

Natural de Sete Lagoas (MG), é missionário da Comunidade Canção Nova e candidato às Ordens Sacras. Licenciado em Filosofia pela Faculdade Canção Nova, Cachoeira Paulista (SP), Márcio Leandro é também Bacharelando em Teologia pela Faculdade Dehoniana, em Taubaté (SP). Atua no Departamento de Internet da Canção Nova, no Santuário do Pai das Misericórdias e nos Confessionários.


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/relacionamento/casamento/casamento-feliz-e-nupcias-de-sara-e-tobias/

5 de julho de 2016

Como devemos reconhecer Jesus no partir do pão

Eles O reconheceram no partir do pão

O Senhor antecipou sacramentalmente Sua entrega na Última Ceia. Após a Ressurreição, Ele se manifestou a Seus discípulos. Como somos peregrinos na história, queremos pedir ajuda aos discípulos de Emaús, para aprender a reconhecê-lo no partir do Pão. Nosso desejo sincero é que todos os participantes do XVII Congresso Eucarístico Nacional reconheçam sua presença e se tornem missionárias e missionárias, levando consigo a riqueza do que viveremos juntos, ajudados pela reflexão oferecida pelo Padre Giovanni Martoccia SX, cujos pontos principais oferecemos a todos (Cf. Texto-base do XVII Congresso Eucarístico  Nacional, Edição da Arquidiocese de Belém).

Como devemos reconhecer Jesus no partir do pão
Foto: Arquivo CN

O dia estava cinzento como o coração de todos os discípulos, cheios de medo, dúvida e  tristeza. As esperanças messiânicas alimentadas por Jesus dissiparam-se no vento da repressão romana; e, junto com elas, também o sonhos de um Reino de Deus, por tanto tempo acalentado, espatifou-se no iníquo patíbulo que recebeu a condenação do Justo. O testemunho das mulheres de que o corpo de Jesus não estava no túmulo não foi suficiente para convencer os apóstolos de que algo extraordinário havia acontecido. Ninguém do grupo quis acreditar.

Quantas vezes lhes confirmara que iria ressuscitar! Entesourar a memória de Sua Palavra era pré-requisito indispensável para não naufragar no meio da tragédia. Sua Palavra, meditada no coração, é âncora segura da fé, fonte de esperança e força propulsora do anúncio da Boa Nova.

Reconhecer Jesus

Dois discípulos, tendo deixado a cidade de Jerusalém, teatro dos tristes acontecimentos da prisão e execução do Mestre, dirigiram-se a Emaús, aldeia a duas horas de boa caminhada. Parecem querer voltar a seu passado e esquecer tudo o que havia acontecido, enterrando a última lembrança de suas esperanças frustradas. Mas era justamente esse pavio fumegante que os impelia a conversar sobre aqueles mesmos eventos inesquecíveis. O caminho pedregoso e acidentado ritmava os inconstantes e ríspidos pensamentos de seus corações. Os olhos de sua memória parecem fechados, completamente vedados, a ponto de não reconhecer nem mesmo o próprio Jesus que, aproximando-se, pôs-se a caminhar com eles.

Estavam tão concentrados que não deram nenhuma atenção ao desconhecido, que toma a iniciativa e puxa conversa, perguntando sobre o assunto que os preocupava e que parecia tão sério: "Que é que vocês vão discutindo pelo caminho?". Estavam tristes e abatidos pela morte de seu Mestre, decepcionados, porque pensavam que ele fosse o Messias, e agora acham que se enganaram. Finalmente, eles param. Uma parada, nessa caminhada, símbolo da nossa caminhada de vida, é o primeiro passo para compreender como nos afastamos d'Ele, a ponto que nem O reconhecermos mais, e quanta tristeza sua falta trouxe em nossa vida! Ele nos visita, mas, muitas vezes, não percebemos Sua presença, porque ficamos amarrados ao nosso velho modo de pensar, à nossa imaginação que quer determinar o agir de Deus. O mesmo Jesus que eles conheciam tão bem estava diante deles, conversando com eles e, mesmo assim, não O reconheceram.

Como é possível?

Na verdade, Jesus é o mesmo. São os discípulos que mudaram; fechando-se em
sua esperança frustrada, não conseguem mais reconhecê-Lo. Antes, eles olhavam para
Jesus com confiança, acreditavam n'Ele. Agora, estão decepcionados e seu olhar é
diferente. As falsas expectativas lhes vendaram os olhos. No entanto, Jesus cumpriu todas as Suas palavras, mas não como eles imaginavam. É preciso receber algo novo,
nova luz para que os olhos se abram e, finalmente, reconheçam-No.

