20 de fevereiro de 2012

Quero ser livre!

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Ser livre não é "fazer tudo o que eu quero"
A maior aspiração do ser humano é a felicidade. E isso é consequência natural de termos sido criados à "imagem e semelhança  de Deus" (cf. Gen 1,26), para participar de Sua vida bem-aventurada. O Catecismo da Igreja Católica, no primeiro parágrafo, afirma: "Deus, infinitamente Perfeito e Bem-aventurado em si mesmo, em um desígnio de pura bondade, criou livremente o homem para fazê-lo participar da sua vida bem-aventurada" (n.1).

Já que o homem foi feito "por Deus" e "para Deus" ele só conseguirá ser feliz "em Deus". Todos os outros caminhos de felicidade serão frustrantes, e a fome de ser feliz não será saciada plenamente. Santo Agostinho (354-430), um dos maiores pensadores de todos os tempos, depois de buscar a felicidade nos prazeres do mundo, como na retórica, na oratória, no maniqueísmo e em tantas outras estrepolias, somente saciou o seu coração quando encontrou o Evangelho. Logo no início das suas "Confissões", diz: "Nos fizestes para Vós e o nosso coração não descansará enquanto não repousar em Vós".

E adiante, lamenta ter  demorado  tanto para ter descoberto a verdadeira fonte da felicidade: "Ó Jesus Cristo, amável Senhor, por que, em toda a minha vida amei, por que desejei outra coisa senão Vós?"

Sem Deus não há autêntica liberdade e  felicidade. O Criador não quis para nós uma felicidade pequena, esta que se encontra entre as coisas do mundo: o prazer dos sentidos, o delírio das riquezas ou o fascínio do poder e do prestígio. Não. Isso é muito pouco para nós. Deus quis que a  nossa felicidade fosse muito maior; quis que fosse Ele  próprio. E isso é um grande ato de amor do Pai para conosco. O Pai sempre quer "o melhor"  para o filho. Daí se conclui que a fome de felicidade do homem  é infinita e não pode ser saciada sem Deus Pai, que é infinito. É fome de Deus.

Sem acolher Deus de coração aberto, que se revela pela criação, pela Bíblia, e por Jesus Cristo, que é a perfeita revelação do Pai (cf. Hb 1,2), o homem jamais experimentará a autêntica felicidade. E isso não é uma mera conclusão religiosa, é um fato de vida. Experimente hoje dar a um jovem tudo o que ele quiser: dinheiro à vontade, prazer até não poder mais, "curtição" de toda natureza, e você verá que a sua "fome" de felicidade continuará insaciada. Não fosse isso verdade, não teríamos muitos jovens de famílias ricas, mas delinquentes, envolvidos com as drogas, crimes, entre outros.

As estatísticas mostram que a maior quantidade de suicídios acontece com pessoas da classe alta. Por outro lado, vá a um mosteiro e pergunte a um monge, que abdicou de todos os prazeres do corpo e do espírito, para abraçar somente a Deus, se lhe falta algo para ele ser feliz. A resposta será "não"! Nada lhe falta, pois ele tem Tudo. Tem Deus.

A Igreja, de maneira insistente, nos ensina que: "O aspecto mais sublime da dignidade humana está nesta vocação do homem à comunhão com Deus... Pois se o homem existe, é porque Deus o criou por amor e, por amor, não cessa de dar-lhe o ser, e o homem só vive plenamente, segundo a verdade, se reconhecer livremente este amor e se entregar ao seu Criador" (Gaudium et Spes, 19).

Muitos pensam que abraçar a Deus, e viver uma vida em obediência às Suas leis de amor, significa "perder" a liberdade. Ao contrário, Deus é a verdadeira Liberdade e Verdade. É preciso distinguir entre liberdade e libertinagem, entre ser livre e ser libertino. Liberdade sem compromisso com a verdade e com a responsabilidade se torna libertinagem; e esta jamais poderá gerar a felicidade, já que vai desembocar no pecado. E "o salário do pecado é a morte" (cf. Rom 6,23).

