8 de abril de 2009

Como saber se tenho uma vida espiritual

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Vida espiritual se traduz em luta

"Não faço o bem que quero e faço o mal que não quero" (Rm 7,19).

São Paulo nos mostra, por meio desse versículo, muito claramente como funciona esse processo que todos nós necessitamos: uma vida espiritual. Veja bem: o apóstolo dos gentios afirma que em determinados momentos ele não consegue fazer o bem que quer fazer e que acaba fazendo o mal que não quer [fazer]. Há uma luta declarada aí. Uma luta interior entre fazer o bem ou fazer o mal. Nisso consiste, segundo Santo Inácio de Loyola, a nossa vida espiritual. Para o grande santo da Igreja se existe luta, há um conflito interior, por isso existe aí uma vida espiritual. Ou seja, a vida espiritual se traduz na luta.

Você pode se perguntar: "E eu? Como vou saber se tenho uma vida espiritual?" A partir das dicas de São Paulo e Santo Inácio você pode começar por identificar se, por vezes, acontece dentro de você essa luta, esses conflitos interiores. Se você, como o grande apóstolo, com certa freqüência, fica nessa briga entre fazer o bem ou o mal, então, você tem, sim, uma vida espiritual.

E caso você perceba que dentro de você não há essa luta, então é hora de começar a se questionar se possui realmente uma vida espiritual. Pois essa ausência de luta pode significar que, espiritualmente, sua vida está morna, parada, estagnada. A espiritualidade é peça fundamental para que nos realizemos como pessoas, como seres humanos.

Uma vantagem em saber que vida espiritual se traduz em luta é que dessa maneira você não irá mais cair no desânimo por causa das suas lutas interiores e dos conflitos que, às vezes, o atordoam.

Use isso a seu favor. Nessa hora é preciso perceber que – se existe essa luta – é porque você tem uma vida espiritual que o faz, sobretudo, experimentar e viver com o auxílio da graça de Deus. E essa graça é muito maior do que qualquer falha, defeito ou imperfeição que você possua. A graça de Deus é maior que tudo isso.

Que Deus nos abençoe!

Foto Denis Duarte
contato@denisduarte.com

3 de abril de 2009

Ser ouvido, mas não compreendido

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Quando não se chega a um termo satisfatório

Relacionamento, ao mesmo tempo em que é sentido de vida, preenchimento interior, é ponto de conflitos entre os seres humanos. Somos predispostos a viver próximos, mas quem nunca se desapontou na vida? É natural esse tipo de sentimento quando temos boa imagem de uma pessoa, seja à primeira vista ou pela impressão causada no convívio, mas que, de repente, se desfaz quando somos surpreendidos por uma atitude contrária à que causava nossa admiração.

Faz parte de um relacionamento maduro, fundamentado na verdade, quando houver essa ruptura no sentimento, o recorrer ao diálogo. Quanto maior a proximidade das pessoas, mais deveriam ser óbvias a transparência e a liberdade em dizerem o que não foi bom. Assim avançamos em diversos tipos de convívio: no trabalho, na amizade, no namoro, no casamento.

O problema é quando, mesmo com diálogo, ainda não se chega a um termo satisfatório para ambos os lados.

Você já teve a sensação de ser ouvido, mas não ser entendido? Por mais que fale, argumente e esteja certo, nada parece penetrar o entendimento, a razão e o perdão do outro.

Quando as partes dialogam, mas num primeiro instante não existe consenso, é imprescindível saber que ao se procurar entender com alguém é mais importante ouvir do que falar. Exercite a arte da escuta. Mesmo que seja você quem tenha de dar explicações, deixe que a outra parte primeiro esgote sua indignação.

Tanto para passar a sua ideia quanto para absorver o conteúdo do outro é importantíssimo notar o que as palavras não dizem. No desabafo de uma pessoa existe muito mais que argumentos, aí também estão seus sentimentos, os quais nem sempre são completamente expressos por palavras. É preciso buscar fora daquilo que simplesmente ela aparenta ser, quais os seus anseios, planos, cultura e até sua concepção e história de vida. Experiências do passado condicionam-nos a agir e a pensar segundo o que aprendemos, cada qual com seu conceito.

É preciso detectar os sentimentos presentes em você e no outro e nomeá-los, para saber o que está acontecendo no interior de quem está envolvido. Por vezes, será necessário simplesmente chegar a esta conclusão: "Suas emoções são diferentes das minhas diante do fato acontecido". E a partir daí buscar um meio-termo. Por fim, é normal que seres humanos não estejam de acordo em tudo.

A perfeição do amor não está em juntar o que é igual, mas em transcender a expectativa mesmo sabendo que se é diferente. O que é verdadeiro supera as barreiras da incompreensão, traz a certeza de ser assumido, mesmo sabendo que na alma da outra pessoa existe a consciência de que aquele com quem se caminha junto não é perfeito. Somos mais amados quando somos acolhidos, apesar de nossas deficiências, não pelas nossas belezas. Amar quem não está pronto é amar verdadeiramente, pois não busca compensações em dar de si.

Abra o coração para aqueles que você ama, vá disposto, no diálogo, a ouvir e a se desfazer dos próprios conceitos em favor da reconciliação.

E então? Está pronto a abrir os ouvidos?

Deus o abençoe.

Sandro Ap. Arquejada
sandroarq@geracaophn.com

30 de março de 2009

Autocontrole em casa

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Domine o seu jeito de ser

Caridade é o amor verdadeiro, de doação. Mas quando falamos em doação, não é só com relação ao se dar esmolas, mas o dar-se de si mesmo, o partilhar e ir ao encontro do outro. Quem não quer amar e se sentir amado?

Todo dia é dia de superar as adversidades, pois a santificação é a vontade de Deus para a nossa vida. Ele nos quer santos, onde quer que estejamos. Por isso, o Senhor nos quer livres das impurezas, sem que nos deixemos levar pelas paixões desregradas, pois quem O conhece, sabe que a Palavra d'Ele ensina que temos limites para viver. Paixão não é pecado. Pecado é deixar-se levar por ela. Deus nos fez com inteligência para que possamos escolher. Quem vive as paixões desregradas, não conhece e não vive a Palavra de Deus.

No momento em que você abandona os preceitos do Senhor, não está abandonando uma pessoa qualquer, mas o próprio Deus. Isso é muito sério, é preciso fazer um compromisso de vida para a sua família. No momento em que alguém, dentro da nossa casa, age com amor, percebemos que o ambiente é tomado por uma calmaria, muda o clima. Se você se propuser a reagir de forma amorosa, experimentará a paz. Não importa o problema, a reação tem de ser sempre a partir do amor. Ele é o antídoto contra a raiva e o rancor.

O perigo é cairmos no ressentimento. As mulheres são especialistas em guardar rancor, porque são movidas fundamentalmente pelo coração. Não alimente esse sentimento, porque ele fecha e tranca o seu coração. Cada pessoa tem um tipo de temperamento, mas Deus nos pede o autocontrole, para que não coloquemos a "explosão" que há dentro de nós para fora. É nessa hora que você deve deixar o Espírito Santo agir em você, curando as suas reações.

Tenha uma reação de fé, e dependendo da situação, aja com o silêncio, o perdão e a misericórdia. Deus lhe mostrará qual reação você deverá ter. Domine o seu jeito de ser. Quantos de nós temos reações descomedidas...

Você deve estar se perguntando por que eu estou dizendo isso a você? Quando deveria ser seu marido ou filhos que deveriam saber disso, mas Deus escolheu para que você vivesse isso hoje, para que desse o primeiro passo, aprendendo a dominar a si mesmo, principalmente, o "sangue quente" que corre em suas veias.

Construa uma família de paz dentro de casa e todos baterão à sua porta para saber qual é o segredo da felicidade. Se você quiser ter uma família cheia de vida, reaja!

"O fruto do Espírito Santo é caridade, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança. Contra estas coisas não há lei" (Gálatas 5, 22-23). Cuidado com suas emoções, tenha autocontrole e você terá uma família como fonte da vida e construtora da paz. Só fale em sua casa com a linguagem do amor. Se você quiser comunicar vida nova em seu lar, terá de expressar a sua fé, porque nenhum ser humano é capaz de ser feliz sem Deus.

Nós, seres humanos, procuramos, sem cessar, a felicidade e o amor, e essas virtudes estão na família. Fale a linguagem do amor e a sua família encontrará a paz e tudo o mais.

Adriana Pereira

27 de março de 2009

Os desafios da vida conjugal

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Para se viver uma nova vida, são exigidas novas atitudes

Entende-se por casamento a união legítima entre um homem e uma mulher que se dispõem a viver sob os mesmos princípios regidos pela Igreja. Isso não isenta o casal de viver os impasses e os desafios no exercício da vida comum. Viver um compromisso de profundos vínculos, como é o casamento, sem abdicar dos hábitos vividos enquanto solteiros, certamente, fará com que os casais enfrentem muitos problemas e complicações no convívio.


Motivos que fazem surgir uma crise são muitos; estabelecer equilíbrio entre a família, o trabalho e, de maneira especial neste artigo, a vida social, é um dos novos desafios da vida conjugal. Enquanto éramos solteiros ou não tínhamos um compromisso estabelecido com alguém, o tempo era nosso. Podíamos fazer o que desejávamos, ir aonde quiséssemos. De certa maneira, não precisávamos dar satisfação nem partilhar nossa agenda com ninguém. Contudo, podem ser incômodas, para quem ficou em casa, as famosas "esticadas" das sextas-feiras ou as intermináveis tardes dos finais de semana com os amigos. Ainda que estas sejam práticas inocentes, algumas pessoas, desatentas, se esquecem de que seu cônjuge tem sentimentos e também planeja aproveitar do tempo livre ao seu lado.

Para viver uma nova vida, há a necessidade de se adaptar também a novas atitudes.

Muitas coisas ao longo dos anos irão despontar exigindo pequenos ajustes no cotidiano do casal. E uma maneira de aprendermos a reeducação de nossos hábitos seria no sentido de melhor equacionar o tempo livre, considerando, também, a necessidade de estar com o cônjuge. Aliás, ninguém pode conhecer o outro em escassos e limitados momentos de convivência. Na prática do "conhecer e ser conhecido" os casais passam a se tornar parceiros, a ponto de identificar os medos, as aspirações e as insatisfações um do outro, tornando-se cada vez mais próximos e cúmplices.

Muitas pessoas, por não terem entendido tais princípios, se isentam dessas obrigações, argumentando que o casamento é uma instituição falida e antiquada. Para outras, a idéia que se passa sobre o casamento é a de prisão, entre outras definições.

Quando assumimos um relacionamento o fazemos por livre e espontânea vontade. Uma vez assumido o compromisso de vida a dois, e percebendo as possíveis e necessárias adequações de nossos antigos hábitos, podemos achar que estamos perdendo a liberdade ou que o novo estado de vida tenha nos "podado as asinhas".

Extrapolar nas experiências, sobre as quais se pensa ter direito, vivendo à mercê de todas as oportunidades, justificando que a vida é curta e por isso deve ser aproveitada – não convém àquele que se empenha em promover a felicidade do ser amado.

De certa maneira, a vida realmente parecerá curta para se viver os infinitos atos de carinho de casais apaixonados.

Ao enxergarmos a novidade de uma experiência a dois como um peso ou como uma clausura, na verdade, estaremos rotulando e expondo nosso cônjuge como alguém opressor ou egoísta. Assim, paciência e esforço serão atributos necessários para assimilar os desafios da vida conjugal, especialmente para aqueles que desejam nutrir a chama do amor entre si.

Deus abençoe a cada um pelo novo propósito.

Um abraço

Foto Dado Moura
dado@dadomoura.com

24 de março de 2009

O católico e as Bíblias protestantes

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Não se trata de preconceito, mas de coerência de fé

São várias as traduções de Bíblia disponíveis para nós hoje em dia. Segundo comunicado da União das Sociedades Bíblicas, divulgado pela Rádio Vaticano, são 451 línguas para as quais a Bíblia foi traduzida integralmente, enquanto aquelas para as quais foi traduzida em parte são 2.479. Isso confirma a Sagrada Escritura como o livro mais traduzido no mundo e assim 95% da população mundial têm hoje condições de a ler em uma língua conhecida.

