Uma breve reflexão para aprofundar a escolha de Francisco na Carta Apostólica Misericordia et misera.
1 – Aborto e perdão, o que diz Papa Francisco
Na Carta Apostólica, n.12, afirma: "concedo, a partir de agora, a todos os sacerdotes, em virtude do seu ministério, a faculdade de absolver a todas as pessoas que incorreram no pecado do aborto. Quero reiterar, com todas as minhas forças, que o aborto é um grave pecado, porque põe fim a uma vida inocente; mas, com igual força, posso e devo afirmar que não existe nenhum pecado que a misericórdia de Deus não possa alcançar nem destruir, quando encontra um coração arrependido, que pede para se reconciliar com o Pai".
2 – O que é o aborto voluntário
João Paulo II, na Evangelium Vitae, o define: "a morte deliberada e direta, independentemente da forma como venha realizada, de um ser humano na fase inicial da sua existência, que vai da concepção ao nascimento, uma enorme ameaça contra a vida, não apenas dos simples indivíduos, mas também de toda a civilização". Trata-se, em todo caso, de uma intervenção que coloca fim à gravidez suprindo o feto.
3 – O que diz a lei da Igreja
O Código de Direito Canônico (1398) recita: "Quem procurar o aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae". Trata-se, isto é, de uma pena extrema que desencadeia de modo automático, sem que haja a necessidade de uma sentença específica. A Igreja sempre admitiu a possibilidade do perdão a quem está sinceramente arrependido, mas era necessária a autorização do bispo (cânon 969) ou de um sacerdote por ele delegado. Papa Francisco, no início do Ano Jubilar, havia concedido a todos os sacerdotes a possibilidade de absolver do pecado de aborto. Com a carta Misericordia et misera, ele estende essa possibilidade de modo permanente.
4 – O que diz o Magistério
Muitas são as pronúncias de condenação. Desde o primeiro século, a Igreja expressou-se contra o aborto provocado. O aborto direto permanece gravemente contrário à lei moral: "Tu não matarás, mediante o aborto, o fruto do seio; e não farás perecer a criança já nascida" (Didaché, 2,2). "Deus, Senhor da vida, confiou aos homens, para que estes desempenhassem dum modo digno dos mesmos homens, o nobre encargo de conservar a vida. Esta deve, pois, ser salvaguardada, com extrema solicitude, desde o primeiro momento da concepção; o aborto e o infanticídio são crimes abomináveis" (Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, 51).
Não há nenhuma relação entre a excomunhão, que diz respeito à vida espiritual da pessoa, e a gravidade do pecado. O aborto é um pecado mortal como outros, mas o fato de ser cometido pela própria mãe contra um filho inocente, induziu a Igreja a colocar o agravante da excomunhão (que diz respeito à pessoa e não ao pecado). Um chamado, portanto, para que a mulher e aqueles que com ela cometeram o aborto (médicos e familiares), decidam iniciar um caminho de penitência e conversão.
6 – O que mudou com a decisão do Papa Francisco
É facilitado o caminho de conversão daqueles que se mancharam com essa gravíssima culpa. O fato de que todos os sacerdotes tenham agora, em modo permanente, a possibilidade de acolher e absolver essas pessoas, favorece também uma tomada de consciência mais viva do problema e poderá levar a uma preparação e uma formação mais adequada dos confessores, como é desejo do Papa ("a fim de que a ninguém falte jamais o sinal sacramental da reconciliação através do perdão da Igreja").
O texto é do jornalista italiano Luciano Moia, publicado no site Avvenire, em 22-11-2016. A tradução é de Rodrigo Luiz dos Santos.
Rodrigo Luiz dos Santos
Missionário na Canção Nova, Rodrigo Luiz formou-se em Jornalismo pela Faculdade Canção Nova. É casado com Adelita Stoebel, também missionária na mesma comunidade. Autor de livros publicados pela Editora Canção Nova.
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