O culto desses mártires foi confirmado por Pio IX em 1854
Vejo pessoas chamarem Dom Romero de mártir, por ter lutado pela justiça na sua pátria; outros chamam padre Józimo de mártir da terra, padre Rodolfo Lukenbein, defensor dos índios contra posseiros no Mato Grosso, etc. Nem mesmo um processo de beatificação existe instalado no Vaticano sobre eles, então, não podemos chamá-los de mártires, embora possam ter sido grandes cristãos e terem sido assassinados. Só é considerado mártir pela Igreja quem morre explicitamente em defesa da fé, e não por causa social e política como Martin Luther King, Robert Kennedy, Tiradentes, entre outros. Não se pode querer definir as coisas na Igreja sem o Sumo Pontífice.
Mas no Brasil houve grandes mártires no Rio Grande do Norte na época (1630-1654) em que os holandeses protestantes calvinistas ocuparam alguns lugares no país e quiseram obrigar o povo católico a se tornar calvinistas. Morreram em defesa da fé católica e por isso os que foram identificados foram beatificados pelo Papa. O primeiro grupo de católicos massacrados pelos calvinistas, cerca de 70 pessoas aproximadamente, foi trucidado na capela da Vila de Cunhaú, Rio Grande do Norte. O segundo grupo de mesmo número foi chacinado em Uruaçu. Esses mártires foram beatificados no ano 2000. Dom Estevão Bettencourt narrou bem os fatos sobre esse assunto em sua revista (PR, Nº 451, 1999, pg. 530).
Os holandeses invadiram o Nordeste do Brasil e dominaram a região desde o Ceará até Sergipe, de 1630 a 1654. Eram protestantes calvinistas e vieram com seus pastores para doutrinar os índios. Isso gerou uma situação difícil para os católicos da região, porque foi proibida a celebração da Santa Missa. Em Cunhaú, RN, um pastor protestante prometeu poupar a vida a todos, caso negassem a fé católica, o que a população não aceitou. Então, no domingo, 16 de julho de 1645, festa de Nossa Senhora do Carmo, na capela da Vila de Cunhaú concentravam-se aproximadamente setenta pessoas para participar da Santa Missa.
Padre André de Soveral, com seus noventa anos de idade, iniciou a Santa Missa. Os soldados holandeses, armados de baionetas, chefiando um grupo de índios canibais invadiram a capela, em grande algazarra, logo após a consagração do pão e do vinho. Fecharam-se as portas da capela e começaram a massacrar os fiéis, impossibilitados de fugir. O sacerdote foi morto a golpes de sabre. O chefe da carnificina foi um alemão a serviço dos holandeses com o nome de Jacob Rabbi. Terminado o massacre, os algozes se retiraram, deixando os cadáveres estendidos no chão da capela. Um relato da época diz que os índios canibais devoraram as carnes das vítimas.
Outro grupo, mais numeroso, cerca de setenta pessoas, sem contar os escravos e as crianças, foram para um local às margens do Rio Grande (Rio Uruaçú), onde construíram um abrigo fortificado e tomaram o nome de Comunidade Potengi. Essa comunidade foi atacada por índios armados, comandados por Jacob Rabbi e um famoso chefe indígena e acompanhados por soldados holandeses. Mataram todos os habitantes da fortaleza, inclusive padre Ambrósio Ferro e muitas pessoas de Natal. Relatam os cronistas que a uns cortaram os braços e as pernas, a outros degolaram, a outros arrancaram as orelhas ou arrancaram a língua antes de os matarem. Alguns cadáveres foram esquartejados: a Mateus Moreira arrancaram o coração pelas costas; antes de morrer ainda pôde gritar em alta voz: "Louvado seja o Santíssimo Sacramento!".
Esta é a versão dos fatos como se encontra no livro "O Valoroso Lucideno" de autoria de Frei Manuel Calado, publicado em Lisboa no ano de 1648. Frei Manuel escreveu na mesma época em que tudo ocorreu. Existe outra versão do episódio, idêntica à anterior e com mais detalhes. Encontra-se no livro "Os Holandeses no Brasil" de monsenhor Paulo Herôncio.
Um outro fato que merece menção é o martírio de padre Inácio Azevedo e seus companheiros. Ele foi a Portugal buscar reforços para a evangelização dos índios no Brasil. No dia 5 de junho de 1570, o sacerdote e 39 companheiros, na caravela mercante "São Tiago" partiram de volta para o solo brasileiro. A caravela foi alcançada pelo corsário francês Jacques Sourie, calvinista, que partira de La Rochelle para capturar os jesuítas. Esses foram friamente degolados; o número de mártires foi 40. O culto desses mártires foi confirmado por Pio IX em 1854. (Sgarbosa, 1978, p. 224) e a memória litúrgica deles é dia 17 de julho.
Esses fatos formam uma triste "inquisição" desconhecida e que não é contada.
felipeaquino@cancaonova.com
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