A Jesus, que pede esclarecimentos sobre esses acontecimentos tão graves, responde Cléopas com outra pergunta que parece expressar espanto e irritação: "Serás tu o único forasteiro em Jerusalém que desconhece o que se passou aí nesses últimos dias?". Jesus se mostra muito interessado e pronto a ouvir tudo o que ocorreu. Cléopas informa o curioso forasteiro dos fatos que tanto marcaram a vida deles. Conta tudo a partir do ministério de Jesus, conhecido como o Nazareno. Mas os dois discípulos não souberam acolher os acontecimentos e interpretá-los. Estão decepcionados!


A decepção dos discípulos é justificada pelo fato que "já faz três dias que todas essas coisas aconteceram!" e Jesus não apareceu. Depois de ter escutado com atenção toda a história que eles tinham para contar, de repente os repreende com severidade. Jesus, com uma pergunta sobre a necessidade do sofrimento do Messias, dá início à catequese pascal. É preciso que a vida de Jesus seja interpretada à luz das Sagradas Escrituras.

Quando chegaram perto do povoado para onde iam, Ele fez de conta que ia mais adiante. "Fica conosco, porque é tarde e o dia já declina". Entrou, então, para ficar com eles.  Realmente, a vida sem Ele fica muito escura, sem luz nem sentido, como peregrino em noite de lua nova. Uma vez à mesa com eles, tomou o pão, pronunciou a bênção, o partiu e distribuiu entre eles. Então, seus olhos se abriram e O reconheceram. É Jesus quem toma a iniciativa, que se aproxima deles e lhes explica tudo. Na fração do pão, fez com que seus olhos se abrissem. Eles agora O reconhecem. Será ainda Jesus que abrirá a mente aos onze apóstolo para entenderem as Escrituras, pois tudo o que estava escrito tinha de se cumprir.

Jesus é reconhecido pela fração do pão

Jesus desaparece no momento em que os dois discípulos O reconhecem. É para nos advertir que não se trata de uma visão extraordinária, mas do normal caminho da fé que nos conduz ao encontro com o Cristo vivo na Eucaristia, na convivência fraterna, na escuta da Palavra, no testemunho generoso e no compromisso evangelizador. Não são as feições físicas que permitem reconhecer Jesus ressuscitado como o mesmo que foi crucificado, mas o gesto distintivo de Sua existência: a fração do pão, gesto que expressa e traz presente Seu dom de amor total e incondicional, Seu serviço, Seu viver para os outros. No testemunho recíproco, a fé manifesta sua dimensão comunitária, revela sua força transformadora, revigora o coração e ilumina os caminhos da Igreja. E disseram um ao outro: "Não ardia o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, quando nos explicava as Escrituras?" Sob esse impulso jubiloso, dois voltaram para Jerusalém.

Voltou a esperança, o entusiasmo, a fé e a força para retomar o caminho, ainda que seja longo e difícil, e a noite adiantada. Mas a escuridão da noite já não assusta mais. A luz  que agora brilha no coração é mais que suficiente para vencer a treva ameaçadora. Ao  chegar a Jerusalém, mais uma surpresa agradável os aguarda. Acharam aí reunidos os onze e seus companheiros, que disseram: "É verdade! O Senhor ressurgiu e apareceu a Simão!" Então, por sua vez, também contaram os acontecimentos do caminho e como Jesus fora por eles reconhecido na fração do pão.

À comunidade que se perguntava sobre como reencontrar o Senhor Jesus, hoje, Lucas narra o episódio dos discípulos de Emaús. O relato visa transmitir à comunidade a alegria do encontro com o Senhor, o Vivente, e incentivá-la a buscar na comunhão e na vivência de Igreja uma experiência pessoal de Sua presença. Todos aqueles que buscam o Senhor, de coração sincero e apaixonado, abrindo-se ao alimento de Sua Palavra e da Ceia eucarística, perceberão Sua voz e presença. Jesus se faz presente, como desconhecido, nos caminhos da vida, nos encontros inesperados, nos acontecimentos cotidianos, que precisam ser compreendidos à luz de Sua Palavra. Trata-se de identificar a ação de Deus em nossa história, adquirindo uma inteligência espiritual dos acontecimentos e fazendo "memória", como Maria, no coração.



Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/biblia/estudo-biblico/como-devemos-reconhecer-jesus-no-partir-do-pao/

29 de junho de 2016

O que a Igreja diz sobre suicídio assistido

Saiba o que a Igreja diz sobre suicídio assistido

Os pedidos para o suicídio medicamente assistido têm, recentemente, chamado a atenção da sociedade para a necessidade de um debate mais aprofundado. Eutanásia e suicídio assistido são temas que merecem reflexão e debate. A questão exige mais atenção quando é trazida para o debate público, para a vida das famílias, quando é apresentada ao vivo em documentários na TV, no cinema e na internet. O que, no entanto, a Igreja diz sobre suicídio assistido?

o-que-a-igreja-diz-sobre-suicidio-assistidoFoto: Wesley Almeida/cancaonova.com

O termo eutanásia é usado quando uma pessoa age diretamente com a intenção de tirar a vida do outro. Por exemplo, quando um médico dá uma injeção letal ou tira um remédio para provocar a morte de alguém. Consiste, portanto, em apoderar-se da morte, provocando-a antes do tempo e, desse modo, pondo fim "docemente" à própria vida ou à vida alheia.

Usa-se o termo "suicídio assistido" ou "suicídio medicamente assistido" é usado quando uma pessoa morre com a ajuda de outra. O suicídio assistido ocorre quando alguém, que não consegue concretizar sozinha seu desejo de morrer, recorre ao auxílio de outra pessoa para ajuda medicamentosa ou encorajamento psíquico. Por exemplo, quando um médico prescreve um veneno ou quando uma pessoa põe no paciente uma máscara ligada a um botijão de monóxido de carbono e lhe dá instruções sobre como ligar o gás para provocar a própria morte. É chamado suicídio medicamente assistido, porque a pessoa dá fim à sua vida com a supervisão médica. A principal diferença das outras formas de morrer é que, no suicídio assistido, a responsabilidade e execução do ato final da indução da morte é da própria pessoa.


O auxílio ao suicídio de alguém pode ser feito por atos (prescrição de doses altas de medicação, indicação de uso ou auxílio na preparação) ou, de forma mais passiva, por meio de persuasão ou encorajamento. Em ambas as formas, a pessoa que contribui para a ocorrência da morte da outra se torna condescendente ou responsável.

Essas solicitações podem envolver também o uso de uma máquina, que, com o auxílio de um médico, instrui o indivíduo no seu uso. Este, dessa forma, é auxiliado a cometer suicídio. Em outras solicitações, o médico tem fornecido medicação ao indivíduo, com as informações sobre a dosagem que poderá ser fatal. O indivíduo, desta forma, recebe os meios para cometer o suicídio.

O que leva uma pessoa a pedir a ajuda de alguém para se matar?

Certamente, são indivíduos seriamente doentes, talvez em estado terminal, quando a dor se torna insuportável. Os pacientes que contemplam a possibilidade de suicídio, frequentemente, expressam perda do sentido para a vida, uma depressão que acompanha a doença terminal.

Debatemos a legitimação ou a moralidade do desejo de morrer. Perguntamos: há diferença de julgamento com atenuantes para o suicídio dependendo do momento vivido pela pessoa? Exemplificando: idosos com doença em estágio avançado e/ou com sofrimento intolerável teriam legitimação para encerrar sua vida? E se esse desejo fosse manifestado por um jovem com sofrimento físico ou psíquico? Como avaliar a intensidade do sofrimento? Desrespeitar o pedido de um idoso para finalização de sua vida não seria uma forma de matar sua individualidade, autonomia e desejo de finalizar a vida de forma digna? Considerando o reverso, oferecer morte sem sofrimento não é respeito à dignidade humana?

A Constituição fala sobre direito à vida. Podemos falar também em direito à morte? Posso afirmar que a pessoa é juiz de sua vida? É seu olhar e não dos outros que define o que é sua dignidade? Será que uma pessoa pode ser obrigada a viver mesmo que as condições de vida sejam as mais sofridas? Uma questão importante para reflexão: é possível julgar o processo de morrer escolhido pela pessoa? A escolha da morte é um ato da pessoa? Sendo a solidariedade e a compaixão atitudes altruístas da pessoa, será que elas valem também quando se trata de ajuda ao suicídio?

O suicídio medicamente assistido é eticamente ilícito e deve ser condenado pela sociedade e, sobretudo, pelos médicos. Quando a assistência do médico é intencional e dirigida deliberadamente para possibilitar que um indivíduo termine com a sua própria vida, o médico atua de forma eticamente inaceitável.