No Brasil, por exemplo, são muitas as traduções da Bíblia que temos à disposição. Eu mesmo possuo várias delas como: a Bíblia Jerusalém, TEB, Peregrino, Ave Maria e CNBB. E além dessas, existem outras muito boas também.

Citei algumas das traduções católicas, mas quero chamar a atenção para as de orientação protestante, que são das mais variadas denominações. Quem nunca ganhou uma Bíblia ou um Novo Testamento de orientação protestante? É comum encontrar católicos que ganham esse material de presente e acabam por fazer uso dele. Essa observação é importante porque muitos católicos acabam fazendo uso delas [Bíblias protestantes], inclusive sem saber, ou sem a informação do porquê devem fazer uso de uma Bíblia Católica. Nesse momento você pode se perguntar: e qual problema em usar uma Bíblia protestante se tudo é Bíblia?

Basicamente por dois motivos:

Primeiro, porque para o protestantismo os livros: Tobias, Judite, Sabedoria, Baruc, Eclesiástico (ou Sirácida), 1 e 2 Macabeus, além de Ester 10,4-16 e Daniel 3,24-20; 13-14 não fazem parte da Bíblia. Por isso, as Bíblias protestantes, para nós católicos, estão incompletas em comparação com as nossas traduções.

O segundo motivo é que, sendo de orientação protestante, essas Bíblias trarão as informações extras, como introduções aos livros bíblicos e notas de rodapé, dicionários bíblicos... entre outros possíveis comentários, orientados pela sua própria doutrina, que é diferente da doutrina católica. E essas informações são muito importantes para o entendimento do texto; e se estas forem de orientação protestante, elas estarão de acordo com a doutrina protestante e não com a católica.

Esse conselho para que o católico faça uso de uma Bíblia católica não se trata de preconceito quanto ao protestantismo. Trata-se mais de uma coerência com a fé professada. Um católico ao usar uma Bíblia protestante pode misturar conteúdos, interpretações causando confusões para si mesmo e para os outros, uma vez que a maneira de entender as Sagradas Escrituras e de construir a doutrina é diferente entre católicos e protestantes. Por isso também sempre aconselho a um protestante a fazer uso de uma Bíblia que vá de acordo com a sua profissão de fé, para evitar as mesmas confusões.

E como vou saber se a Bíblia que eu uso é de orientação católica? Para isso, basta conferir se sua Bíblia possui o imprimatur, que em geral, vem em uma das primeiras páginas da Bíblia e trata-se de uma autorização de um bispo com sua assinatura ou da própria CNBB – uma aprovação eclesiástica permitindo aquela impressão/tradução e afirmando que ela está de acordo com o que corresponde a uma Bíblia da Igreja Católica Apostólica Romana. Dessa maneira, além da garantia de todos os livros do Cânon Católico, você poderá ficar seguro quanto às demais informações trazidas pela sua Bíblia, de que elas estão dispostas conforme a doutrina por nós professada.

Mas o que fazer com a Bíblia protestante que ganhei? Faça como eu. Dê de presente para um protestante. Tenho amigos protestantes com os quais tenho um combinado: quando eu ganho uma Bíblia de orientação protestante eu os presenteio com ela e, por sua vez, quando eles é que ganham uma Bíblia católica, eu sou presenteado por eles. Dessa forma, além de evitarmos confusões quanto ao uso desses livros sagrados e consequentemente de doutrinas diferentes, ao trocarmos esses presentes fortalecemos nossa amizade e os laços cristãos que nos unem.

Que Deus nos abençoe!

Foto Denis Duarte
contato@denisduarte.com

19 de março de 2009

São José

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Ele rompeu com os paradigmas enraizados da cultura de sua época

Em um mundo onde muitos fazem de tudo para "crescer e aparecer" a qualquer custo – muitas vezes utilizando o outro como escada para isso –, raras são as pessoas que na vida fazem a opção pelas pequenas coisas.

Em um sistema de crenças e valores no qual, muitas vezes, o mais valorizado é o que mais aparece e o que mais ostenta uma posição de destaque, o universo da discrição e da simplicidade acaba ficando em segundo plano (para não dizer em último). Estamos, sem dúvida alguma, na era da imagem e no império da aparência, nos quais o que acaba se destacando é a ilusão e não o ser em sua essência.

Em meio a esse complexo contexto, uma figura, como a de São José, manifesta-se como um concreto ícone de contradição, instaurando naquele que sensivelmente o contempla uma aguda crise de contestação de seus valores. E isso é muito bom. Não somos árvores imóveis e passíveis – sendo que mesmo na natureza a vida é dinâmica – diante de nossa realidade e das crenças que nos são impostas pela sociedade. Por isso questionar – tentando sinceramente compreender o melhor caminho – é sempre uma atitude virtuosa, que rompe paradigmas e aponta um novo caminho.

São José, com sua justiça silenciosa e discreta, foi alguém que soube romper com os paradigmas (modelo que era seguido) da mentalidade da sua época, desafiando crenças já cristalizadas que semeavam o preconceito e a subtração do ser humano.

Vivendo as pequenas coisas de seu cotidiano de carpinteiro, com a coragem de realizar escolhas virtuosas não vistas por ninguém, ele teve a ousadia de ser autêntico – de ser ele mesmo, sem copiar antigos modelos – seguindo a novidade da inspiração dada por Deus. Ao encontrar Maria, grávida, "sem antes terem coabitado", "sendo justo e não a querendo difamar, resolveu deixá-la secretamente" (cf. Mt 1, 18-19), enquanto a lei vigente em sua época ordenava a lapidação (morte por pedradas) para as mulheres adúlteras. E ao ter sido avisado em sonho por um anjo, foi dócil ao que Deus lhe pedira assumindo Maria como esposa, juntamente com o que "nela foi gerado" (cf. Mt 1, 20).

Enfim, José, em sua humildade e sem muitos holofotes, rompeu com um profundo paradigma enraizado em sua cultura havia muito séculos, no qual a justiça se sobrepunha à misericórdia.

Mas ele não é chamado o justo? Por que não agiu seguindo o padrão de justiça de sua época? Sim. Ele foi justo, mas o tamanho de sua justiça se manifestou na intensidade de sua misericórdia, pois, conseguiu ir além do julgamento, dando mais valor ao ser do que ao aparecer.

Por ser fruto daquela época e cultura, ele poderia muito bem ter pensado: "O que irão falar de mim? Como as pessoas me verão quando descobrirem que não desposei minha esposa?". Mas ele foi além. Para ele o amor se expressava no bem que luta para que o outro seja mais, para que este seja feliz, mesmo quando ninguém o vê nem percebe e mesmo correndo o risco de ser mal-interpretado.

Quem ama não se importa com o que vão pensar ou falar, nem se torna "vaquinha de presépio", escravizando-se por convenções culturais acerca do que deve ser feito. Quem ama – sem desrespeitar o que existe de bom na tradição – tem a coragem de superar o convencional para fazer o bem e promover a pessoa.

José não buscou os elogios dos observantes da lei nem o prestígio de ser "visto" por todos como cumpridor da justiça; diferentemente, ele buscou antes e acima de tudo estar em paz com a sua consciência, buscando em tudo ouvir e obedecer a Deus.

Ele – como muitos outros santos em nossa história – nos ensina que não é preciso muito barulho e alarde para realizarmos grandes mudanças e intensas revoluções e que o amor/obediência e a humildade são armas poderosas, capazes de questionar conceitos vigentes em toda uma sociedade.

Olhando para São José, percebo – como antes já cria – que é preciso não ter medo de romper com convenções sociais e agir de maneira nova; é claro, em tudo fazendo o bem e obedecendo a Deus.

Com certeza, se o fato se tornasse público o pai adotivo de Jesus receberia muitas críticas, como os que ousam pensar diferente recebem-nas: "Por que você vive, pensa, escreve e age diferente? Está errado, tem de ser do jeito que todo mundo faz...". Contemplando a justiça silenciosa e transformadora desse grande homem de Deus pergunto: Será que temos mesmo [de agir como todos]?

O carpinteiro foi santo o bastante para transcender aos olhares que o acusariam, fixando o olhar apenas onde o Amor tem sua morada.

Que o exemplo do grande e amado pai de nosso Salvador suscite em nós a coragem de sermos melhores, pois ele estava voltado em tudo para o Cristo sem se aprisionar a estruturas que escravizam o ser.

Foto Adriano Zandoná
artigos@cancaonova.com

18 de março de 2009

Ausência: frustração ou possibilidade?

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O vazio insere o ser do homem no nada

É duro digerir o sabor de uma ausência. Alguém que parte, vai embora, deixando apenas o silêncio, o barulho do seu silêncio.

Uma presença tem o poder de ocupar um espaço – lugar definido e cheio de significação – no coração, um pedaço que se encaixa com tudo aquilo que é próprio dessa presença.

A ausência sempre dói, deixa um vazio. Mesmo quando não se percebe.

Ninguém constrói a vida com o intuito de ser abandonado, deixado para trás, de ser impossibilitado de contemplar aquilo que seu coração amou. No entanto, a ausência é uma linha que sempre perpassará a trama da existência, e em algum momento – voluntaria ou involuntariamente – ela se fará presença em nossa história. Inúmeras são as ausências: olhares, histórias, palavras que exercem o ofício de passar...

Existem ausências eternas – a morte, por exemplo –, e ausências circunstanciais, tecidas pelo abandono ou pela distância daqueles que se que amam.

A experiência de perder alguém para a eternidade gera uma enorme dor no coração. Contudo, a experiência de perder uma presença em uma ausência ainda presente na existência desinstala profundamente o coração, deixando um gosto de desamparo e frustração. O abandono traduz com maestria um dos maiores desejos da vida: o desejo da presença.

O vazio insere o ser do homem no nada, na náusea da mais profunda descaracterização daquilo que se é. Diante disso, em muitos corações ecoa a silenciosa pergunta: Por quê? Porque agora estou na companhia da solidão e não restou nenhuma palavra para explicar: "Sinto falta da sua voz. Não a ouço, mas ela continua falando dentro de mim...".

O vazio – ausência que configura a real desconfiguração – coloca o homem diante de sua verdade, revelando a ele sua necessidade de uma Presença que não passe. "Presença que não passe?" – diriam aqueles que jazem sufocados sob o peso da frustração – "Isso é possível? Visto que o abandono é companhia constante, que em algum momento baterá à nossa porta?" A isso responderia: "Não sei. Não quero ter a pretensão de dar pequenas respostas a grandes vazios". Entretanto, com ousadia, desejo devolver a pergunta: É possível dar "Sentido" a vazios que nasceram em virtude da presença de uma ausência?

Acredito que essa resposta mora em cada um. O coração sempre soube – mesmo que inconscientemente – que a vida nasceu para ser mais que seus próprios limites. Esse é um pressentimento inerente.

Um vazio sempre gerará a frustração, mas esta precisa ser enfrentada e "resignificada". Amar é uma maneira concreta de fazer isso. Amor: capacidade de guardar o que é bom, de superar distâncias e de superar – até mesmo – o fato de não mais ser querido e acompanhado por alguém.

As ausências se tornam suportáveis e até mesmo aprendizado se o coração consegue descobrir essa "Presença", que não passa, e n'Ela consegue se ancorar.

Essa Presença é real. Ela acompanha a existência e dá sentido a qualquer vazio, pois tem o amor como essência. Ela nunca vai embora... Quando o olhar descobre tal realidade, ele tem a chance de não mais se entrelaçar apenas no que passa, mas pode descobrir, a partir da ausência, "tijolos" que constroem eternidade, pois provocam o olhar para a busca do Eterno e daquilo que O compõe.

Que o coração possa se enxergar sem ilusões diante das perdas e do real e, assim, possa encontrar – mesmo na ausência – forças para emoldurar com esperança suas dores e sua história.

Foto Adriano Zandoná
artigos@cancaonova.com