O amor em ação, a exortação do bom samaritano para cuidar do próximo
"Cuida dele" é a palavra amorosa e solidária nascida do coração de um samaritano, tratado de forma preconceituosa. A narrativa está no Evangelho segundo Lucas: diferentemente do sacerdote e do levita que passaram ao largo e não dedicaram amparo a uma pessoa ferida, caída à beira do caminho, o samaritano se detém e cuida dele.

Crédito: Jacob Wackerhausen
Depois, leva o enfermo a uma hospedaria, recomenda que se cuide dele, comprometendo-se a pagar por todos os gastos investidos na sua recuperação. Essa narrativa, que traz a interpelante e convocatória recomendação "cuida dele", ilumina o horizonte da contemporaneidade para inspirar um modo novo de tratar os pobres, enfermos e vulneráveis.
Cuidar do próximo, um propósito para o Jubileu 2025
A pressa habitual, considerados os muitos afazeres e as urgências, pode comprometer o coração humano, o exercício da cidadania e a vivência da fé, levando à desumana perda do sentido que há em cuidar do semelhante, da comunidade, do bem comum, do patrimônio público e do meio ambiente. Ter coragem e disposição para amparar quem precisa de ajuda é um propósito de ouro para este ano jubilar 2025, quando a Igreja Católica, em celebrações e peregrinações, fecunda a sensibilidade humana com um jeito novo de caminhar solidariamente – todos irmãos e irmãs uns dos outros.
Uma luz especial motivadora para os propósitos novos de solidariedade é a celebração do último dia 11 de fevereiro, Festa de Nossa Senhora de Lourdes, 33º Dia Mundial do Doente. A saúde é um dom precioso e requer cuidados especiais. No seu reverso está a experiência do limite humano da enfermidade. "Cuida dele" ressoa, então, como convite à atitude solidária e à consciência do desafio humano de tratar a enfermidade.
Na saúde e na doença, a esperança como pilar da jornada
Neste horizonte, lembra o Papa Francisco, em mensagem para o Dia Mundial do Doente, a fundamental importância de se caminhar como peregrino de esperança na saúde e na enfermidade. A esperança é força indispensável para o
enfrentamento das tribulações – não somente as próprias, também as do próximo, a quem se deve solidariamente ajudar, a exemplo do bom samaritano. A fragilidade humana, sobretudo na enfermidade, estabelece um dilema existencial: a necessidade de manter-se forte mesmo quando chega, inesperadamente, uma doença que, por vezes, é grave.
São necessários muitos cuidados, não raramente com alto custo, incompatível com a realidade socioeconômica do enfermo e de seus familiares. Muita gente padece sem a terapêutica necessária, desertificada pela falta de solidariedades e de devido respeito. Com isto, pode nascer o sentimento de impotência – diante da própria enfermidade, ou de uma doença enfrentada por um familiar, amigo, colega de trabalho, um olhar que deve alcançar ainda os mais pobres e vulneráveis, particularmente crianças e idosos.
Encontro com Deus, a proposta para fortalecer a fé e a esperança
Nestas circunstâncias, gestos de solidariedade e de partilhas são essenciais, a presença de Deus é indispensável. Colocar-se na presença divina, na fonte inesgotável de seu amor que sustenta e cura, alimenta a esperança. Papa Francisco, em sua mensagem, apresenta um itinerário rico e consolador para se aproximar de Deus: o encontro, o dom e a partilha.
O encontro com Deus, na pessoa de Jesus Cristo, é indispensável consolação, ainda quando a doença é difícil de se compreender. Importa experimentar a compaixão de Deus para alcançar fortalecimento espiritual inigualável, caminho de cura e de compreensão do desafio imposto pela enfermidade. Deus não abandona ninguém. Ao invés disso, proporciona surpresas ricas e inesperadas.
Buscando a força em Deus na fraqueza
A doença se torna, então, oportunidade para um encontro transformador, possibilitando uma força espiritual que garante a conquista de impressionante qualificação humanística. A compreensão de que toda esperança há de ser depositada em Deus é, pois, um dom. Compreende-se que a vida está no seu sentido pleno para além da própria força física, dos sucessos pessoais ou da efetivação de exitosos projetos. Tudo isso pode, inclusive, adoecer o coração, contaminando-o com terrível orgulho e soberba, alimentadores da indiferença ante a dor e o sofrimento do semelhante.
O dom da esperança nasce e se alimenta no cultivo da intimidade com Deus, fonte de cura e de sustento. Mais do que tocar a fímbria da roupa de Cristo, como aqueles da multidão que sempre O cercava, a intimidade com Ele se opera pela comunhão ao se comer do seu corpo e ao se beber do seu sangue. A força que saía de Cristo agora é acolhida na interioridade de quem o recebe. Brota assim o sentido da partilha, neste mundo em que todos são vulneráveis. A força física de hoje pode já não existir amanhã, os recursos à disposição podem não ser suficientes no dia seguinte.
Semeando solidariedade, um compromisso com o cuidado
Todos são necessitados de solidariedade. Solidariedade em todos os lugares, na família, nos hospitais, nas clínicas, no ambiente de trabalho, na convivência gratuita – como presença amorosa e consoladora na vida do semelhante.
Recomenda o Papa Francisco: considerada a fragilidade humana, torne-se o cuidado com enfermos e vulneráveis um hino à dignidade partilhada por todos, um canto de esperança.
Cuidar de quem sofre é missão especial. A atitude samaritana pode fecundar a sociedade com indispensável sentido de respeito, vencendo as intolerâncias e os autoritarismos que nascem da falsa convicção de ser onipotente, dono da fama e das atenções. O cuidado abnegado e adequado dedicado aos enfermos, em qualquer circunstância e medida, devolva a cada um o sentido de sua condição humana frágil.
O compromisso de cuidar opere no mundo uma semeadura de solidariedades. Ao olhar o mundo, contemplando cada um, especialmente os pobres e enfermos, o coração pulse, com batimentos modulados pela convocação "cuida dele". Todos, na posição de cuidar, inaugurarão um tempo novo querido por Deus, no mundo, na sociedade, na família, no trabalho, na comunidade de fé, em todo lugar.
Cuida dele!
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte