Há pregadores que praticam e ensinam que se devem apenas anunciar a Palavra de Deus e nunca denunciar os outros. Mas eles mesmos denunciam o pecado e seus efeitos na pessoa e na comunidade. Chegam a considerar a denúncia política como falta de espiritualidade. Esquecem os salmos, Isaias, Jeremias, Amós, Oséias e os profetas que denunciavam as injustiças, exatamente porque acreditavam em Deus e viam que as instituições, os reinos, os falsos profetas e os reis tinham se afastado da justiça e da misericórdia. A Bíblia está cheia de denúncias políticas.
Defender o povo e denunciar o que o fere e se preciso os que o ferem, e fazê-lo sem perder a ternura é atitude altamente espiritual. Jesus o fez. Os apóstolos o fizeram, os bispos no Vaticano II o fizeram, os bispos do Brasil o fizeram.
Fomos criticados quando na Gaudium et Spes, nos anos 60 a Igreja questionou o falso progresso dos nossos tempos. Progresso a todo custo acaba em alto custo social. Progresso a qualquer preço aumenta o preço do produto e avilta o preço do produtor. O capital não pode ser mais importante que o trabalhador e seu trabalho.
Também Paulo VI e João Paulo II, quando denunciaram, nas suas encíclicas sociais, o progresso a qualquer preço, foram chamados de retrógrados. Não faltaram pregadores de outras igrejas a porem nos católicos a pecha de serem atravancadores do progresso. Foi preciso mais uma crise do capitalismo para entender que progresso tem limites. Foi preciso a constatação de que as dramática mudanças climáticas do mundo são fruto da ganância de quem suja o planeta para entenderem que os cristãos precisam denunciar tudo o que periclita a vida futura. Nosso excesso de consumo e nossa febre de possuir hoje pode ser a carência de água e a fome de amanhã. Nem o capitalismo nem o comunismo se revelaram solução para o mundo. Denuncie-se o que têm de perverso e se aceite o que oferecem de bom!
Quando a Igreja levantou a voz em defesa do feto e do embrião, sustentando que havia outros caminhos para se conseguir células tronco, foi barbaramente ofendida e chamada de retrógrada, até por cientistas que sabiam que havia outras soluções.Mas, enquanto não vinham novas descobertas eles queriam aquela mais imediata. A Igreja não engoliu o argumento, foi contra o imediatismo e denunciou. E o fez do púlpito, em missa e nas praças diante das catedrais. Fez bem ou fez mal? Foi falta de espiritualidade ou foi alta espiritualidade?
Quando denuncia o tráfico de entorpecentes, de escravas sexuais, de órgãos humanos e de favores políticos está cumprindo o seu dever de Mãe e Mestra. Pregador que jamais denuncia porque não deseja correr o risco ou tem noção errada de espiritualidade ou é covarde. O que denuncia tudo, apressadamente, e de maneira imatura e sem provas também mostra falta e conteúdo. Não foram poucos os que na televisão e no rádio falaram contra a manipulação do embrião confundindo alhos com bugalhos. Clonagem é uma coisa, coleta de células tronco é outra. Poderiam ter lido um pouco mais!
Há casos em que o pregador deve evitar nomes. Há outros nos quais não pode se omitir. Pagará alto preço por isso, mas deve recorrer ao bispo e aos colegas e então agir. Se sabe que há corrupção no seu município deve falar dela. Se não quiser citar nomes não cite, mas não se omita como se sua missão fosse apenas ensinar a orar. Junte sua voz a voz do povo e peça investigação. Se não quer fazê-lo do púlpito faça-o no radio ou em outros veículos, mas não se omita."Só falo de conversão e de Deus. De política falem os católicos políticos" – disse um pregador formado em linha de Igreja Light, termo usado no ano 2.000, no documento sobre a Ética nos Meios de Comunicação Social. O colega retrucou: -Então rasgue sua Bíblia e ignore os profetas, os salmos, os evangelhos e as epistolas e funde uma nova igreja, porque, na nossa muitos morreram em defesa do povo, denunciando o que tinha que ser denunciado.Descanonize todos os santos que deram a vida em favor da justiça. Mude a frase de Jesus que disse que ninguém em maior amor do que aquele que dá a sua vida em defesa dos irmãos.
É mais cômodo deixar a denuncia aos políticos. Mas uma coisa é deixar a política para os políticos e outra é formar o povo em conceitos sólidos de políticas justa, de justiça, paz e direitos humanos. Se a injustiça fere demais o povo, demonstra alto grau de espiritualidade o político ou o pregador que se arrisca e mostra onde está a origem da dor do povo. Não basta dizer que foi o pecado. Tem que dizer que pecado da sociedade, que grupo e que leis ou lacunas o ferem. Basta criar casas de cura para as vitimas da droga, ou deve-se também denunciar os caminhos pelos quais a droga chega aos nossos adolescentes?
A maioria dos nossos anúncios não precisam passar pela denúncia. Mas há anúncios que não fazem sentido se não passam pela denúncia. Anunciemos a virtude das mulheres. Denunciemos o tráfico de escravas sexuais e alertemos nossas meninas quanto a aliciadores que lhes oferecem trabalho na Espanha e na Itália sem nenhuma qualificação profissional… Anunciemos o trabalho e o emprego, Denunciemos a escravidão onde ela ainda existir. Os papas o fazem. Os bispos o fazem, o pregador o faça!