Há solução: melhor distribuição, maior solidariedade e partilha!
Entretanto, pode acontecer que muitos não voltem às suas lides com tanta tranquilidade. Se as férias foram feitas de vícios – e quanto custam! – ou de abusos desenfreados, não virá à tona o sorriso generoso de algumas crianças que me cumprimentaram recentemente, voltando de uma viagem feita com os pais. Abraços e histórias se misturavam, a ponto de uma pessoa estrangeira, que nos visitava, ficar edificada com a liberdade da meninada com o Arcebispo de Belém. A bonita algazarra ficou gravada em minha memória. Eram sorrisos felizes e gratuitos!
Quando os apóstolos se viram em apuros diante da multidão faminta (Cf. Mt 14, 13-21; Mt 15, 32-39; Mc 6, 33-44; Mc 8, 1-8; Lc 9, 10-17; Jo 6, 1-13), foi muito pouco o que tinham a oferecer: poucos pães e poucos peixes. O Evangelho de São João ainda diz que foi um menino a colocar à disposição uma oferta aparentemente tão insignificante. E pensar que as mulheres e crianças nem foram contadas no cálculo dos comensais! E menino dá de graça pão, peixe, sorriso, perdão e brilho nos olhos. Foi de graça que Jesus encheu-se de compaixão da multidão, curou suas enfermidades, anunciou-lhes a Boa Nova. E quando a criança lhe deu de graça pães e peixes, estes se multiplicaram, quando os discípulos, atônitos, viam o milagre passar pelas próprias mãos.
É de graça que a terra oferece dadivosa e generosa o alimento aos seres humanos. O milagre continua a acontecer, uma geração após a outra. Há períodos no ano em que se multiplicam entre nós açaí, peixe, camarão, farinha! Se estamos muito acostumados a ver estas maravilhas, é bom notar que se pode explicar diretinho "como" tudo isso acontece na terra ou na água, mas quem ordena à natureza manter este ritmo com uma regularidade tão incrível? O porquê está lá no alto, generoso e gratuito.
A multiplicação extraordinária dos pães e dos peixes, realizada por Jesus, é contata nos Evangelhos para ajudar-nos a operar muitas multiplicações no cotidiano. Há pouco tempo, um programa de televisão retratava o doloroso tema do desperdício. De fato, como podemos acusar Deus e não fornecer alimento para as multidões famintas, quando nossa geração joga fora comida? Pode parecer simplista, mas existe a solução: melhor distribuição, maior solidariedade e partilha! É a multiplicação acontecendo na gratuidade que brota da conversão.
Os quatro evangelistas descrevem a multiplicação de pães, o que não acontece com todos os milagres! Deve haver um sentido para tal insistência. E tamanha é a riqueza da narrativa que foi profecia e antecipação de outra multiplicação. Até as expressões são semelhantes: tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos para o céu e pronunciou a bênção de ação de graças, partiu os pães e os deu aos discípulos; e os discípulos os distribuíram às multidões. A maior multiplicação acontece quando Jesus dá Seu Corpo e Seu Sangue na Eucaristia, de graça, para a vida do mundo. Por isso as mais antigas representações pictóricas da Eucaristia nos mostram um cesto de pães e dois peixes, como no mosaico descoberto em Tabga, na Terra Santa, ou na Catacumba de Priscila, em Roma.
Como "todos comeram e ficaram saciados, e dos pedaços que sobraram recolheram ainda doze cestos cheios" (Cf. Mt, 14, 20), recebendo a Palavra, a partilha dos bens e a Eucaristia, reste-nos a responsabilidade de compartilhar com outras pessoas o que vivemos, a modo de missionários, de graça!
Arcebispo de Belém - PA
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