A opinião da Igreja Católica sobre suicídio assistido

O Magistério Católico apresenta um documento intitulado "Só Eu é que dou a vida e dou a morte (Dt 32, 39): o drama da eutanásia" e afirma: "No atual contexto, torna-se cada vez mais forte a tentação da eutanásia, isto é, de apoderar-se da morte, provocando-a antes do tempo e, deste modo, pondo fim docemente à vida própria ou alheia. Na realidade, aquilo que poderia parecer lógico e humano, quando visto em profundidade, apresenta-se absurdo e desumano. […] A decisão do suicídio medicamente assistido torna-se mais grave quando se configura como um homicídio que os outros praticam sobre uma pessoa que não o pediu de modo nenhum nem deu nunca qualquer consentimento para que fosse realizado.

Atinge-se, enfim, o cúmulo do arbítrio e da injustiça, quando alguns, médicos ou legisladores, se arrogam o poder de decidir quem deve viver e quem deve morrer. Aparece assim reproposta a tentação do Éden: tornar-se como Deus 'conhecendo o bem e o mal' (cf. Gn3, 5). Mas Deus é o único que tem o poder de fazer morrer e de fazer viver: 'Só Eu é que dou a vida e dou a morte' (Dt 32, 39; cf. 2Re 5, 7; 1Sm 2, 6). Ele exerce o seu poder sempre e apenas segundo um desígnio de sabedoria e amor. Quando o homem usurpa tal poder, subjugado por uma lógica insensata e egoísta, usa-o inevitavelmente para a injustiça e a morte. Assim, a vida do mais fraco é abandonada às mãos do mais forte; na sociedade, perde-se o sentido da justiça e fica minada pela raiz a confiança mútua, fundamento de qualquer relação autêntica entre as pessoas."

A eutanásia, entendida como "ação ou omissão que, por sua natureza e intenção, causa a morte com a finalidade de evitar qualquer dor", é um pecado conforme o Magistério Católico. Podemos equiparar a eutanásia ao suicídio/homicídio, à decisão de acabar com a vida de um paciente, mesmo com o argumento de que se age por compaixão, para eliminar um sofrimento insuportável. Suicídio, porque a eutanásia supõe o pedido ou o assentimento do doente. Homicídio, porque a morte é executada pelo médico. No caso de o doente não ser consultado ou informado, não se trataria mais de eutanásia, que significa boa morte, mas de cacotanásia, ou seja, morte com dor ou angústia.

O Magistério Católico, numa atitude de valorizar a vida em todas as fases do desenvolvimento ou condições, sempre ensinou que não somos proprietários da nossa vida, e sim Deus, por isso não podemos por fim a ela. Afirma o Catecismo da Igreja Católica no número 2280: "Cada um é responsável por sua vida diante de Deus, que lhe deu e que dela é sempre o único e soberano Senhor. Devemos receber a vida com reconhecimento e preservá-la para honra dele e salvação de nossas almas. Somos os administradores e não os proprietários da vida que Deus nos confiou. Não podemos dispor dela".

O suicídio medicamente assistido contradiz a inclinação natural do ser humano a conservar e perpetuar a própria vida. É gravemente contrário ao projeto de Deus para cada um de nós e ao amor por si mesmo. O suicídio assistido fere também o princípio da justiça que é o direito à própria vida e o direito que os outros têm da minha vida e existência; rompe injustamente a comunhão com as pessoas amadas da família e da sociedade. Para o monsenhor Ignacio Carrasco de Paula, que chefia a Pontifícia Academia para a Vida, órgão do Vaticano responsável por temas de bioética, "o suicídio assistido é um absurdo".


Padre Mário Marcelo Coelho

Mestre em zootecnia pela Universidade Federal de Lavras (MG), padre Mário é também licenciado em Filosofia pela Fundação Educacional de Brusque (SC) e bacharel em Teologia pela PUC-RJ. Mestre em Teologia Prática pelo Centro Universitário Assunção (SP). Doutor em Teologia Moral pela Academia Alfonsiana de Roma/Itália. O sacerdote é autor e assessor na área de Bioética e Teologia Moral; além de professor da Faculdade Dehoniana em Taubaté (SP). Membro da Sociedade Brasileira de Teologia Moral e da Sociedade Brasileira de Bioética.


Fonte: http://formacao.cancaonova.com/igreja/magisterio/o-que-a-igreja-diz-sobre-suicidio-assistido/