Ser livre não é "fazer tudo o que eu quero".  Não. Muitas vezes, isso é loucura.  A verdade é o trilho da verdadeira liberdade. Liberdade sem verdade é loucura. Será liberdade assegurar que dois mais dois são cinco? Será liberdade desrespeitar o catálogo do seu aparelho de TV e, em vez de ligá-lo em uma tomada de 110 volts, como manda, você  teimar em ligá-lo em outra de 220 volts? Será liberdade, por exemplo, usar drogas para sentir-se livre, mesmo destruindo a vida? Será liberdade usar o sexo sem o compromisso do casamento, apenas por prazer, mesmo sabendo que ele poderá gerar uma gravidez despreparada, um aborto, um adultério? Não. Tudo isso não é liberdade; é loucura!

A liberdade que gera a felicidade é alicerçada na verdade e na responsabilidade. Fora disso é loucura, libertinagem, irresponsabilidade... pecado, que  vai gerar a dor, o sofrimento e as lágrimas. Não queira experimentá-la. É muito melhor aprender com o erro dos outros. Abra os olhos e tenha coragem de ver!

"Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (Jo 14,6).

Por mais duras que sejam as exigências do "Sermão da Montanha" (humildade total, mansidão, misericórdia, pureza de coração, castidade, jejum, esmola, oração, etc.), é aí que temos o código da liberdade e da felicidade autênticas. O Catecismo da Igreja Católica, no número 1.718, nos garante que: "As bem-aventuranças respondem ao desejo natural de felicidade".

Foto Felipe Aquino
felipeaquino@cancaonova.com

15 de fevereiro de 2012

Quer fazer bem todas as coisas?

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Aprenda com Jesus a não deixar nada pela metade
"Ele tem feito bem todas as coisas" (Mc 7,37). Com essa frase do Evangelho de São Marcos, podemos ver um traço da personalidade de Jesus. Era um homem maduro em todos os sentidos. A maturidade é sinônimo de eficiência, eficácia e simplicidade. Em suma, maturidade é sinônimo de santidade!

Afetivamente: maduro! Psicologicamente: maduro! Politicamente: maduro! Espiritualmente: maduro! Jesus Cristo era tão maduro que, no derradeiro dia, prestes a entregar-se nas mãos do Pai Celeste, afirmou: "Tudo está consumado!" (Jo 19,30). Que êxito! Os seus 33 anos bem vividos. Não faltava nada! Tudo foi "bem" feito. Não deixou as coisas "pela metade". Não precisou de um dia a mais. Nem mesmo um minuto além do que Lhe foi dado. Tudo consumado! Bem diferente de algumas pessoas que chegam ao final da vida com "tudo consumido". Que incrível diferença faz uma única letra: consumado, consumido. Que alegria seria se muitos dos nossos políticos pudessem ter um fim de mandato semelhante ao de Cristo. Que honra seria saber que muitos padres, pais, médicos, professores, profissionais das mais variadas áreas, encerraram a carreira com tudo "consumado" e não "consumido"!

A maturidade de Cristo se dá não apenas por talento pessoal ou predisposição genética. É verdade que Seus pais: Maria e José, eram justos; isto é, cumpriam fielmente o que lhes era recomendado pela lei religiosa. Mas acima de tudo, Jesus aprendeu isso de Seu Pai Celeste. No início da Bíblia, vemos que Deus criou o mundo e viu que tudo era bom (cf. Gn 1,10). Ou seja, a obra do Todo-poderoso é boa! É bem feita! É perfeita!

Que necessidade temos de aprender essa qualidade de Jesus! Quantas vezes deixamos as coisas por fazer, ou fazemos as coisas de qualquer jeito. Neste mundo escravo do tempo e intoxicado por múltiplas tarefas, descobrimos homens e mulheres apressados, estressados e doentes porque não conseguem cumprir uma agenda, atender todas as solicitações e corresponder a todas as expectativas.

Talvez o grande problema seja nossa extrema capacidade de complicar as coisas que são tão simples. Conseguimos tempo para tudo o que é secundário e deixamos de lado o que é essencial. A escala de valores foi perdendo sua textura natural e acabamos por colocar em primeiro lugar itens que não garantem um final feliz. A vida se torna pesada demais quando colocamos mais peso no telhado e nos esquecemos de fortalecer o alicerce da própria casa. Que o digam os engenheiros encarregados de justificar os desabamentos, causadores de muitas mortes, que vimos nos noticiários nacionais ultimamente.

A estrutura humana ideal é aquela que se assemelha à do Nazareno. Vivia com simplicidade. Valorizava os relacionamentos e dava chance até mesmo àqueles que potencialmente poderiam feri-Lo (Judas). Não se deixou prender pela mágoa, perdoava sempre ("Perdoai-os, eles não sabem o que fazem" – Lc 23,34). Não era preso à própria opinião, sabia submeter-se ("Que se faça a tua vontade, o Pai; e não a minha!" – Lc 22,41).

Era íntegro o bastante para não se afligir com a opinião alheia, acolhia pecadores e excluídos. A todos tinha uma palavra pacífica e orientadora ("Bem-aventurados os mansos!" – Mt 5,5 ). Amadureceu sem se desviar do motivo da própria existência. Aliás, tinha um sentido claro da própria vida ("Eu vim para que todos tenham vida, e vida em abundância!" – Jo 10,10).

Quer fazer bem todas as suas coisas? Imite Jesus!

Padre Delton Filho
http://blog.cancaonova.com/padredelton/

13 de fevereiro de 2012

Estou sofrendo e agora?

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Sua história vai ter final feliz
Quantos de nós tivemos uma infância perfeita? Quantos de nós tivemos uma família perfeita? Quantos de nós tivemos pais perfeitos? E para que ninguém se sinta excluído dessa lista de perguntas a última é: Quantos de nós temos uma história perfeita, na qual tudo sempre deu certo?

Cada vez mais tenho a convicção de que esse tipo de pessoa não existe. Por isso se você teve ou tem problemas na sua história, se você tem traumas e feridas, que parecem eternas, porque não cicatrizam nunca, e se carrega dentro ou fora de si as lágrimas de um passado-presente que teimam em escorrer afogando esperanças e felicidade… então quero dizer que você não está sozinho e, assim como você, muitas pessoas passam por isso agora, e que, felizmente, existe uma forma para fazê-lo feliz mesmo que você tenha tido uma história tão difícil assim.

Se você tivesse a oportunidade de mudar alguma coisa na sua história, o que você mudaria? Com certeza, mudaríamos muitas coisas… Quem sabe aquela pessoa não tivesse morrido? Que eu não tivesse sido rejeitado… violentado… Queria ter recebido mais amor… Enfim, você conhece bem melhor que eu as cenas tristes desse filme. Se observarmos um pouco melhor vamos ver que, mesmo na vida de Jesus, aconteceram coisas que não foram assim muito boas; por exemplo; lembra o que José fez no primeiro instante quando soube que Maria estava grávida? "José, (…) resolveu rejeitá-la secretamente" (Mt 1,19).

E Jesus que estava no ventre de sua mãe também foi rejeitado (mesmo que isso tenha passado logo no coração de José (cf. Mt 1,20). Depois o Senhor sofreu o perigo do "infanticídio" ou mesmo de um "aborto" (pois se Herodes soubesse que Ele iria nascer e onde, certamente o mataria: cf. Mt 2,3). E quanto ao nascimento do Senhor nem preciso comentar… Viveu a pobreza tendo que fugir para o Egito (cf. Mt 2,14) e depois de ter amado "os Seus" sem reservas (cf. Jo 13,1), foi abandonado mais uma vez. Se a sua história não foi fácil saiba que a de Cristo também não o foi.

Jesus viveu em tudo a condição humana (exceto o pecado) (cf. Hb 4, 15), significa que Ele sabe o que é sofrer, significa que Ele sabe o que você sente. E mais: nas cenas mais assustadoras da sua história, se você observar um pouco melhor, vai descobrir que não estava sozinho (a). É verdade que você não é responsável pelo que fizeram com você no seu passado, mas é responsável pelo que vai fazer com isso no seu presente e no seu futuro.

Sabe o que mais? A sua história possui um Autor (com A maiúsculo); o autor é aquele que escreve, por isso determina como as coisas vão acontecer, como um filme, um teatro, uma novela, entre outros. Ainda que durante algum tempo "outros" tenham roubado o lugar do "Autor" e por isso essa história tenha começado de uma forma triste ou sombria, se você deixar o verdadeiro Autor tomar o lugar, que é d'Ele, tenha certeza de uma coisa: essa história não vai terminar como começou, a sua história vai ter final feliz!

O filme triste, que passava na sua cabeça das lembranças e pesadelos, ao qual você assistia com os olhos abertos, precisa, como vilões e os bandidos dos filmes a que assistimos, ser preso e destruído, colocado onde não possa mais lhe fazer mal. Por isso, denuncie para o verdadeiro Autor quem são os vilões da sua história, entregue-Lhe as feridas emocionais que ainda não foram cicatrizadas, entregue-Lhe aquelas situações que estão roubando a cena da sua vida.

Não permita que as coisas ruins, que as pessoas que o machucaram ou mesmo você, tomem o lugar do Autor, porque isso acabaria estragando a história que, mesmo com calvário e cruz, é chamada a ser história de ressurreição, apesar de todo sofrimento que Jesus viveu. Ele ressuscitou, exatamente porque o Pai (Deus-Pai), era e é o grande Autor da sua história; tenha certeza de que o mesmo Autor quer transformar de uma vez por todas sua história de terror em história de final feliz.

Padre Sóstenes Vieira
http://blog.cancaonova.com/padresostenes

10 de fevereiro de 2012

O sacramento do batismo

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Nele o homem une-se a Cristo
O Catecismo da Igreja Católica (CIC) ensina que os sacramentos são um encontro pessoal com Cristo, este encontro é, no fundo, o sacramento original, eles são sinais sensíveis e eficazes da graça, instituídos por Cristo e confiados à Igreja, mediante os quais nos é concedida a vida divina. São sete os sacramentos: batismo, confirmação – crisma, Eucaristia, penitência – confissão, unção dos enfermos, ordem e matrimônio, todos eles estão ordenados para a Eucaristia, como para o seu fim, segundo santo Tomás de Aquino.

A partir do CIC os sacramentos são categorizados eme três formas. 1) Sacramentos da iniciação cristã (batismo, confirmação – crisma e Eucaristia); 2) Sacramentos de cura (penitência – confissão, unção dos enfermos); 3) Sacramentos a serviço da comunhão e da missão (ordem e matrimônio).

Os sacramentos de iniciação cristã lançam os alicerces da vida cristã: os fiéis, renascidos pelo batismo, são fortalecidos pela confirmação e alimentados pela Eucaristia. O primeiro dos sacramentos de iniciação cristã é o batismo, ele é o caminho do reino da morte para a vida, a porta da Igreja e o começo de uma comunhão duradoura com Deus. Nesse sacramento o homem une-se a Cristo, pois ele é uma aliança com Deus, e a condição prévia para receber os outros.

No Antigo Testamento encontram-se várias prefigurações do batismo: a água, fonte de vida e de morte; a arca de Noé, que salva por meio da água; a passagem do Mar Vermelho, que liberta Israel da escravidão do Egito; a travessia do Jordão, que introduz Israel na Terra Prometida, imagem da vida eterna. O próprio Jesus Cristo se fez batizar por João Batista, no Jordão: na cruz, do seu lado trespassado, derramou Sangue e Água, sinais do batismo e da Eucaristia, e depois da Ressurreição confia aos apóstolos esta missão: «Ide e ensinai todos os povos, batizando-os no nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo» (Mt 28, 19-20). A Igreja, desde do o dia de Pentecostes, administra o batismo a quem crê em Jesus Cristo.

Batizar significa imergir na água. O batizado é imerso na morte de Cristo e ressurge com Ele como nova criatura (II Cor 5,17). Por isso este [batismo] também é chamado banho da regeneração e da renovação no Espírito Santo (cf. Tt 3,5) e iluminação, porque o batizado se torna filho da luz (cf. Ef 5, 8). Porque tendo nascido com o pecado original, ele tem necessidade de ser libertado do poder do maligno e de ser transferido para o reino da liberdade dos filhos de Deus.

Entre os efeitos do batismo se destacam o perdão do pecado original e de todos os pecados pessoais e as penas devidas ao pecado, fazendo o homem participar na vida divina trinitária mediante a graça santificante, confere as virtudes teologais – fé, esperança, caridade e os dons do Espírito Santo. Por fim, o batizado pertence para sempre a Cristo.

O rito essencial deste sacramento consiste em imergir na água o candidato ou em derramar a água sobre a sua cabeça, enquanto é invocado o Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, sendo capaz de receber o batismo toda pessoa ainda não batizada. Do batizando é exigida a profissão de fé, expressa pessoalmente no caso do adulto, ou então por parte dos pais e da Igreja no caso da criança. Também o padrinho ou madrinha e toda a comunidade eclesial têm uma parte de responsabilidade nisso. Sendo ele necessário para a salvação daqueles a quem foi anunciado o Evangelho e que têm a possibilidade de pedir este sacramento.

Aqueles que morrerem sem o batismo, o Catecismo da Igreja Católica ensina que, porque Cristo morreu para a salvação de todos, podem ser salvos, mesmo sem o batismo, aqueles que morreram por causa da fé (batismo de sangue), aqueles que estavam sendo preparados para receber tal sacramento – catecúmenos e todos os que, sob o impulso da graça, sem conhecer Cristo e a Igreja, procuram sinceramente a Deus e se esforçam por cumprir a Sua vontade (batismo de desejo). Quanto às crianças, mortas sem batismo, a Igreja na sua liturgia confia-as à misericórdia de Deus.

Portanto, dentre os sacramentos de iniciação cristã, destaca-se o batismo como o primeiro, a porta da Igreja e o começo de uma comunhão duradoura com Deus, lançando o alicerce da vida cristã, configurando o cristão a Cristo, sendo assim, no batismo, o homem para sempre pertence a Cristo.

8 de fevereiro de 2012

Página de um diário

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A vida se organiza no confronto com Deus
O tempo corre implacável, oferecendo-nos, em nome de Deus, incontáveis oportunidades. Mas as pessoas andam apressadas e desejam um dia de quarenta e oito horas, para depois pretenderem mais. A velocidade dos meios de comunicação projeta adultos e jovens para metas sempre mais audaciosas. Alguém um dia disse que "o céu é o limite", expressão que até foi nome de programa de televisão. É natural que, a certo ponto da caminhada, alguém se pergunte a respeito dos rumos e do sentido da própria existência, como também a respeito dos critérios com os quais organiza o uso do precioso tempo. Sabemos que para Deus um dia é como mil anos e mil anos como um dia (Sl 89,4), mas nós estamos no tempo, dependemos de programa, calendários, agenda.

Até as crianças das etapas iniciais de vida escolar devem ter suas agendas, nas quais se enviam os recados aos pais ou as próprias crianças enfeitam com seus desenhos, números telefônicos e atividades programadas. Deparei-me com o Evangelho de São Marcos 1, 29-39 e pareceu-me ser possível reconstituir a organização da "agenda" de Jesus, para "aprender Jesus" e ajudar muita gente a se programar com critérios semelhantes. Nós o vemos na Casa de Oração dos Judeus, chamada Sinagoga, depois em visita à Casa de Simão e André. Ao cair da tarde, está cercado das multidões que desejam sua palavra e seus milagres. Na madrugada do dia seguinte, ei-lo em oração, num colóquio de amor com o Pai, recolhido em lugar deserto, antes de partir para novas etapas de missão.

A vida se organiza no confronto com Deus, tempo dedicado à oração cristã, que é a oração de Jesus. Oração pessoal e comunitária. Silêncio para estar com Deus e participação na vida da Igreja, sobretudo na missa dominical. Tomar um tempo a cada dia, bem escolhido, quando e como a pessoa se sentir bem, a Bíblia nas mãos, leitura, meditação, oração, contemplação e propósito de vida nova. Depois, como um bonito ramalhete composto com amor, levar tudo ao altar de Deus na Santa Missa. Nossa vida, no dizer do grande Dom Helder Câmara, fragmentada nos múltiplos afazeres, é posta à disposição de Deus. Dos muitos "caquinhos" ele compõe um magnífico mosaico, uma história de salvação.
Jesus vai à Sinagoga, onde todos ficaram admirados com seu ensinamento. Era um ensinamento novo, e com autoridade. E sua fama se espalhou rapidamente por toda a região da Galileia. (cf. Mc 1,21-28).

A Sinagoga era lugar privilegiado para a leitura e o aprendizado da lei, da Palavra de Deus. Até hoje e assim será sempre para os cristãos. Para discernir o que fazer, como fazer e como organizar a vida, faz-se necessário perguntar o que Deus pensa. Não é necessário aguardar revelações extraordinárias. "Já firmada a fé em Cristo e promulgada a lei evangélica nesta era de graça, não há mais razão para perguntar a Deus, desejando visões e revelações divinas, nem para que ele responda como antigamente. Ao dar-nos, como efetivamente nos deu, o seu Filho, que é a sua única palavra, e não há outra, disse-nos tudo de uma vez nessa palavra e nada mais tem a dizer" (cf. São João da Cruz, "Subida do Monte Carmelo", Livro 2, capítulo 22). Na Palavra está a fonte da vida e a iluminação para as decisões.

Jesus vai à casa de Simão e André. Vêm à tona suas prioridades, que depois se estendem com a atenção aos enfermos e necessitados. Ele está "na casa", estabelece relações pessoais e afetivas, cuida das pessoas, cultiva-as de tal modo que as contagia. De fato, a sogra de Simão, curada da febre, se põe a servir a todos (cf. Mc 1,31). Ele dedica tempo aos que sofrem mais, doentes, pobres e todos os necessitados. Tal indicação não seja desprezada. Vale a pena perguntar sobre o espaço dedicado em nossas vidas para o serviço gratuito e livre aos mais pobres. E os que sabem ser mais pobres não são dispensados de tal serviço. Antes, devem primar pelo amor uns aos outros, capaz de edificar as outras pessoas.

Muitos de nós já experimentamos ser procurados e visados pelas pessoas, o que aconteceu em primeiro lugar com o Senhor de nossa fé. Observadores mais curiosos do que piedosos notavam o comportamento de Jesus, até vigiando para ver se respeitava o sábado, jejuava ou lavava as mãos antes das refeições ou anotando seu comportamento religioso das prescrições da lei mosaica a serem cumpridas (Cf. Mc 2,16-28; Mc 3, 1-6; Mc 3, 20-21; Mc 7,1-23). É com imensa liberdade e com zelo missionário que Jesus quer pregar a todos e testemunhar o Reino pelo qual é apaixonado. Por isso seu programa contempla ir a outros lugares das redondezas, pois para isso ele veio, age com simplicidade, sem formalismo, com a imensa confiança no amor do Pai, com a qual quer contagiar a todos. Os que nele crêem se sabem sempre entregues às mãos da Providência santíssima, sem traumas ou receios que lhes tirem a liberdade. E assim convivem respeitosamente com todos, inclusive com os que têm convicções diferentes.

A nós cristãos chegue o apelo a olhar para a Cruz de Cristo, ponto mais alto e sinal de seu amor eterno. Nela ele se entregou "como remédio contra todos os males que nos sobrevêm por causa dos pecados, mas não é menor a utilidade quanto ao exemplo. Na verdade, a paixão de Cristo é suficiente para orientar nossa vida inteira. Quem quiser viver na perfeição, nada mais tem a fazer do que desprezar aquilo que Cristo desprezou na Cruz e desejar o que ele desejou. Na cruz, não falta nenhum exemplo de virtude" (Santo Tomás de Aquino, Colatio 6 super Credo in Deum). Assim, nossa vida será "organizada" e nossa agenda perfeita!

Que o Pai do Céu conceda a todos os homens e mulheres de fé o dom de priorizar em suas vidas o que efetivamente tem valor. Por isso a Igreja pede em sua oração que ele vele sobre a sua família com incansável amor, pois confiados apenas em sua graça, esperamos ser guardados sob a sua proteção.

Foto Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém - PA

6 de fevereiro de 2012

Prosperidade segundo o Senhor

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A Palavra de Deus é fonte de prosperidade espiritual
Uma visão antiga, que vem sendo muito retomada nos últimos tempos, é a ideia de que Deus recompensa os bons e castiga os maus nesta vida. O que está claro é que a vida humana vive de altos e baixos, de alegrias e sofrimentos, o que constitui um mistério. Pensando bem, não há explicação para o sofrimento. Jó nos mostra que Deus está presente onde o ser humano sofre. Nos Evangelhos entendemos que Jesus cura quem sofre, mostra que Deus conhece o sofrimento do humano por dentro e o assume até o fim.

Falar de prosperidade é ater-se a uma vida sem sofrimento, de mirar para o alvo que só ocasiona gozo e alegria. Esta pode ser uma visão cristã da vida, isto é, prosperidade significando intimidade com Deus, realizando o maior de todos os mandamentos: o amor. É contra os princípios do Evangelho ancorar-se na artimanha da prosperidade, para ferir a liberdade das pessoas, extorquindo delas bens materiais. Pior ainda quando isso é feito em nome de Deus. Isso passa a causar a queda de quem é "fraco na fé".

O anúncio da Palavra de Deus pode estar cheio de ambiguidades, carregado de atitudes escusas. Ela pode ser instrumentalizada para atender aquilo que não favorece o bem comum. Dessa forma deixa de ser uma Palavra de gratuidade e de transformação. A Palavra de Deus é fonte de prosperidade espiritual. Ela aciona os corações e as mentes para a liberdade e abertura ao verdadeiro bem. Não pode ser "privatizada" para bens materiais e enriquecimento ilícito, explorando a sensibilidade das pessoas.

Não podemos ver nas doenças e sofrimentos um castigo. Aí acontece a manifestação do mistério divino. Sabemos que muitos sofrimentos são provocados por imprudências, vícios e atitudes irresponsáveis. Normalmente, o egoísmo aumenta o sofrimento. É violência enganar as pessoas com falsas promessas de prosperidade, que até causam nos sofredores um sentimento de culpa. Muitos se perguntam: que fiz de errado? Por que mereci isso? O importante é dar sinais do amor de Deus, que é nosso Pai.

Dom Paulo Mendes Peixoto

2 de fevereiro de 2012

O que fazer com as opiniões a nosso respeito

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Por que nos incomodamos com os que nos detestam?
Todos nós gostaríamos de exclamar: "Não tenho inimigos! Dou-me muito bem com todos!". A realidade nos mostra que, via de regra, todos temos uma pedra no sapato. Há sempre alguém que nos espicaça e nos tira o bom humor. Na maior parte das vezes é por motivos fúteis. Alguém é frontalmente contra nós por causa do nosso jeito, porque a nossa fisionomia lembra a de um conhecido adversário, porque deixamos de atender um pedido que envolvia corrupção, porque não somos do partido tal...


Posso dizer, pessoalmente, que despertei vários inimigos irreconciliáveis por ter tomado posição em favor daquilo que é ensinamento de Cristo. Outras vezes, não foi possível atender uma solicitação, inteiramente de interesse pessoal, por contrariar o bem comum. Eu tenho muitíssimos amigos. Sinto uma onda de simpatia pela minha pessoa, mas não posso dizer que não tenho inimigos. Existem alguns poucos que me odeiam. Às vezes, nem eles sabem direito o porquê. Chego a gemer na dor: "Salva-me, Senhor, dos meus inimigos" (Sl 143,9).

Fico conjeturando: "Por que passamos por essa provação de encontrar alguém que nos detesta?". O primeiro motivo pode ser nós mesmos, quando prejudicamos alguém irremediavelmente. Neste caso, estejamos abertos para um reatamento da amizade. Todos temos um dia em que cometemos algum erro. Entre os que tomam a iniciativa de nos odiar (sim, isso existe), quem são os nossos inimigos? Não são diretamente os ateus, os espíritas, os evangélicos; são aqueles que deveriam ter um vínculo conosco. "Os inimigos do homem são os da sua casa" (Mt 10,36).

A definição das nossas ideologias costuma ser outro fator de desunião. Os  amigos vão até ficar estupefatos com minha afirmação, mas um divisor de águas é uma velha ideologia do século XIX. Trata-se do socialismo. A partir dele o homem de Igreja é classificado de "avançado", "libertador", "retrógrado", "tridentino", "moderno", "atualizado", "amante dos ricos" ou "inteligente".

O critério não é o Evangelho. Em muitos casos, somos obrigados a conviver com tais pessoas sem esperança de reconciliação e rezar por elas. Mas a pergunta, diante de muitos casos inexplicáveis, sempre permanece: "Saulo, Saulo, por que me persegues?" (At 22,7).

Dom Aloísio Roque Oppermann scj
Arcebispo de Uberaba - MG