5 de julho de 2011

Os sonhos e os desejos

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Para construir um sonho é preciso renunciar a muitos desejos
Existe uma enorme diferença entre sonho e desejo. Para realizar um sonho é preciso empreendimento, suor e, às vezes, lágrimas. Sonho é um projeto de vida, algo que nosso coração motiva interiormente a partir de perspectivas que intuimos ou vislumbramos e que ressoa dentro de nós como identidade. Encaixa-se com nossas habilidades e eleva-nos como pessoas. É um ideal que dará sentido à vida.


São exemplos do que vêm a ser um sonho: Buscar casar-se, adquirir uma casa própria, um carro, cursar uma faculdade, abrir um negócio, realizar-se numa profissão ou vocação.

Todo ser humano necessita ter um sonho, pois, neste há uma meta, uma direção para onde seguir. Caso contrário, a existência não encontra motivações para superar e aprender com os desafios.

Já o desejo vem a ser a reação imediata diante da possibilidade de sanar nossas vontades mais básicas. É o impulso do instinto.
Desejo é o que sentimos quando estamos com fome, sede ou quando sofremos tentação, desejos da carne, desejo sensual, ira, vingança, gula.

O desejo desperta no gênero humano a manutenção da sobrevivência, mas quando não bem administrado causa desajustes em todo o ser. Porém, nem mesmo quando vivido no equilibrio, ele é capaz de proporcionar um sentido maior para a consciência existencial da pessoa.

O grande perigo é não atentarmos às nossas metas de vida, a nossos sonhos, e nos perdermos nas vontades que sentimos na caminhada. Quem não sabe aonde quer chegar, fica atrelado a qualquer distração no percurso. Saul perdeu-se no encargo e vocação de rei, porque ficou com inveja de Davi (cf. I Sm 18, 6 ss). E Davi, que era rei e guerreiro, encheu-se de desejos sensuais por Betsabéia, a partir de um momento de ócio em que não estava com suas tropas na batalha (cf. II Sm 11, 1). Judas Iscariodes, apóstolo de Jesus, conviveu com Aquele que é a Sabedoria eterna, tinha como vocação ser coluna da Igreja, mas, jogou tudo fora por causa de trinta moedas (cf. Mt 26, 15).

Você já se imaginou rendendo-se a prazeres momentâneos que podem prejudicar ou mesmo aniquilar suas chances de alcançar os seus sonhos com a prática de atitudes ilegais, imorais, vícios, ações pecaminosas?

Talvez, na hora em que bata o desejo, e estamos próximos da oportunidade de satisfazê-lo, não consideramos que o pior possa acontecer. (Que venhamos a ser descobertos em práticas ilícitas e imorais e de pecados, ou que o objeto de prazer venha desencadear um mal tão grande).

Devemos sempre ponderar: "A aventura valerá realmente? Não estamos nos acostuamando com o perigo, com o pecado ou com algo que pode, em uma única vez, pôr tudo a perder?"

Sigamos ao Mestre Jesus, que mesmo estando quarenta dias sem comer e sentindo fome e sede, não transformou a pedra em pão, em vista daquilo que era Seu intuito maior: Seu plano de Amor por nós (cf. Mt 4). O poder e as oportunidades que temos devem ser usados sempre para a nossa construção como seres humanos melhores.

Para construir um sonho é preciso renunciar a muitos desejos.

Deus o abençoe!

Sandro Ap. Arquejada-Missionário Canção Nova
blog.cancaonova.com/sandro

29 de junho de 2011

O espírito da aliança matrimonial

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Amar é viver centrado no 'tu' e não no 'eu'
Doar-se: A aliança matrimonial é uma entrega, uma doação. Não é pedir em primeiro lugar, senão dar-se. E este é o primeiro sentido da aliança matrimonial: eu me doo como marido, como esposa e recebo como resposta a doação de meu cônjuge. Em relação com a Virgem Maria é uma entrega filial; na vida matrimonial é uma entrega esponsalícia. Essa entrega esponsalícia é uma superação radical do egoísmo.


Amar é viver centrado no TU e não no EU. Se um diz: "Eu te quero", pode significar duas coisas distintas. Se há verdadeiro amor significa: "Eu te quero para fazer-te feliz", do contrário significa: "Eu te quero para que me faças feliz".

Amar com autenticidade não é renunciar à própria felicidade, mas descobrir que minha felicidade maior é viver para fazer feliz ao outro. É a felicidade de Deus: Deus é feliz porque está sempre se doando às outras pessoas da Santíssima Trindade e a nós.
E o homem está chamado a encontrar uma felicidade semelhante à de Deus, que é a felicidade de se doar e se regalar aos demais.

Amar é estar sempre para o tu, só para o tu. Pertencer-se (consagrar-se).

A aliança matrimonial nos pede uma entrega total, não uma entrega parcial. É uma entrega de todo seu ser e para sempre.
E este espírito deve animar-nos matrimonialmente: uma entrega total e permanente. Isso cria em nós uma consciência de pertencer e de consagração. Nossa vida está consagrada a alguém e desde esse momento já não pode haver solidão. Essa consciência de consagração, de que eu não me pertenço, mas que pertenço à outra pessoa, isso é o que nos pede nossa aliança matrimonial: pertenço ao cônjuge, agora e para sempre.

Não somente queremos caminhar juntos, compartilhar toda a vida, fazer-nos responsáveis um pelo outro, mas existe também um direito mútuo. O outro tem direito a meu amor, meu apoio, meu tempo, tem direito a que eu lute para alcançar sua realização pessoal, sua felicidade, sua santidade.

Essa consciência de consagração, que nos dá a aliança matrimonial, deveria ser tão forte como a que tem um sacerdote ou uma religiosa que se consagraram a Deus. E assim como o sacerdote ou a pessoa consagrada usa um distintivo externo - um hábito, uma cruz - que lembra esse caráter de pertencer a alguém, da mesma forma também os esposos têm esse distintivo.

Este é o sentido de nosso anel de casamento, nosso anel matrimonial, nossa "aliança". Não é um adorno, senão o símbolo de uma consagração, de pertencer. A pessoa que usa a aliança dá a conhecer seu caráter de comprometido, de aliado, não só diante do cônjuge, mas também diante dos demais. Que importantes são os símbolos e que grande significado tem este anel: recorda-nos o amor, a presença, a fidelidade do cônjuge em cada circunstância.

E o que se renova volta a reviver. Daí a importância de renovar com frequência nossa aliança de amor matrimonial. Há matrimônios que fazem isso todos os meses.

Padre Nicolás Schwizer
Shoenstatt mov.apostólico

27 de junho de 2011

Por que se expõe Jesus na Eucaristia?

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O mal de nossa época é não dirigirem a alma a Jesus
Esta semana nos convida a viver com mais intensidade o Mistério da Eucaristia, que é fonte e cume de nossa vida, de nossa espiritualidade. Esta pedagogia da liturgia da Igreja nos ensina a abraçar o mistério de nossa fé, depois de vivermos, há tempos atrás, o Mistério de Jesus na Sua Paixão, Morte e Ressurreição, celebramos, na semana retrasada, a Festa de Pentecostes, o Espírito Santo, nosso Divino Amigo. No domingo passado, celebramos a Santíssima Trindade e na próxima quinta-feira, 23 de junho, o Mistério de Cristo presente na Eucaristia.


Nós católicos somos até acusados de idolatria por irmãos que não compreendem a nossa fé. Por que se expõe Jesus na Hóstia Santa? Em primeiro lugar cremos fielmente em Suas Palavras quando disse: "Tomai, comei, isto é o meu corpo". Em seguida, pegou um cálice, deu graças e passou-o a eles, dizendo: "Bebei dele todos, pois este é o meu sangue da nova aliança, que é derramado em favor de muitos, para remissão dos pecados" (Mt 26,26-30). A partir daí essa é a vida da Igreja de Jesus Cristo até os dias de hoje, veja o que diz São Paulo: "De fato, eu recebi do Senhor o que também vos transmiti: Na noite em que ia ser entregue o Senhor Jesus tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e disse: "Isto é o meu corpo entregue por vós. Fazei isto em minha memória". Do mesmo modo, depois da ceia, tomou também o cálice e disse: "Este cálice é a nova aliança no meu sangue. Todas as vezes que dele beberdes, fazei-o em minha memória" (cf. 1Cor 11, 23-25). O relato da instituição da Eucaristia está também nos Evangelhos de Lucas 22,15-20; Marcos 14,22-24; João 13,1-17.

A adoração é o primeiro ato da virtude da religião. Adorar a Deus é reconhecê-Lo como Deus, como o Criador e o Salvador, o Senhor e o Dono de tudo o que existe, o Amor infinito e misericordioso. "Adorarás o Senhor, teu Deus, e só a Ele prestarás culto" (Lc 4,8), diz Jesus, citando o Deuteronômio 6,13 (Catecismo da Igreja Católica [CIC], n. 2096).

A adoração é a primeira atitude do homem que se reconhece criatura diante de seu Criador. Exalta a grandeza do Senhor que nos fez e a onipotência do Salvador que nos liberta do mal. É prosternação do Espírito diante do "Rei da glória" e o silêncio respeitoso diante do Deus "sempre maior". A adoração do Deus três vezes santo e sumamente amável nos enche de humildade e dá garantia a nossas súplicas (CIC, n. 2628).

Uma vez que Cristo em Pessoa está presente no Sacramento do Altar; devemos honrá-Lo com culto de adoração. «A visita ao Santíssimo Sacramento é uma prova de gratidão, um sinal de amor e um dever de adoração para com Cristo nosso Senhor» (CIC, n. 1418). Eis porque adoramos Jesus na Santíssima Eucaristia.  É vital se fazer próximo d'Aquele que por muito tempo ficou escondido, busquemo-Lo enquanto Ele se deixa encontrar. Qual é a sua fé? Veja o que diz também um grande santo adorador:

"O culto da Exposição ousamos afirmar, é a necessidade de nossa época; impõe-se esse testemunho público e solene da fé dos povos na divindade de Jesus Cristo e na veracidade de sua presença sacramental. É a melhor refutação que se pode fazer aos renegados, aos apóstatas, aos ímpios e aos indiferentes, refutação que caíra sobre eles qual montanha de fogo do amor e da bondade.

O culto da Exposição é necessário para salvar a sociedade, que morre por não ter mais um centro de verdade nem de caridade, nem vida de família. Cada membro se isola, se concentra, procura-se bastar a si mesmo; a dissolução é eminente.

A sociedade renascerá, entretanto, cheia de vigor, quando todos os seus membros vierem se reunir em torno de nosso Emanuel (cf. Mt 1,23). As ideias se reformarão, mui naturalmente, à luz da mesma verdadeira e sólida renovar-se-ão sob a influência de um mesmo amor. É mister refluir à fonte da vida, a Jesus na Eucaristia, faze-Lo sair de sua reclusão, a fim de que se coloque novamente à frente das sociedades cristãs, para dirigi-las e salvá-las; é mister reconstruir-Lhe um palácio, um trono real, uma coorte de servos fiéis, uma família de amigos, uma multidão de adoradores.

O culto da Exposição é necessário para despertar a fé adormecida em tantos homens de caráter que não conhecem mais Jesus Cristo, porque se esqueceram de que Ele mora em vizinhança, de que é seu amigo e seu Deus. Este culto é necessário para estimular a verdadeira piedade, retida desde muito na porta do santuário onde Jesus está sempre disposto a nos abençoar e nos abrir seu Coração.

O grande mal de nossa época é não dirigirem a alma a Jesus Cristo como a seu Deus e Salvador. Despreza-se o único fundamento, a lei única, a graça única de salvação. O mal da piedade estéril é que ela não parte de Jesus Cristo e não converge para Ele. A alma se detém no caminho, distrai-se com uma flor… O amor divino não tem sua vida, seu centro, no Sacramento da Eucaristia, e, portanto, não está em suas verdadeiras condições de expansão.

Somente em Jesus Cristo presente entre nós pode haver salvação. O mal é tão grande que somente Ele é capaz de nos salvar. É a batalha decisiva. Um santo, um anjo, um taumaturgo, um gênio, um grande orador, tudo isso é ineficaz. É necessário Jesus Cristo em pessoa: eis o Santíssimo Sacramento, seu combate e seu triunfo.


Adoro-te com devoção, ó Deus que te escondes,
Que sob estas figuras de verdade te ocultas:
A ti meu coração se submete inteiramente
Porque, ao contemplar-te, desfalece por completo.
Visão, tato e paladar em ti falham,
Apenas ouvindo se crê com segurança:
Creio em tudo o que disse o Filho de Deus:
Nada mais verdadeiro que esta palavra da Verdade.

Graças e louvores se deem a todo o momento ao Santíssimo e Divinissimo Sacramento!" (São Pedro Julião Eymard)


Padre Luizinho, Com. Canção Nova.
http://twitter.com/padreluizinho

24 de junho de 2011

Por que Deus é um ser escondido?

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Podemos em toda a parte ver os "rastos" do Eterno
Como a vida seria diferente se Deus fosse uma divindade "a ser tocada com as mãos". Seria a evidência. Não precisaríamos de provas sobre a Sua existência. Neste sonho bastaria fazer-lhe um pedido para sermos atendidos mais do que de repente. Temos um inimigo? O Poderoso logo o afastaria. Temos dívidas? O socorro mágico aconteceria antes do pôr-do-sol. Somos acometidos por uma doença? Feito o pedido de cura, num piscar de olhos o mal estaria superado.

Mas Deus é um Ser que confia na inteligência humana. O homem pode chegar a Deus a duras penas, às apalpadelas. "Como cegos vamos tateando como quem não enxerga" (Is 59, 10). Isso nos dá ocasião para expressarmos fé, que é um ato meritório, por depender de nossa livre vontade. O delírio fantasioso, acima descrito, seria um puro "encantamento". Seríamos obrigados a crer. Assim como a Providência dispôs, baseamo-nos numa intuição muito forte de que este Ser Poderoso tem que existir, e Lhe devemos profundo respeito. E com amor nos consideramos profundamente ligados a Ele.

Quem é que nunca chega a Deus? Os que não são capazes de dobrar os joelhos, vale dizer, quem é um soberbo de coração. Também não alcançam essa fé salvadora, os perversos que praticam o mal. "Os pecadores não ficarão de pé na assembléia dos justos" (Sl 1, 5). Também os devassos, os que vivem atolados nos prazeres sexuais desenfreados, não chegarão lá. "Felizes os puros de coração porque verão a Deus" (Mt 5, 8). O mesmo se diga sobre aqueles que se apegam por demais aos bens materiais. "Não podeis servir a Deus e ao dinheiro" (Lc 16, 13).

Além do mais, um grande auxílio para o encontro, na fé, com o Deus verdadeiro, é a inteligência. Podemos em toda a parte ver os "rastos" do Eterno, mesmo sem jamais vê-Lo neste mundo. Isso aconteceu com o coordenador do projeto Genoma Humano. O cientista Francis Collins entrou ateu no projeto e saiu como um homem de fé convicta. No entanto, eu quero lhe dar, amigo leitor, a chave que abre os caminhos mais misteriosos da existência humana. É o melhor modo de se aproximar do Ser amoroso por excelência. É se encontrar com Cristo. Este nós O vimos e tocamos com as mãos. Ele é o revelador do rosto do Pai, porque Ele relata o que viu.

Dom Aloísio Roque Oppermann scj -
Arcebispo de Uberaba, MG

22 de junho de 2011

As características do amor

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O amor sobrepõe todas as paixões
Quando olhamos a manifestação do Espírito Santo, como o uso dos dons, tocamos na maravilha de Deus, que concede a Seu povo muitas bênçãos. Muitas vezes, nos questionamos: "Será que a ação de Deus se manifesta assim em mim?" Observe: todos esses dons são importantes, porém, a Palavra de Deus nos indica que o amor é o maior de todos os dons. Podemos até fazer bastante barulho, como um sino, mas é o amor que dá consistência à alma.


Você já sentiu um grande vazio em sua alma? Esse vazio se dá pela falta do Deus-Amor em nossa vida, se não amamos e não nos deixarmos amar sempre nos sentiremos vazios. Todas as nossas atitudes precisam ser por amor. Existem muitas pessoas que vivem correndo e movendo mundos e fundos, fazem muito, mas não amam nem se deixam amar.

Na vida o que realmente faz diferença são as pessoas que estão ao nosso lado; os idosos sabem bem disso. É desesperador quando alguém afasta de si as pessoas que o amam. E você pode se perguntar: "Não é a caridade que salva?" Podemos até fazer boas obras com a intenção de prejudicar alguém, com fins políticos, em nosso nome, para nos vangloriarmos, para sermos vistos pelas pessoas. Se o fazemos com essa mentalidade não há amor.

Aquilo que fazemos sem amor pouco é aproveitado, não nos sacia. Assim como nosso corpo tem necessidade de se alimentar, o mesmo ocorre com nossa alma, ela precisa de alimento. Só o amor nos torna imunes à maldade que tenta entrar em nossa alma. O amor não é um sentimento, não é uma paixão, estas são coisas distintas. Quando nós amamos alguém estamos a favor dessa pessoa, pois o amor pensa no outro, ao passo que a paixão pensa em si mesma. O amor alimenta a alma; a paixão a consome.

O amor traz em si características que são próprias dele. Ser paciente, esperar o processo do outro, a lentidão do outro. Se não amamos não temos paciência, pois o processo do outro nos faz sofrer. Quem ama tem paciência e espera pelo outro.

Para curarmos a maldade que sai da nossa boca é preciso pensar bem dos outros, querer o bem deles e lhes fazer o bem, como nos ensina Dom Bosco. O amor não tem inveja, quando você se perceber tendo inveja de alguém se pergunte: "Por que eu não amo essa pessoa?" O amor expulsa a inveja, ele não é presunçoso nem se enche de orgulho (cf. I Cor 13, 1-13).

Tudo o que não é amor em nossa vida é pecado. Quando lançamos raízes no amor até rezamos pelos nossos inimigos. Quando dizemos que Deus é amor e que Ele nos ama, estamos dizendo que Ele tem paciência conosco, que Ele não está interessado em nossos bens, porque o Senhor nos ama e não tem raiva de nós, nem se alegra com os nossos sofrimentos. Ele se alegra quando nós nos encontramos com a verdade.

Meu Deus acredita em mim, mesmo quando eu não acredito em mim mesmo. Meu Deus me espera e de mim espera tudo de bom. O amor jamais acabará. O amor sobrepõe todas as paixões.


Foto Márcio Mendes
marciomendes@cancaonova.com

20 de junho de 2011

Simplesmente barro nas mãos do Oleiro

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Não existe arte sem amor, quadro sem pintor, vaso sem oleiro…
A Sagrada Escritura utiliza-se de inúmeras figuras e expressões para revelar Deus e o Seu modo peculiar de agir na história. Entre estas descrições quero destacar a imagem do oleiro, fortemente acentuada pelo profeta Jeremias (cf. Jer 18,1-6ss).

