Como é interessante notar que o processo do Cristianismo em nossas vidas é o tempo todo um convite pra contemplar o Deus que é Amor, que é Verdade, e que criou os homens a fim de fazê-los comungar desse mistério. Um convite que dobra as esquinas da vida e se desdobra na fantástica história do coração de Deus que desce ao encontro do coração do homem por meio do Amor e da Verdade. Duas vias e um único fim. Dois rios que fluem e que se encontram num único e mesmo mar.
A vida humana pautada pelo Cristianismo é o resultado dessa constante experiência de conjugação do Ágape, isto é, do Amor com a o exercício da Alétheia, da verdade. Já me explico: ao contemplarmos, por exemplo, o mistério da Comunhão Trinitária, somos levados a perceber que o Amor é a linguagem que os envolve. O Ágape faz cada um dispor de si sem, no entanto deixar de ser o que é. Devolve a cada um aquilo que lhe é próprio. Ele é o ponto mais alto do amor, que mais profundamente anelamos. O Ágape não deseja nada do outro, ama o outro por causa dele mesmo. E é tão sagrado o processo, que nos ensina desta forma que a construção de nossa humanidade deve ter o Amor como viga de sustentação.
E porque o Amor neste sentido comunga da experiência da Verdade? Alétheia é um vocábulo grego cujo sentido é não estar escondido, não estar velado. A imagem sugerida para esta palavra é a de um véu que tudo encobre. Muitas vezes temos a impressão de não vermos a realidade tal como ela é; está tudo debaixo de um véu. Outras vezes não queremos ver as coisas do jeito que são. Torcemos a realidade do jeito que a queremos. O tema da mística da verdade é levantar o véu e enxergar o que há por trás de tudo, reconhecendo a essência das coisas. Na linguagem do Amor o Cristo dá testemunha da Verdade. Ele se traduz na Verdade. Ele é a Verdade. É pela lente da Verdade que Deus se faz enxergar no Cristo aos homens. A Verdade é aquilo que dá sentido, é tudo aquilo que atribui coerência, liga, orienta. É a partir deste horizonte de sentido que somos e estamos significando algo e avançamos nos territórios da nossa existência.
Tenho aprendido que na vida prática do âmbito de nossos relacionamentos, o Amor e a Verdade devem ser vistos não apenas como caminhos ao longe, distantes. Ao contrário, devem ser traduzidos constantemente em vias que nos possibilite a fazer o êxodo, a travessia para o mais profundo de nossa natureza, para o mais profundo encantamento de nossa relação com o Divino. Um deslocamento que nos faça sair das margens, das regiões periféricas de nossas relações interpessoais e que nos faça amar ao outro de mim na verdade e através dela.
A vida inteira é, pois esse universo de possibilidades de ter que passar pelo processo de atribuir coerência, sabor, beleza e significado real às realidades que vivemos, aos amores que nutrimos, aos amigos que geramos... Portanto, quando a verdade é aí estabelecida, logo o Amor é traduzido na sua mais ínfima essência. Não porque ele careça, mas porque queira que ela o revele tal como aconteceu com Deus e sua história de Amor pela humanidade.
Grato, Sem. Jerônimo Lauricio.
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