Nestes versículos apresentados pelo profeta, a manifestação divina é expressa com a figura de um oleiro, que molda como a argila aqueles que Lhe pertencem. Esta descrição é rica em expressão e em significado, pois desvela a ação e o amor do Eterno, possibilitando-nos compreender o "singelo jeito" com que Ele nos acompanha e faz crescer.

Este Oleiro sabe, melhor que nós mesmos, do que realmente precisamos e o que nos fará essencialmente felizes. Sua ternura nos convida ao abandono total aos Seus cuidados, os quais sempre nos proporcionarão o melhor, mesmo quando não formos capazes de compreender Seu distinto modo de agir. Por isso, para caminhar no território da fé, a confiança se estabelece como realidade mais necessária do que a compreensão… Uma confiança "filial" de alguém que se descobre amado e cuidado e que, por isso, crê que o Oleiro está sempre agindo e realizando o que é melhor para seus dias.

De fato, este Oleiro enxerga além. Ele contempla as surpresas que ao futuro pertencem e, na Sua Divina Providência, cuida de nós: ora retirando de nosso caminho o que nos é prejudicial, ora acrescentado algo àquilo que nos falta. Isso nos desautoriza a pretensão de querer condicionar a ação de Deus à nossa limitada maneira de enxergar e compreender as coisas, antes, nos confessa que é preciso confiar naquilo que Ele faz e em Seu modo particular de fazê-lo.

A confiança nos abre à percepção de que Deus sabe retirar excessos e acrescentar às ausências no momento certo. Sabe o que realmente nos fará crescer e amadurecer (e crescer às vezes dói). E maduro é quem sabe perder sem apegos, para que assim possa ser despojado do que não lhe é essencial e acrescentado no que realmente lhe falta.

Não existe arte sem amor, quadro sem pintor, vaso sem oleiro… Obra mais bela é a que se constrói pelas mãos do artista, do Oleiro. Só Ele traz em Seu coração os belos sonhos que poderão retirar um rude barro de sua "não existência".

O barro não pode se moldar a si mesmo. Para vir a ser, ele precisa confiar-se aos sonhos e à sensibilidade do oleiro, pois as mãos dele comportam a medida certa, entre firmeza e delicadeza, para trabalhar esta substância abstrata transformando-a em uma linda obra de arte.

Da mesma forma, não existe parto sem dor, maturidade sem perdas, felicidade sem se  ater ao essencial. É necessário confiar n'Aquele que nos molda, e mesmo quando a firmeza de Suas mãos parecer pesar demais sobre nós, confiemo-nos à Sua iniciativa e criatividade, que sempre realizará em nós o que é melhor.

A felicidade faz morada em nosso coração à medida que nos assumimos como aquilo que realmente somos: "Barro, apenas barro, nas mãos do Oleiro!"

Foto Diácono Adriano Zandoná
verso.zandona@gmail.com

17 de junho de 2011

O seguidor de Cristo e a cruz

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É ajuizado aquele que abraça a sua cruz com a abnegação
Uma das advertências incisivas de Cristo, que cumpre seja sempre refletida, foi esta: "Quem não toma a sua cruz e não me segue não é digno de mim" (Mt 10,18). Fica, portanto, claro que quem quer seriamente segui-Lo deve carregar a própria cruz. É isso uma exigência a que todo cristão deve se submeter. Trata-se da cruz de cada dia, pois, num vale de lágrimas, esforços constantes são necessários para o próprio aprimoramento espiritual. Os sofrimentos, as amarguras, as tribulações estão sempre presentes de uma forma ou de outra, mas feliz quem as transforma em pérolas preciosas para a eternidade.


A felicidade perene não se adquire por um simples ato de virtude ou um sacrifício pontual. Toda energia e toda coragem nos mínimos sacrifícios de cada momento lançam a vida nesta terra bem longe da mediocridade, do comodismo. Cada instante é uma nova ocasião para caminhar fielmente, vencendo-se a si mesmo com generosidade e sinceridade. Note-se que Jesus determinou que é preciso segui-Lo, dado que Ele carregou primeiro a Sua cruz, deixando um exemplo a ser adotado. O mistério da cruz de Cristo transcende os séculos e os verdadeiros cristãos vivem o que dizia São Paulo: "Quanto a mim só quero me gloriar da cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo!" (Gl 6,14). Isso não quer dizer que se refaz o que o Redentor realizou há dois mil anos, mas se unir ao dom feito por Ele de si mesmo e que atravessa os tempos.

Muitos são os que pensam em fazer penitências extraordinárias, quando o que Deus quer são as penas ordinárias de cada hora aceitas de uma maneira extraordinária, porque se acha unido o cristão ao seu Salvador. Em qualquer momento desta vida o ser humano convive com as dificuldades mais variadas, mas cumpre sobrenaturalizá-las A dor e a aflição acompanham o ser racional desde o nascer ao fim de sua trajetória terrena. De fato, que idade, que tempo, que lugar e que condição social se viram jamais isentos de sacrifícios? É ajuizado aquele que abraça a sua cruz com a abnegação, com a renúncia, com a mortificação. A vida do autêntico cristão pode parecer dura, mas é meritória; pesada, mas é alegre. É o que acontecia com os santos os quais no meio de suas cruzes conservavam a calma, a paz, o júbilo, a santa resignação e conformidade com a vontade divina. Eles amavam a cruz e conheciam seu valor. Vivenciaram as palavras de São Paulo: "Realmente, o leve peso da nossa tribulação do momento presente, prepara-nos, além de toda e qualquer medida, um peso eterno de glória" (2 Cor 5,17).

O autor do livro "Imitação de Cristo" lembra que "na cruz está a salvação, na cruz encontramos a vida, na cruz nos defendemos dos inimigos, na cruz recebemos infusões de celestial suavidade, na cruz se robustece a mente, na cruz se encontra o gozo do espírito, na cruz se acha a súmula da virtude, na cruz se adquire a perfeição da santidade" (Lv II, 12). É preciso que o cristão saiba sempre combater o bom combate a que se refere o Apóstolo das Gentes (cf. II Tm 4,7). O temor do sacrifício, as desilusões e os próprios defeitos não dobram uma vontade firme, forte, enérgica e constante. Carregar a cruz, como deseja Jesus, é exercer também a disciplina da vontade, agindo seu discípulo com reflexão, sem se deixar levar pela rotina, pelo capricho do impulso do momento e de qualquer paixão desordenada. A precipitação impede de se agir com retidão.

A serenidade, a calma e a tranquilidade só as possuem quem domina com vigor seu modo de atuar. Não é fácil lutar contra a lassidão, a indolência que conduzem à omissão no cumprimento dos deveres diários. A fuga da ociosidade requer disposição contínua para que, num trabalho bem direcionado, se possa ter um autodomínio que demanda pugna ininterrupta, custosa. Deste modo, em todas as circunstâncias da vida, há como colocar em prática a determinação de Cristo, carregando com sapiência, nos traços de Seus passos. Assim, para se viver plenamente esta espiritualidade da cruz todo cristão deve, portanto, ter seu olhar voltado para Cristo e, corajosamente, segui-Lo. Apenas deste modo se experimenta a exemplaridade do Mestre divino, experiência que é sempre elemento essencial para se atingir uma melhor perfeição na caminhada rumo a Jerusalém celeste. Este convívio sábio com as incongruências do dia a dia traz imperturbabilidade e impede uma projeção pessimista quanto o dia de amanhã, porque o cristão fica prevenido e armado contra possíveis dissabores, porque saberá enfrentá-los sob a luz do divino Crucificado e repete ufano com o Apóstolo: "Eu tudo posso naquele que me conforta" (Fl 4,13).

Cônego José Geraldo Vidigal de Carvalho
Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos